Como
advertência. É o que faz José Milhazes, que estudou. E o
mundo fica mais uma vez suspenso, na previsibilidade, no receio, na ignorância
dos novos modelos de actuação política, com reflexos no mundo. Entretanto, a
covid-19 assentou arraiais, e, por cá, a economia vai-se degradando… Aqui não
há melhorias nas economias, mas haverá quem nos acuda, pensamos nós, em
gratidão de boa educação…
Biden: O que poderá mudar nas relações
entre Estados Unidos e Rússia?/premium
Há numerosos motivos para recear que
Biden seja uma “dor de cabeça” ainda maior do que Trump para Putin.
Tradicionalmente, os dirigentes russos têm mais facilidade em conversar com os
republicanos
JOSÉ MILHAZES
OBSERVADOR, 09 nov
2020
O
Kremlin, desta vez, foi mais cuidadoso ao revelar as suas preferências no que
respeita aos dois candidatos a Presidente dos Estados Unidos e não se apressa a
dar os parabéns a Joe Biden. As expectativas não são muito radiantes, mas os
dirigentes russos nutrem algumas esperanças em que seja possível melhorar as
relações russo-americanas.
Vladimir Putin e os seus
porta-vozes insistiram em sublinhar que a Rússia irá trabalhar com o vencedor
das eleições presidenciais norte-americanas, quer seja Donald Trump, quer fosse
Joe Biden.
Numa
entrevista concedida a um dos canais de televisão russa, Putin revelou aquilo que, segundo ele, aqui não há melhorias
nas economias, poderia servir de
base para a cooperação com o novo dono da Casa Branca. Como parece ser um facto
adquirido de que Joe Biden é o vencedor, vale a pena recordar o que ele disse a
propósito do Presidente eleito: “Quanto ao
candidato democrata, o que posso dizer? Também podemos ouvir uma retórica
anti-russa bastante aguda. Infelizmente, nós já nos acostumámos a isso. Mas
vale a pena mencionar algumas coisas. Em primeiro lugar, o Partido Democrata
está tradicionalmente mais próximo dos chamados valores liberais, mais próximo
das ideias da social-democracia, comparando-se à Europa. E foi a partir do meio
social-democrata que o Partido Comunista evoluiu.
Afinal, fui membro do Partido
Comunista Soviético durante quase 20 anos, ou mais precisamente 18 anos. Eu era membro de base, mas pode-se dizer que
acreditava nas ideias do partido. Ainda
gosto de muitos desses valores de esquerda. Igualdade e fraternidade. O que há
de ruim neles? Na verdade, eles são semelhantes aos valores cristãos. Sim, eles
são difíceis de implementar, mas são muito atraentes, no entanto. Por outras
palavras, isso pode ser visto como uma base ideológica para desenvolver
contactos com o representante democrata.
É
um facto que os afro-americanos constituem
um eleitorado estável, um dos eleitorados do Partido Democrata. É um facto
bem conhecido e não há nada de novo nisso. A União Soviética também apoiou o
movimento dos afro-americanos pelos seus direitos legítimos. Na década de 1930,
os líderes da Internacional Comunista escreveram que tanto os trabalhadores
negros quanto os brancos tinham um inimigo comum: o imperialismo e o
capitalismo. Eles
também escreveram que essas pessoas poder-se-iam tornar o grupo mais eficaz na
futura batalha revolucionária.
Então, isso é algo que pode ser visto, até certo ponto, como valores
comuns, senão um agente unificador para nós. Não tenho medo de dizer isto. Isto
é verdade”.
Putin,
dirigindo-se ao entrevistador, remata com uma ponta de nostalgia: “Você
lembra-se — bem, você é um homem jovem, mas as pessoas da minha geração
recordam-se de uma época em que enormes retratos de Angela Davis, membro do
Partido Comunista dos Estados Unidos e uma ardente lutadora pelos direitos dos
afro-americanos, estavam afixados em toda a União Soviética.”
Lirismos e declarações de amizade e
cooperação à parte, essas palavras do Presidente russo mais não escondem do que
uma indefinição face ao futuro das relações entre os dois presidentes e países.
Era
evidente que a maior parte da elite política russa preferia continuar a ver
Donald Trump à frente da Casa Branca, embora as relações entre a Rússia e os
Estados Unidos tenham atingido um nível tão baixo como nalguns momentos
complicados da “guerra fria”.
O Kremlin soube aproveitar a política de Trump de afastamento dos EUA
dos seus aliados europeus, de menor intervenção nos assuntos internacionais. Além disso, também tirou proveito das acções
extravagantes do ainda Presidente norte-americano para desacreditar a
democracia junto da opinião pública russa e internacional.
Por outro lado, Moscovo não
esconde o seu descontentamento com o facto de Trump ter “destruído quase todo o
sistema de segurança internacional” ao abandonar importantes tratados que
limitam a corrida aos armamentos estratégicos, bem com o facto de o dirigente
norte-americano ter declarado novas sanções contra a Rússia e tudo fazer para
impedir a conclusão do gasoduto North Stream-2, que liga os poços
gasíferos russos à Alemanha através do Mar Báltico.
É
precisamente nestes sectores que Putin espera conseguir estabelecer um diálogo
positivo com Joe Biden. O Presidente eleito norte-americano é um político muito
ligado às questões do desarmamento e, durante a sua campanha eleitoral,
prometeu, nomeadamente, prolongar o tratado sobre armamentos estratégicos (New Start).
Concluído em 2010, o tratado expira
no início de 2021 e as negociações sobre a sua renovação encontram-se num
impasse há meses. O acordo
mantém os arsenais de ambos os países bem abaixo dos níveis da “guerra-fria”,
limitando o número de lançadores nucleares estratégicos a 700 e o número de
ogivas nucleares a 1.550.
Moscovo
espera também que Biden não continue a levantar obstáculos à conclusão da
construção do North Stream-2, considerando que o Presidente eleito não está
ligado ao lobby norte-americano do petróleo e gás. Além disso, o Kremlin espera
que a questão da “ingerência russa” na vida política americana passe para segundo
plano.
Por outro lado, há numerosos motivos para recear que Biden seja uma
“dor de cabeça” ainda maior do que Trump para Vladimir Putin. Tradicionalmente, os dirigentes russos têm mais
facilidade em conversar com os republicanos do que com os democratas
norte-americanos. Além disso, é grande o receio de que os Estados Unidos e a
União Europeia voltem a fortalecer as suas relações no âmbito da NATO a fim de
fazer frente à política expansionista de Moscovo.
“É
claro que, hoje, se sentem inspirados todo o mundo liberal, os aliados
dos Estados Unidos e todos os que apostavam na não indiferença da última
superpotência. Por isso, com a vitória do democrata pode esperar-se a
desforra de todas as forças não conservadoras em todo o mundo. Isso significa: mais russofobia na Europa, mais mortes em
Donbass e em muitos outros pontos quentes do mundo, mais sanções por razões
políticas, isto se falarmos das consequências directas e mais simples” – considera o senador Konstantin Kossatchov,
presidente do Comité para Assuntos Internacionais do Conselho da Federação
(Câmara Alta do Parlamento) da Rússia.
O Kremlin receia também que
Joe Biden normalize as relações entre os Estados Unidos e a China, o que lhe
permitirá concentrar mais atenção na Rússia.
Por isso, mesmo que as relações entre
os Estados Unidos e a Rússia melhorem, o processo irá ser complicado, com altos
e baixos, porque, além da política de Biden, alterações a ocorrer na situação
interna na Rússia poderão influir no diálogo bilateral.
P.S. As confusões
e divergências ocorridas durante a corrida eleitoral norte-americano estão a
ser utilizados para denegrir a democracia e o pluralismo. A elite política
russa não se cansa de afirmar que o sistema político no seu país é mais
democrático do que nos Estados Unidos, o que está longe da verdade. Embora se
chame Federação da Rússia, os russos só podem invejar o federalismo existente
nos EUA. Não espanta também a reacção de Alexandre Lukachenko, ditador
bielorrusso, que afirmou: “Olhai para o que está a acontecer com essas
eleições. Isso é uma vergonha, é um insulto da democracia… Trata-se de uma
comédia e de um insulto para toda a democracia. E ainda bem que isso aconteceu
porque vimos a essência dessa democracia. Paleio. No mundo respeitam só os
fortes e os que podem resistir até à morte. Nós iremos resistir”. Não vale
a pena comentar…
RELAÇÕES
INTERNACIONAIS POLÍTICA ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA AMÉRICA MUNDO RÚSSIA JOE BIDEN
COMENTÁRIOS:
Vota Trump ao esquecimento: Vote Trump to oblivion! Quando receberes notícias sobre
Trump, escolhe a opção "não estou interessado em notícias sobre
Trump". Let him
rest in eternal oblivion! Just ignore the guy! Spread the word all over the world!
PortugueseMan: ...mas os dirigentes russos nutrem algumas esperanças
em que seja possível melhorar as relações russo-americanas... Hum, não penso que seja
possível melhorar as relações. A situação só tende a piorar independentemente
do partido/candidato que esteja no poder.
A minha esperança de algo positivo reside apenas no
tratado START. Que não deixem cair a última tranca. ...Por
outro lado, Moscovo não esconde o seu descontentamento com o facto de Trump ter
“destruído quase todo o sistema de segurança internacional” ao abandonar
importantes tratados que limitam a corrida aos armamentos estratégicos...
NINGUÉM devia estar contente. Embora não tenha sido Trump que deu início a esta
loucura. Foi Bush.... Moscovo espera
também que Biden não continue a levantar obstáculos à conclusão da construção
do North Stream-2, considerando que o Presidente eleito não está ligado ao
lobby norte-americano do petróleo e gás... A questão do Nord Stream é
muito, mas muito mais que o lobby americano. Também estou com alguma curiosidade,
sobre o que Biden vai fazer sobre o assunto. Se ele afrouxar a pressão e
permitir a conclusão, vai definitivamente entalar a Ucrânia, Polónia e países
Bálticos. E claro, vai ver a Alemanha com acesso a energia de forma abundante e
a preços muito interessantes e a uma maior ligação com a Rússia. Algo que
Hitler tentou fazer pela força, está agora a acontecer de forma pacífica... Os
polacos devem estar com os cabelos em pé. Têm andado a lixar a Alemanha e
quanto a energia a preços baixos para eles, acabou-se. ...Além disso, é grande o receio de que os Estados
Unidos e a União Europeia voltem a fortalecer as suas relações no âmbito da
NATO a fim de fazer frente à política expansionista de Moscovo... Duvido.
A NATO está com problemas, e Trump lixou os europeus ao acabar com o tratado
INF. Assim que a Alemanha tiver acesso a energia em abundância, quase de
certeza que o processo de um exército europeu vai acelerar. E não vai haver
compras a armas americanas, vai ser dada prioridade à indústria de armamento
europeia o que será desastroso para a indústria militar americana. ...O Kremlin receia também que Joe
Biden normalize as relações entre os Estados Unidos e a China... Isso já
não é possível. OS EUA estão em declínio e a China está a acelerar. Não há
possibilidade de normalização. Fernando Regio: Gostei quando me chamou de
negacionista sabe? Continue o bom trabalho. Gosto quando escreve sobre a Bielorrússia.
Acha que Trump era igual a Lucachenko? Antonio Tavares: Pelo que se pode observar, o
sistema político nos Estados Unidos da América é mais honesto que o sistema
politico na Rússia e na Bielorrússia. Existe um sistema tipo oligarquia fascista
(Rússia) e outro parecido na Bielorrússia onde os políticos estão colados aos
cargos de gestão e direcção dos serviços do estado como se fossem empresas
privadas. Adelino
Lopes: Tenho uma questão relativa à
frase atribuída a Putin “Afinal, fui membro do Partido Comunista Soviético
durante quase 20 anos…”. Fui? Já não é? Ou agora é chefe em vez de membro? Não
percebi. Relativamente à política russa no mundo, acredito que os americanos
contam cada vez menos. E a Europa só é problema porque costuma acolher os
desiludidos. O (grande) problema será a China, digo eu. José MilhazesAUTOR > Adelino Lopes: Putin está, agora, para o comunismo como o vinho está
para o vinagre. Adelino Lopes > José Milhazes: Obrigado pela resposta. E desculpas pela minha
ignorância relativamente à Rússia. Eu sei que alguns partidos comunistas se
comportam como camaleões (não foi o caso do nosso PCP e também já não consigo garantir
que não). No caso do Putin, sim parece que aquele comunismo deu um fascismo
(não declarado). Afinal de contas, em termos económicos a diferença está em que
no comunismo a atividade privada foi exercida pelos donos das armas, enquanto
neste fascismo existe um liberalismo “controlado” pelo poder.
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