sábado, 14 de novembro de 2020

Pois!


A direita civilizada! No fundo, a direita sente-se bem assim, aceitando passivamente o que a coligação de esquerda vai combinando entre si, cuidando de todos, a seu bel-prazer, infiltrando-se, cada vez mais impante e sorrateira, graças a um clima favorável de dolce far niente que por aqui grassa… Bem pode Alberto Gonçalves e muitos mais tentar alertar para a catástrofe. Essa está bem arreigada já, numa deficiente estruturação moral e espiritual que as novas políticas há muito difundiram…

Carta a um amigo da “direita civilizada” /premium

O inimigo, plausível e imediato, não é o Ventura, entretido com subsidiados, pedófilos e, no fundo, a carreira dele. O inimigo é o que, a juntar à vontade, possui os meios para nos oprimir.

ALBERTO GONÇALVES

OBSERVADOR, 14 nov 2020

Estás bonzinho? Imagino que não. Andas preocupadíssimo com o que se passa nos Açores, as cedências do que designas por “direita civilizada” aos extremistas do Chega. É aborrecido. Mas gostaria de te lembrar, porque pelos vistos esqueceste, que o país inteiro, e não apenas um arquipélago, é governado há cinco anos mediante uma aliança parlamentar com extremistas, fora os extremistas que moram no PS e nem carecem de alianças para legitimar extremismos. E, corrige-me se estiver enganado, nunca te vi demasiadamente aflito com isso. Ou, para ser justo contigo, tão aflito quanto agora.

Vais responder-me que o Chega não é comparável a PCP e BE. Concordo em absoluto: PCP e BE são piores. O Chega é um projecto oportunista que congrega indignações dispersas. Às vezes acerta, às vezes emite umas cretinices de meter medo. Não sei se as cretinices são convicções do Ventura, se são bojardas aleatórias que o façam parecer rijo. Sei que tenho pena de que a esperança de tantos portugueses (coitados) seja depositada num comentador da bola com bastante habilidade e escasso critério, além disso assaz “patriótico” e venerador da “ordem” para o meu gosto – e julgo que para o teu. Mas os partidos comunistas são realmente incomparáveis com isto. Sabes que o PCP e o BE não são meros escapes “populistas” do “descontentamento”: são seitas, coesas e disciplinadas e com uma visão totalitária do mundo. Se o Ventura aprecia o caudilho húngaro, o PCP e o BE apreciam boa parte dos principais déspotas sanguinários do último século (a divergência em volta de Estaline é um pechisbeque justificativo). Se o Ventura mandasse, obrigava-nos ao respeitinho cego pela polícia, a exacta polícia que por acaso ajuda a cumprir as ordens do dr. Costa para fechar os cidadãos e a economia. Se PCP e BE mandassem, ainda mais do que mandam, estaríamos desgraçados, ainda mais do que estamos.

Como tu, não gosto do Chega. Se calhar ao contrário de ti, não o digo para exibir uma “civilidade” e uma “decência” definidas pela esquerda selvática e indecente. É que gosto menos da esquerda, actual PS incluído, que do Chega. Mesmo descontando os juízos de valor, ou os valores sem grande juízo, a verdade é que o Chega não merece a tua inquietação, a qual, não leves a mal, acho excessiva. Em Portugal, o poder da extrema-direita, se quiseres despejar o Chega aí, é ínfimo e não ameaça crescer indefinidamente. O poder da extrema-esquerda, assumida ou mal disfarçada, é imenso, e ameaça crescer a ponto de se tornar intolerável. A sala enche-se de jibóias e tu incomodas-te com o aranhiço no canto.

Na medida do possível, ignora o aranhiço. Se aceitares outro conselho, ignora as regras de “convivialidade” que a esquerda decreta. O Ventura é “fascista”? Duvido, embora não tenha a certeza. Tenho a certeza de que, para a esquerda, Passos Coelho, Cavaco e Sá Carneiro eram “fascistas”, e tenho – temos – a certeza que não eram. Repara que não estou a valorizar o pobre Ventura à custa dos nomes citados, inúmeros degraus acima dele: estou a desvalorizar as sentenças da esquerda, exímia a estabelecer as fronteiras do “admissível”. Para a esquerda, que não fosse criminosa teria piada, só não é “fascista” quem não se lhe opõe. Por inúmeras demonstrações de “virtude” que pratiques, ao primeiro deslize tu próprio serás “fascista”. E eu, teu amigo, ficarei orgulhoso. Política e eticamente falando, há avaria garantida se a esquerda não nos chama “fascistas”. Eis a nossa vantagem: a esquerda precisa de difamar os democratas. Nós não precisamos de difamar a esquerda. A esquerda trata do assunto: comunistas, dizem-se. Ou socialistas, dizem os comunistas tímidos.

Por ser desnecessário, suponho, não vou ao ponto de te recomendar distância da esquerda, ou especificamente de gente cuja ambição inclui exterminar aquilo que te é caro. Sabendo não possuir esse direito, recomendo-te desconfiança da “direita”, ou especificamente da “direita” que, por interesse ou estupidez, não se resguarda dessa esquerda. Em qualquer dos casos, se o ecumenismo te é sedutor, recordo-te um romancista que talvez admires: a ideia de que podemos viver em harmonia é muito perigosa, e os que a partilham são os primeiros a perder a alma e a liberdade.

Desculpa a citação. Detesto citações. E tu continua a detestar o Ventura com zelo e razão. Mas – segura-te que lá vem pompa – não percas a alma, nem a liberdade, nem a noção do inimigo. E o inimigo, plausível e imediato, não é o Ventura, entretido com subsidiados, pedófilos e, no fundo, a carreira dele. O inimigo é o que, a juntar à vontade, possui os meios para nos oprimir. E oprime de facto. Sem força, o inimigo é uma cisma, um cisco, uma irritação, um engodo: não é o inimigo. Dado respeitar a tua inteligência, que é notória, escuso de nomear o inimigo, que está em movimento, a ganhar pela coacção e pela desistência uma guerra que, ou me engano, ou preferes desdenhar. Espero enganar-me.

Dito isto, tu é que sabes. Permanecerei teu amigo apesar das diferenças, afinal superáveis. As insuperáveis reservo-as para os que conseguem saquear-nos, enclausurar-nos, falir-nos, enxovalhar-nos. E para os que tentam calar-nos. E para os que sonham eliminar-nos. E para os que, caladinhos e patetas, assistem de gravata a estes edificantes desígnios. É a minha “linha vermelha” e, tudo somado, aposto que estás do lado de cá. Do lado de cá, para elevar o nível da conversa, está também uma canção linda que o Bill Callahan e o Bonnie “Prince” Billy lançaram há dias: “Blackness Of The Night”. Já ouviste? Jantamos de hoje a oito (ai Jesus, o “recolher obrigatório”)?

Um grande abraço.

 

POLÍTICA  PARTIDO CHEGA  PCP  BLOCO DE ESQUERDA  EXTREMISMO  SOCIEDADE

 

COMENTÁRIOS:

Elisabete Carvalho: Parabéns à espinha dorsal não vergada! Chama-se "carácter", para dizer o menos... Patrícia Carvalho: Parabéns a Rui Rio, que, contra as minhas expectativas, será primeiro-ministro, muito mais cedo do que se pensa. Entretanto, é imperativo reforçar, e muito, o Chega e o seu líder. Única forma de restaurar em Portugal um mínimo de equilíbrio, decência e sanidade, salvaguardar o que ainda resta de liberdade individual e colectiva e, idealmente, resgatar parte substancial da já usurpada pelo esquerdismo totalitário. Quanto aos canhices do Bairro Alto, do circo mediático, da ganza e do homossexualismo e parafilias anexas, sob tutela da extrema-esquerda, que se auto-apodam de "direita": desprezo. Tão-só desprezo. É certo que, tal betada, bon vivant, a maioria da qual com a teta do estado na boca, sendo embora meia dúzia de gatos pingados, que valem e representam zero, continuarão a fazer imenso ruído mediático, na exacta medida em que a comprometida, subsidiada e corrupta "comunicação social", só a eles dará voz e empolamento, mas isso, de novo, vale zero. Urge, igualmente, já em Janeiro, dar uma lição duríssima ao patético cata-vento de Belém, não só co-responsável, mas responsável maior pela desgraça e miséria a que vinte e cinco anos de corrupção socialista conduziram este país. Até ao exacto ponto de o deixar num estado de aparvalhamento similar ao que, com infindável prazer, podemos agora constatar que se apoderou do Costa, assaltante do poder, que agora lhe foge a passos largos.      Observa Ador: Fact-check: o chega come criancinhas ao pequeno almoço. Vamos ter todos muito medo do chega. Felizmente que existe o dr.costa para nos salvar.

Cipião Numantino:  “A ideia de que podemos viver em harmonia é muito perigosa, e os que a partilham são os primeiros a perder a alma e a liberdade”. Mais uma monumental prosa do estimado AG! Que das excelentes frases que li, retive especialmente a citação acima exposta. Num sentido mais lato invocaria eu um dito do famoso jornalista brasileiro Millôr Fernandes que dizia “Democracia é quando eu mando em ti. Ditadura é quando tu mandas em mim”. É aqui que reside a substância da coisa. E o conceito foi de tal modo despendido pela esquerda que se tornou uma espécie de mantra onde impera uma espécie de religiosidade que raia por vezes os limites do absurdo. Quem tenha dez réis de testa, não pode confiar no paleio esquerdoso. Que como António Gramsci, Herbert Marcuse e os neófitos do sócio-construtivismo tão bem demonstraram, vale tudo menos arrancar olhos. Nada detém o paleio de um esquerdista e a verdade e a mentira constituem para ele meros instrumentos de persuasão e utilitarismo, a que deita mão sem quaisquer laivos de pudor ou preocupação. Para se aquilatar da lata desta gente, atentem numa recente frase do Dr. Costa a que eu reagi sem saber se deveria rir ou … chorar. Naquele seu português acrioulado em que parece estar a rivalizar com o Jorge Jesus, ouvi eu na rádio ele afirmar, cito de memória “que ao contrário do governo de Passos, o seu governo, tinha promovido o investimento público”. Ora como todos nós sabemos, o governo do Dr. Costa, cortou radicalmente qualquer tipo desse investimento, amealhando em plena mancomunação com o Dr. Cem Tino, todos os cêntimos nas famosas cativações. Onde, de permeio, arruinaram totalmente o de si já sofrível SNS (Serviço Nacional de Sofrimento). Mas “ca ganda latosa”! O mais grave da questão é que é capaz de dizer este tipo de coisas, sem corar ou sem qualquer tipo de pudor! Acreditem, esta gente é perigosa. Pairam sem temor sob as incidências do bem ou do mal. Característica, aliás, transversal a toda a mentalidade esquerdosa que são capazes de praticar as maiores barbaridades, sem que a consciência os assoberbe minimamente. Donde se explicam os crimes hediondos de tais seitas, que como se pode observar pelas crenças dos Jirónimos e Katrinas desta vida, parecem medrar à sombra dos inenarráveis infortúnios dos demais. Vejamos, por exemplo, os camaradas do PCP. Nada os pára a menos que atinjam os seus interesses mais evidentes. Estancadas as remessas que provinham da ex-URSS e da Alemanha de Leste, ficaram confinados a uns troquitos dos pobretões de Cuba ou da Coreia do Norte. Ou seja, eram mantidos por uma espécie de amantes a quem abriam permanentemente as pernas (desculpem o meu francês), pertencendo-lhes, em troca, vender a nossa liberdade (só não a perdemos porque o Jaime Neves lhes trocou as voltas), enquanto conspiravam às claras para entregarem de bandeja as nossas ex-colónias ao comunismo internacional, provocando, en passant, pavorosas guerras civis que levaram à completa miséria dos povos dessas desditosas nações. Resultado? Em vez de essa gente ter ido parar à pildra, por sedição e alta traição à pátria, andam por aí ufanos e risonhos kagg ando moral e prosápia, quando seria aconselhável algum recato mesmo que afivelado. Resumo, os dois partidos comunas que nos calharam em sorte, são uma espécie de ken gas do regime. Entregam-se por um punhado de tremoços. Uma festarola, provavelmente agora o congresso, um acampamento festivaleiro tipo concurso de charrados, enfim tudo o que lhes traga qualquer acrescido ganho e, com isso, possam acalmar o pagode num tipo de fé de meter inveja ao Jim Jones e seus apaniguados desaparecidos com pompa e circunstância, numa espécie de holocausto, lá para as selvas da Guiana. Tudo a condizer com a normalidade das respectivas seitas. Triste desígnio para quem nada mais merece. Resta-lhes a benevolência da História quando esta avaliar que foi a pior gente que alguma vez pisou este miserável planeta. Valha-nos isso. A exemplo de polacos, húngaros e tantos mais, só de ouvir falar dessa gente, as futuras gerações tratarão, tal como o general espanhol Millán Astray, de sacar imediatamente da pistola! Desgraçada geração que desde 1917 só andam a provocar confusão e a promover matanças e sofrimento!...

Maria L Gingeira: A forma é excelente. Os argumentos também. AG já nos habituou a esta abertura de espírito que toca sempre no ponto das questões com que uma trupe organizada nos tenta enredar. Este país é perito em falatórios e reacções em manada, coisa que detesto. Ninguém pára para pensar. Vai tudo atrás. Felizmente alguém usa o jornalismo de opinião, não com a segunda intenção de moldar pensamentos em cadeia, mas com a disponibilidade de dizer tão-somente o que pensa. E essa é a maior liberdade que pode ter quem escreve. Por dar segurança a quem lê.

 

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