sábado, 21 de novembro de 2020

Circo. Círculo


No circuito diário de uma flacidez encardida, imposta por um estranho impositor, de conluio com os seus pares, de nada vale o desespero deste Colunista do Observador, Alberto Gonçalves, e de tantos que vêem o espectro da ruína a avolumar-se sobre as vidas, com a conivência noticiarística atroadora e implacável, de desvergonha confinada numa só temática….

Quando a Covid contagiar as séries televisivas /premium

Quando os responsáveis da Assembleia de Sábios se esquecem de conservar o peixe e Mendes, o Sábio Diminuto, não consegue sentir o pivete, percebe-se que afinal há ali Covid.

ALBERTO GONÇALVES       Colunista do Observador

OBSERVADOR, 21 NOV 2020

The Crown

Um épico acerca da evolução de um monarca perante as agruras do tempo. Como não manda nada, o monarca aproveita o ócio para tirar fotografias com os súbditos e, sobretudo, despir-se em público. O rei não vai nu, mas quase: qualquer motivo serve para trocar de calções ou remover a camisa. Com o advento da Covid, Sua Majestade sujeita-se a 40 testes diários, o que lhe concede folga para lavar a roupa e pretexto para a tirar. À chegada da vacina da gripe, dá um exemplo profiláctico ao povo e desata a tomá-las sem parança, naturalmente em pelota. Como toma demasiadas, não sobram vacinas para a ralé. Felizmente, a ralé venera o seu soberano e não leva a mal. Subtil e densa, “The Crown” mostra que debaixo das vestes reais existe um ser humano complexo e frágil. “The Crown” raramente mostra as vestes reais.

Lost

Após o descarrilamento de um comboio esterilizado da CP, dezenas de pessoas dão por si num lugarejo aterrador e remoto a que, por definição, atribuem o nome de “Portugal”. “Portugal” é um sítio misterioso, com florestas em cinzas, arquitectura medonha e inúmeras rotundas. E um vírus nunca visto, que só ataca de madrugada e após os almoços dos fins-de-semana. “Lost” acompanha o confronto das personagens com o ambiente hostil, uma relação que passa do medo inicial para a resignação. Aos poucos, estabelecem um sistema organizativo complicado, em que metade dos habitantes exerce o poder e a metade restante vai à pesca para os sustentar. Aos sábados, fazem-se patuscadas. Quando os responsáveis da Assembleia de Sábios se esquecem de conservar o peixe e Mendes, o Sábio Diminuto, não consegue sentir o pivete, percebe-se que afinal há ali Covid. Instala-se o pânico, o estado de emergência e dezassete comissões para observar ambos. Os “ganchos” deixam o espectador em suspenso: será que a doença dizimará toda a gente? Alguém conseguirá pressionar a enigmática “mola” e achatar a ambígua “curva”? Cancelar as patuscadas impedirá a propagação? Porque é que Jerónimo, o Sábio Vermelho, parece ser imune ao contágio? No final, as personagens reúnem-se no Infarmed a inventar medidas, sugestão velada de que estarão mortas. Ou pelo menos parvas.

Cops

Em estilo de reportagem, “Cops” segue brigadas policiais em missões de reconhecido risco: capturar lojistas a trabalhar para lá das regras do confinamento, transeuntes sem declaração da entidade empregadora, proprietários da restauração que permitem grupos de sete comensais, etc. A princípio, a série parece estúpida. Com o hábito, notamos que é ainda mais estúpida.

The Sopranos

A série centra-se na família de Tony “César” Soprano, que trabalha no negócio da recolha de lixo para esconder o negócio da distribuição de lixo, ou seja, dos incontáveis parentes por empregos sortidos. Tony “César”, o patriarca, frequenta uma psicanalista para aliviar a consciência: pesa-lhe ainda não ter conseguido empregar um concunhado do genro, rapaz que se baba e daria um excelente director-geral. Tudo se complica no momento em que uma família rival, chefiada por Don Rio, vai ao Benfica contratar Andrea Venturini, um fora-da-lei que adora a lei. A função de Venturini é chatear Tony “César” durante um jantar do período de confinamento, que limita o número de convivas ao agregado nuclear. Como estarão apenas oitenta e quatro pessoas à mesa, o plano de Venturini implica aparecer, com umas garrafas de vinho, disfarçado de primo em terceiro grau – e depois atirar ciganos para cima de Tony “César”. Infelizmente, Venturini chega à caixa do supermercado às 20h03, hora a que o vírus, que passa o dia a fugir do álcool, já se entrega a uns copos. Incapaz de comprar o Murganheira, Venturini muda de plano e vagueia pelas ruas em busca de pedófilos para castrar. Sem pinga, a família de Tony “César” ocupa o jantar a olhar para o balão (vazio). De repente, o ecrã fica todo preto. O espectador poderá pensar que é Venturini. Mas não é: é um amigo dele.

Keeping Up With The Kardashians

O “reality show” em voga. Umas senhoras (com o ocasional cavalheiro à mistura, a título de pechisbeque) sem nada para dizer falam incessantemente. A radical ausência de méritos das protagonistas não as impede de decretar comportamentos e “estilos de vida”. Dia após dia, sentadas atrás de uma mesa, debitam insanidades contraditórias sobre a Covid como se tivessem acesso a um patamar de conhecimento superior e não a um emprego que o PS lhes arranjou. Usem máscara, não usem máscara. Visitem lares, não visitem lares. Fiquem em casa, saiam de casa. Abram as escolas, fechem as escolas. Etc. Ao lado, sujeitos traduzem o paleio a benefício (?) dos surdos-mudos. A tradução para débeis mentais é desnecessária. Por falar em débeis mentais, há um público para isto, e Graça Kardashian, a figura mais destacada, é uma “influencer” de proa: muita gente cultiva orquídeas ou deixa falir restaurantes por sugestão dela. Devido ao sucesso obtido, Graça e Marta Kardashian são capa regular das publicações da moda, como a Notícias Magazine, a Tv Guia e o Público.

Walking Dead

Uma visão distópica, na qual os cidadãos perdem os direitos, a autonomia e a vontade e são condenados a vaguear pela Terra ou, à noite e nos fins-de-semana, pelas respectivas salas de estar. A angústia suscitada pela série está na absoluta arbitrariedade do Novo Normal, que determina regras sem fundamento ou coerência. Os protagonistas, que são os escassos resistentes, vivem em fuga permanente de mortos-vivos mascarados, sedentos de os besuntar com álcool-gel ou denunciá-los à polícia. O objectivo dos nossos heróis é chegar a qualquer concelho onde haja festança do PCP, o único lugar livre de imposições e fanáticos do “distanciamento social”. O início de “Walking Dead” decorre num hospital em ruínas, retrato do que sucedeu ao melhor SNS do mundo depois de o PS o salvar.

Telejornal/Jornal das 8/Jornal da Noite/CM Jornal/etc.

Produções nacionais, conjuntas, infantis e, até ver, as únicas já disponíveis desta lista. Os nossos noticiários televisivos são a versão ficcionada do dia-a-dia do governo socialista e dos seus aliados leninistas. Nesta adaptação muitíssimo livre, não há interesses ocultos, redes de corrupção, saques generalizados, abusos de poder ou supressão de liberdades: há uma frente de esquerda que genuinamente se empenha em melhorar a vida dos portugueses. Trata-se, pois, de uma narrativa onírica, tipo “Feiticeiro de Oz” sem anões e com gordos. Os actores interpretam-se a si mesmos, embora a tendência do dr. Costa para rir no meio das frases derrube a “quarta parede” e desmonte o carácter paródico daquilo. Em plena quinta temporada, a Covid ajudou a reinventar uma fórmula que ameaçava esgotamento. Nos últimos meses, os noticiários têm criado, com notável inventividade, a história de um governo em acção contra o vírus. Os mais pequenitos são levados a acreditar que aquela gente sabe o que está a fazer, além de destruir a economia e subtrair dinheiro à “Europa”. Apesar de o seu carácter absurdamente fantasioso não se destinar a adultos, os noticiários proporcionam belos serões em família, de preferência confinada.

POLÍTICA  SÉRIES  CULTURA  PANDEMIA  SAÚDE  CORONAVÍRUS  SAÚDE PÚBLICA

 

COMENTÁRIOS

Dinis Silva: Genial!         joao nunes: Gostei ....           Alberto Rei: Tim, eu escolheria "os mais pequenos são levados a acreditar que aquela gente sabe o que está a fazer, Além de destruir a economia e subtrair os dinheiros da Europa" Realmente é o que têm feito.           Timóteo Portela Ó meu caríssimo Alberto Gonçalves : isto hoje está divinal !!! O sábio diminuto ...éhéhéhéhéhéh ! Não há açoite mais doloroso e eficaz do que aquele que espanca as ridículas cavalgaduras com o requinte humorístico e a fina inteligência e ironia que aqui magistralmente lhes aplica! Isto é escrita sarcástica que nada deve ao nosso melhor e estimado Eça! Bem haja! PS: o mistério da imunidade do sábio vermelho é fácil de explicar. Para lá de comprada, pelo preço de um orçamento do Estado, a um reles náufrago esbracejante, radica na origem do onírico bicho: é cheneês cómunista. Enviado precisamente para acabar com a liberdade e a democracia burguesa, em auxilio do sábio vermelho. Até agora, estão a ganhar. E já levam um grande avanço ...

Cipião Numantino: Hoje, o nosso estimado AG, pregou-me uma rasteira. Ou, antes, quando pensei que iria ter a bola controlada fiquei sem ela num ápice. Donde, para não andar aos papéis, e sem conseguir alcançar a sua pedalada, o melhor mesmo é eu ir dedicar-me à pesca.

E foi isso exactamente o que fiz e, sem cana ou anzol, tratei de pescar um suculento artigo proveniente do Wall Street Journal, com tradução que não é logicamente minha, mas sim retirada de um site brasileiro pelo que peço desde já desculpas pela inserção das brasileirices que entendi por bem não alterar.

E aí vou eu, passando a transcrever o tema. Please, leiam que acho que vale a pena pensar um pouco sobre o actual inferno socialista na Venezuela:

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A multinacional irlandesa Smurfit Kappa, líder em embalagens de papelão ondulado da Europa e uma das principais empresas de embalagens de papel do mundo, anunciou recentemente sua saída da Venezuela, alegando impossibilidade de manter sua produção perante as destrutivas políticas implantadas pelo governo socialista de Nicolás Maduro. Foi mais uma multinacional a sair do país. Mas este caso trouxe uma reviravolta. Centenas de empregados venezuelanos da empresa, que dependem da multinacional irlandesa para transporte, educação, moradia e alimentos, continuam aparecendo diariamente na empresa querendo trabalhar. Eles se revezam em turnos para proteger toda a pesada maquinaria contra roubos e saques, algo que se tornou uma desenfreada rotina à medida que a Venezuela se afunda na hiperinflação e no caos econômico. [...] "Socorro, precisamos de um patrão aqui! Estamos desesperados!", disse Ramón Mendoza, funcionário há 17 anos da divisão florestal da Smurfit. "Estamos apavorados porque só agora estamos vendo que a única coisa que o governo sabe fazer é destruir absolutamente tudo, todas as empresas. "O sofrimento destes trabalhadores ressalta a devastação que as comunidades rurais venezuelanas estão vivenciando à medida que as empresas privadas vão se retirando daquele país que já foi não apenas o mais rico da América Latina, como também o quarto mais rico do mundo. A economia já encolheu 50% nos últimos quatro anos. A única exclamação que me vem à cabeça após ler a declaração do senhor Mendoza é: uau! Ele de fato entendeu exatamente o que se passa:

"a única coisa que o governo sabe fazer é destruir absolutamente tudo". Eis outro trecho do artigo: Os trabalhadores que vivem perto da empresa haviam recebido empréstimos a juros zero da Smurfit para suas casas. Os residentes afirmaram que, com a saída da empresa, eles não mais podem contar com as quatro ambulâncias que a empresa bancava para servir as comunidades ao redor. Na Escola Técnica de Agricultura, que fica na cidade de Acarigua e que foi inteiramente financiada pela Smurfit, aproximadamente 200 crianças que viviam na extrema pobreza passaram a receber educação, moradia e também refeições quentes, as quais se tornaram um luxo após o colapso das escolas públicas do país. Ao longo de duas décadas, muitos dos formandos desta escola técnica foram trabalhar na Smurfit. O ano acadêmico deveria começar em 1º de outubro, mas, sem dinheiro para alimentar e transportar os estudantes, há apenas silêncio nos corredores e nas salas de aula. "É como se todo o nosso futuro tivesse sido repentinamente abolido", disse a senhora Sequera.

Agora, atenção para o trecho a seguir. O governo venezuelano não apenas não faz a mais mínima ideia de como consertar a baderna que ele próprio provocou, como os próprios trabalhadores estão rejeitando o ideal socialista de assumir o controle dos meios de produção.

Nos últimos dias, a administração Maduro afirmou que havia encontrado uma solução para as instalações da Smurfit: os trabalhadores iriam eles próprios administrá-la. O governo não irá estatizá-la, mas nomeou um comitê temporário para ajudar a reiniciar as operações.

O Ministério do Trabalho não ofereceu detalhes de como iria substituir toda a rede de distribuição da Smurfit, por meio da qual a empresa abastecia suas subsidiárias em outros países. No entanto, os próprios trabalhadores vieram a público dizer que eles não querem e não são capazes de gerenciar as instalações, e insistem que querem ter patrões — mas desde que não sejam funcionários do governo.

"Sabemos como transportar a madeira daqui para a fábrica. Mas não sabemos nada sobre finanças e marketing", disse o senhor Mendoza".

Novidade nenhuma, é claro. Isso é divisão do trabalho pura e simples. Se operários fossem igualmente capacitados para também efetuar tarefas administrativas, eles formariam cooperativas e seriam eles seus próprios patrões. Só que, ao contrário do mundo cor-de-rosa imaginado por socialistas, nem todo o operário é qualificado para efetuar também questões financeiras e gerenciais. Nem todo operário pode assumir o controle dos meios de produção com a mesma competência de empreendedores e capitalistas. Com efeito, nem todo operário quer se tornar um empreendedor.

É interessante constatar como um simples e rotineiro exemplo venezuelano jogou por terra todo um enorme arcabouço marxista.

De resto, é impossível não se solidarizar com os trabalhadores (agora sem patrões) da Smurfit. Eles simplesmente querem trabalhar honestamente em troca de um salário honesto. Eles não querem brincar de revolução, não querem ficar sem patrões e nem muito menos assumir o controle dos meios de produção. Querem apenas continuar trabalhando, algo tornado impossível pelas políticas socialistas adotadas pelo governo da Venezuela.

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E pronto. Espero que tenham gostado da minha pescaria mesmo que ao degluti-la seja necessário colocá-la em molho de escabeche.

Eis aqui um exemplo actuante da contumaz desgraceira socialista. São coisas deste tipo que nos esperam por estas bandas, se não cortarmos o passo aos Costas e Medinas desta vida, mais as suas pancadas ideológicas que estão a levar ao desespero as pessoas que vislumbram onde isto nos vai levar. Boa prisão domiciliária para todos!

E não esqueçam, o xing y ling chinês só ataca após as 13 horas de sábado e domingo. Bicho esperto este, hein? Bem mais do que as amibas que pululam pela xuxarada que nos calhou em sorte!...

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