Bestialidades, como as dos filmes de
terror, que todos podem ver hoje desde pequeninos, ou os jogos electrónicos que
desde meninos se jogam, responsáveis por uma dependência também brutalmente
avassaladora que os tornará inertes relativamente a outras formas mais
conscientes e reflectidas de formação, tudo isso também está na origem destes
exibicionismos palavrosos – para além de uma revolta natural contra tantos dos
desmandos governativos regidos puramente por interesses sórdidos e desonestos,
como se tem visto por cá.
Helena
Matos merece bem os mais de
duzentos comentários, com este seu texto impecável de humor e saber. Apenas coloco
um – de Fernando Silva, bem
explícito a respeito do que por aqui vai de burburinho insano nestas coisas de
condução governativa e reacções de afirmação tantas vezes grotesca…
A direita quer ser poder ou um clube de
gente gira /premium
O Chega tornou-se o seguro de vida do
PS: quanto mais o Chega crescer mais difícil será ao PSD formar governo. Ou a
direita rompe este cerco ou acaba um grupo de reflexão. Quiçá influencer.
HELENA MATOS,
Colunista do
Observador
OBSERVADOR,15 nov 2020,
Ventura diz… O Chega defendeu…Ventura
e mais Ventura. Portugal parece a URSS depois da queda de Trotsky: Ventura,
qual Trotsky, está em todo o lado. Todos os dias pratica uma infâmia e todos os
dias somos convocados a maldizê-lo. O Chega tornou-se o seguro de vida do PS e
dos seus parceiros de governação pois quanto mais o Chega crescer mais difícil
será ao PSD formar um governo. Obviamente, em simultâneo há que diabolizar
qualquer entendimento com o Chega.
Pretender
agora, em 2020, que à direita não devem existir negociações com o Chega implica
aceitar que o poder em Portugal será exercido inevitavelmente pela esquerda. Ou
que se deixará nas mãos do PS a decisão de formar um Bloco Central com o PSD.
Ou ainda que o PS acabará, caso a aritmética lho permita, a negociar com o
Chega, que para o efeito será apresentado como tendo-se tornado moderado,
metamorfose que estou em crer o ministro Augusto Santos Silva explicaria com
eficácia em menos de cinco minutos.
O
que André Ventura diz e propõe
(e nem sempre diz e propõe o mesmo) é
frequentemente populista e pouco fundamentado mas não é necessariamente mais
populista ou mais desrazoado que aquilo que se ouve a outros líderes ou que se
vê noutros partidos e organizações. Por
exemplo, as propostas do CHEGA sobre a castração química de pedófilos e
violadores não são fundamentadas e são apresentadas unicamente para caçar os
votos dos mais radicais? Certamente que sim mas o que foi senão uma
opção não fundamentada e apenas destinada a satisfazer os radicais, o acto de
repetir a votação sobre a eutanásia, para mais no mesmo momento em que não se
consegue impedir que o COVID mate nos lares e centros de acolhimento? E
não teve por acaso laivos de xenofobia a campanha contra o turismo e os
turistas que lavrou por tudo quanto era meio bem pensante da esquerda? Não
foi por acaso populismo a redução dos horários na função pública? E não foi
maior populismo ainda o presidente da República ter promulgado essa decisão
admitindo recorrer ao Tribunal Constitucional caso ocorresse um aumento real da
despesa? (Será que Marcelo Rebelo de Sousa ainda não conseguiu
fazer as contas?) E como avaliar as intervenções no parlamento e
o mural produzido pelo BE a propósito da visita a Portugal da chanceler Merkel
em 2012? E dizer-se, como fez o ministro do Ambiente, que não há
registo de contaminação por COVID nos transportes públicos é o quê além de
populismo?
Este
agitar constante de um inimigo público que diariamente somos convocados a
apedrejar é indissociável da sovietização crescente das nossas vidas: passamos
de um combate inadiável para outro, de um apocalipse derradeiro para outro que
ainda vai ser mais derradeiro enquanto o nosso quotidiano se degrada. Não se pára. Não se pensa. Não se
pergunta. Boa parte do que nos foi prometido falha – no Estado tentacular que
sustentamos e suportamos só a máquina fiscal funciona – mas o que interessa
isso quando temos a nossa distribuição diária de bigodinhos de Hitler para
fazer? Agora é a vez do Chega, amanhã será outro.
Os socialistas foram os grandes beneficiários da liderança de Rui Rio
à frente do PSD não apenas pelo apoio que o líder dos sociais-democratas deu a
António Costa mas muito particularmente por Rio ter entendido o PSD como a sua
facção e não como um partido: em vez de agregar, Rio transformou o PSD num
corredor só com porta de saída. Obviamente
aconteceu o inevitável mesmo que o inevitável pareça uma piada de mau gosto: Rui
Rio acaba em 2020 a demarcar-se dos socialistas porque aceita negociar com o
mesmo André Ventura que deixou sair do PSD em 2018. Só que em
2020, Ventura já não é um vereador mais ou menos tonitruante do PSD mas sim o
líder de um partido que não só não tem nada a perder como disputa com o BE o
lugar de terceira força política!
Podia não ter sido assim com outro líder à frente do PSD? Sendo difícil nesta matéria fazer pior que Rui Rio há
que reconhecer que nas ruas de Loures, Ventura percebeu que se fizesse um novo
partido podia não ser condenado ao esquecimento desde que falasse de e para as
pessoas certas, pois há uma massa de gente que não encontra eco para os seus
problemas no discurso dos partidos e a quem até dizem que desses assuntos não
se deve falar. Essa gente nem sempre está disponível para dar a cara, mas no
momento de dar o seu voto, no segredo da urna, pode vingar-se do silenciamento
que lhe foi imposto e do desprezo a que tem sido votada.
O que está em causa em toda esta
discussão é muito mais que o lugar do Chega.
É sim saber se a direita quer ser poder, ter um projecto para o país, não viver
dependente dos certificados de bom comportamento ideológico que a esquerda
distribui, ou se tem como vocação ser um grupo de reflexão. Ou um clube de
gente gira.
PS1. Ao menos as negociações para a formação do governo dos
Açores pouparam-nos à imensa fantochada da preocupação com a educação de
adultos. Já se esqueceram desse extraordinário desígnio nacional que, em 2015,
era a educação de adultos? Recordo que em Outubro de 2015, quando decorriam as
negociações entre Passos Coelho e António Costa, se dava como adquirido que a
coligação PSD-CDS não só não queria negociar com o PS como não queria saber da
educação de adultos. Durante uns breves dias foi obrigatório em Portugal
perorar sobre a educação de adultos e dar como certo que Passos, o liberal, não
era sensível à educação de adultos. Soube-se posteriormente que as negociações
entre o PS e o BE tinham começado antes até das eleições terem tido lugar e que
portanto todas aqueles encontros do PS com o PSD-CDS eram apenas um simulacro
até que as verdadeiras negociações, aquelas que o PS mantinha com o BE e com o
PCP, chegassem a bom porto. Quando tal aconteceu ninguém mais recordou a
educação de adultos.
PS2. Estranho que os detectores de populismo não tenham
ficado horrorizados com a inclusão do PPM na solução governativa dos Açores.
Recordo que o PPM nas recentes eleições nos Açores transformou a sua sigla no
seguinte slogan: “Para Parar os Mamões”.
COMENTÁRIOS:
Fernando SILVA: A esquerda
classifica como de extrema-direita todos os partidos que podem entrar numa
aliança de direita para formar uma maioria de governo. Agora é o Chega mas se for preciso serão também o
IL e o CDS ou o que mais vier. Quando da AD (Aliança Democrática), o CDS de
Freitas do Amaral (esse mesmo!) foi então apresentado como um partido dos
nostálgicos do salazarismo. E se for preciso até o PSD será acusado de
extremismo direitista e contestada a sua legitimidade democrática para governar.
Foi assim com o governo de
Santana Lopes (demitido por
um presidente PS apesar de ser maioritário no Parlamento) e foi assim com o governo de Passos Coelho durante a Troika (recordemos as solicitações de uma parte relevante da
esquerda para que este governo, também ele maioritário, fosse deposto, nem que
fosse necessário fazer um novo «25 de Abril», ou seja, um golpe de Estado).
Já a esquerda acha que tem sempre legitimidade
democrática para fazer todas as alianças que lhe possam servir para conquistar
o poder. Em 2015, o
PS não teve estados de alma em se aliar com os comunistas e o resto da
extrema-esquerda para impedir que o partido mais votado pudesse governar. E, se for mesmo preciso, a esquerda também não terá
qualquer prurido em fazer alianças oportunistas com sectores mais à direita,
mesmo muito mais à direita. Em 2000, o PS não hesitou em negociar o apoio
parlamentar para a aprovação de 2 orçamentos de um deputado do «direitista»
CDS. A nível europeu, o exemplo mais flagrante da hipocrisia
oportunista da esquerda no que diz respeito a alianças para governar foi a
coligação que o muito de esquerda partido grego Syriza fez com um
pequeno partido tido como de extrema-direita e anti-UE, os « Gregos
Independentes». Para
a esquerda vale tudo, para chegar ao poder e para evitar que a direita governe.
Só
se for inconsequente e «idiota» é que a direita se deixa levar por esta
conversa trapaceira da esquerda. Infelizmente, nos últimos tempos, não têm
faltado exemplos de «idiotice» neste sentido de várias opinionistas ditos de
direita (Pacheco
Pereira, Marques Mendes, etc).
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