Francisco Assis foi dos que
se indignou com a farsa da decisão de António Costa de tomar as rédeas do governo, apesar da derrota que este
então sofreu em relação a Passos
Coelho, escolhendo apoios à esquerda que lhe proporcionassem a maioria para o
acesso. E foi escrevendo, como antes falara, em mesas redondas, que davam
prazer escutar, pela serenidade e competência dos seus discursos. Há muito que
deixou de escrever e de discursar cá por casa, e espantou-me o seu artigo.
Sempre equilibrado, desta vez veio dar a mãozinha aos seus, puxando as orelhas
aos da geringonça que dantes não aceitara bem. Francisco Assis continua competente e sereno, afinal amigo
do seu amigo. Aquilo do Passos
Coelho fora um aparte, para um flash fotográfico momentâneo, como todos os
flashes.
OPINIÃO
A importância da Concertação Social
Face à natureza dos desafios que se
colocam no nosso horizonte uma hipotética desvalorização da Concertação Social
constituiria um erro trágico.
FRANCISCO ASSIS
PÚBLICO, 26 de
Novembro de 2020
A
crise sanitária que se abateu sobre a Humanidade permite-nos, entre outras
coisas, extrair duas conclusões da maior importância: ficou plenamente
demonstrado que o modelo social europeu constitui um avanço civilizacional
ineludível e sem qualquer paralelo de ordem histórica ou geográfica; ficou
igualmente patente que a existência de uma economia robusta e de umas Finanças
Públicas equilibradas é condição imprescindível, quer para a manutenção do
Estado-Providência, quer para possibilitar uma resposta pública contundente em
tempos de crise.
Portugal, felizmente, dispõe de um Estado Social razoavelmente
apetrechado, mau grado as limitações que todos lhe reconhecemos, e pôde, em tão
crítica conjuntura, beneficiar de uma ligeira folga resultante do esforço
prosseguido no campo orçamental nos últimos dez anos. Superada que seja a crise
económica suscitada pela pandemia
teremos pela frente três desafios estruturais: prosseguir
uma política exigente de consolidação orçamental tendo em vista a redução
progressiva da dívida pública até esta atingir os valores médios europeus;
promover a aceleração do ritmo do crescimento económico que se vinha a
verificar desde 2014; assegurar a sustentabilidade financeira e social do
Estado-Providência, instrumento indispensável para o combate a inaceitáveis
disparidades de rendimento e de oportunidades entre os diferentes segmentos da
população.
Com
os vastos apoios provenientes da União
Europeia teremos condições históricas irrepetíveis para a superação
dos principais factores de bloqueio ao desenvolvimento do nosso país. Para que
tal suceda precisamos, desde logo, de garantir que o debate político assente na
confrontação de argumentos racionais e devidamente sustentados em dados
empíricos rigorosos. Saibamos evitar uma excessiva polarização da disputa
ideológica, sem renunciar à manifestação das divergências próprias de uma
sociedade democrática e pluralista. Só assim estaremos à altura dos tempos
especialmente responsabilizantes que vamos viver.
Atentemos
sumariamente em dois factores
nevrálgicos que se têm revelado impeditivos do progresso do país: o
baixo nível de produtividade e os elevados valores de endividamento das famílias,
das empresas e do Estado. O PIB por hora
trabalhada em Portugal, de acordo com a OCDE, correspondia em 2018 a 41,6
dólares, significativamente abaixo da média da União Europeia (58,5 dólares) e
da média da OCDE (56,6 dólares). Países como a República Checa, a
Lituânia, a Eslováquia, a Eslovénia, a Estónia e, imagine-se, a própria Turquia
apresentavam valores superiores ao nosso. Para
tal situação concorrem a falta de capital do tecido empresarial, as baixas
qualificações que continuam a caracterizar uma parte significativa da população
activa portuguesa e as disfuncionalidades existentes no domínio da organização,
quer no sector privado, quer na Administração Pública.
Ora, esta falta de
produtividade prejudica a competitividade económica e inibe o
crescimento salarial num país onde as remunerações do trabalho permanecem
dramaticamente baixas. O problema do endividamento, que tem vindo a ser
devidamente enfrentado, não pode, em nenhuma circunstância, ser desvalorizado. A nossa dívida pública ainda é uma das maiores do
mundo e constitui um pesado constrangimento à acção do Estado em domínios como
o investimento público e a despesa social. Acresce ainda que o endividamento das famílias, das empresas e do Estado
chegou, em Maio deste ano, ao valor recorde de 740,695 mil milhões de euros, o
que representa cerca de 350% do PIB registado no ano de 2019.
Face à natureza dos desafios que se colocam no nosso horizonte uma
hipotética desvalorização da Concertação
Social constituiria um erro trágico.
Esta revelou-se decisiva para o crescimento das economias e para a afirmação do
Estado Social nos países mais prósperos da Europa. Sem prejuízo da reconhecida
centralidade do Parlamento o caminho a seguir deve ser aquele que, com
oportunidade e clarividência, foi enunciado pela líder parlamentar do PS em
recente entrevista: tudo o que diga respeito à política de rendimentos e à
eventual introdução de alterações à legislação laboral não deve ser feito à
margem dos mecanismos de concertação social. Não tenho dúvidas de que o país
pagaria um preço muito elevado se optasse por outra via.
Presidente do Conselho Económico e Social
TÓPICOS OPINIÃO
CONCERTAÇÃO
SOCIAL CONJUNTURA ESTADO SOCIAL FINANÇAS PÚBLICAS ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTADO
Magritte EXPERIENTE: : É este o problema do PS: a rendição total e
incondicional ao papaguear neoliberal. Claro que a concertação social
interessa: de que forma se legitimaria a disciplinarização do trabalho e a sua
lavagem ideológica, para que adira voluntariamente a políticas que o
prejudicam? E para isso, Assis (supostamente socialista) cá está para dar uma
mãozinha. Quanto aos cartéis e monopólios, crimes económicos e assuntos
fiscais, nem vê-los: estes capitalistas já estão bem concertados.
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