HENRIQUE SALLES DA
FONSECA.
Também vivi esses momentos da entrega de
Goa, Damão e Diu. Em Moçambique. Com a mesma indignação,
é claro, de HENRIQUE SALLES DA
FONSECA. A vida seguiu.
Mas nunca me lembraria de a expor assim, a indignação,
tantos anos depois.
Tanto mais que estou a escutar André Ventura, a expor os seus argumentos de defesa
de pontos de vista também corajosos e vibráteis, mas o entrevistador, do 1º
canal, mal o deixa falar, atropelando e interrompendo o discurso do
entrevistado - por falha de isenção jornalística ou por desejo muito nosso de manifestar
brilho profissional “à maneira”.
Leiamos o texto de Salles da Fonseca, que denuncia o ilustre Costa Gomes, naquela altura ainda desconhecido,
posteriormente, presidente adequado – galardoado em marechal, como de regra - -
de um dos governos iniciais do pós-25 de Abril, aliás citado no meu livro “Cravos
Roxos”, por duas vezes:
- A primeira, em “Pedras de Sal” (em 2ª edição), nele contida, num curto
texto, subentendendo o executor da tal “data
histórica”:
“A Data Histórica: 27 de Julho de 1974: Fim do IMPÉRIO ULTRAMARINO PORTUGUÊS «Ditosa Pátria que tais filhos tem!”
- A segunda, em “Lusos 74”(“Mais Pedras de Sal”, 8 - «Experiência»): “….. Voltei para casa mais firme, mais crente de que as
forças ordeiras conseguiriam segurar ainda o império em vias de dissolução. O
general Costa Gomes falara, de
resto, em Angola, pouco antes, e prometera um processo elegante de
autodeterminação antes da independência a longo prazo. O general Costa
Gomes também aprendera como eu os vastos
limites antigos da sua pátria, não vinha a Angola gastar tanto dinheiro na
viagem para fazer promessas vãs…..”…( Mas a família chamava-me, para que
regressássemos à pátria de origem): “´-Oh
papá! Mas não ouviste o general Costa Gomes?” E o meu experiente pai, com o seu
jeito repentista tão característico: -“Pois ouvi, minha filha, pois ouvi! Se eu
até já ouvi o general Gomes da Costa!”. Creio que já tinha referido esta
passagem.
Mas escutemos André Ventura, que também vale a pena, jovem
arrebatado e sincero, parece, mais de quatro décadas após. A menos que o
entrevistador do 1º canal prefira um dia destes entrevistar - com mais brandura,
naturalmente, o candidato Tino de Rans,
mais condizente com a nossa conveniência democrática, permitida por uma
Constituição que André
Ventura afirma, atrevidamente, não amar…
Regressemos ao texto do Dr. Salles, um nobre
texto:
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 15.12.20
Efeméride negativa correspondente à
invasão indiana do que restava do Estado Português da Índia – Goa, Damão e Diu.
* * *
Quando em 1498 Vasco da Gama chegou à Índia aportando a Calecute,
fez inimizade com o Rei dessa cidade e amizade com o de Cochim que lhe pediu
ajuda contra o seu inimigo tradicional, precisamente Calecute. Passados quase cinco séculos, o Ministro
da Defesa da Índia, Krishna Ménon,
natural de Calecute, ordenou a aniquilação do Estado Português da
Índia. Tudo se consumou num fim de semana: 18 de Dezembro de 1961, Sábado,
assistiu à invasão sem poder oferecer resistência significativa pois as armas
que poderiam ter tido algum desempenho defensivo tinham sido «estrategicamente»
retiradas de Goa (e talvez também de Damão e de Diu) por ordem de um já então
poderoso militar português chamado Francisco da Costa Gomes. Assim se começou a cumprir a vontade de Moscovo
e Calecute se sentiu finalmente vingada. Depois de uma humilhante detenção
dos militares portugueses seguida de evacuação ainda mais humilhante, foi a vez
de dar início à opressão da Nação Goesa e à tentativa de aniquilação da Cultura
Indo-Portuguesa.
Mas…
…
passados quase tantos anos quantos aqueles que os portugueses demoraram para
escorraçar os reis castelhanos, em Goa
desperta agora o orgulho da própria Nação, em Cochim o túmulo (vazio) de Vasco
da Gama continua a ser alvo de romagem popular e o Hino Nacional de Portugal
foi traduzido para concanim.
A Portuguesa – ‘Heróis do Mar’
(Versão breve do Hino Nacional de Portugal,
tal como se canta ou toca para qualquer solenidade.)
Heróis do mar, nobre povo,
Nação valente, immortal,
Levantai hoje de novo
O esplendor de Portugal!
Entre as brumas da memória,
Ó Pátria, sente-se a voz
Dos teus egrégios avós,
Que há-de guiar-te à vitória!
Às armas, às armas!
Sobre a terra, sobre o mar,
Às armas, às armas!
Pela Pátria lutar!
Contra os canhões,
marchar, marchar!
--------------------------------------
Tradução em
konkânní clássico (ânthruzhí) por
Ave Cleto Afonso,
Goa.
समुद्र वीर
समुद्र वीर, म्हान जन’गण,
धिरिश्ट राष्त्र अमर,
आयज परतून एकदां ऊंच करा
पोर्तुगालची महिमा !
आठवणेच्या धुक्यांत्लयान,
ए पितृदेश, आवाज येता
तुजया श्रेश्ठ पुर्वजांचो,
जो तुका जैताक पावोयतोलो.
शस्त्रां सयत, शस्त्रां सयत !
जमनी वयर, दरया वयर,
शस्त्रां सयत, शस्त्रां सयत !
देशा खातीर लडूंक !
तोफां विरूददः,
तेज चलूंक, तेज जलूंक !
------------------------------------------------------
Transliteração
em alfabeto Romano (segundo Novo Protocolo),
da versão em
kônkânní clássico:
Sâmudrâ vír
Sâmudrâ vír, mâhan jân’gânn,
Dhirishtt rashtrâ âmâr,
Ayz pârtún êkdam únchâ kâra
Portugalchí mâhima!
Atthvânnêchya dhukyantlean,
Êh Pitrúdêsh, avaz yeta
Tujya shrêshtth purvâjancho,
Jo tuka jâitak pavôytolo.
Shastram sâyt, shastram sâyt!
jâm’ní vâyr, dârya vâyr,
Shastram sâyt, shastram sâyt!
Dêsha khatir lâddúnk!
Tôphâm virúdh,
têj châlúnk, têj châlúnk!
----------------------------------------------
Tradução no
saxttí konkânní, no alfabeto Romano (Novo Protocolo)
por Ave Cleto
Afonso, Goa.
Sômdirantle vír
Sômdirantle vír, vhôdd lôk,
Kalljidar dês ômor,
Aiz pôrtun êk pavtt vôir kaddat
Portugalcho porzoll!
Ugddasachea dhunvrantlean,
Arê Paidês, tallo aikunk ieta
Tujea nam’nnêchea purvozancho,
Zo tuka zôitak pavôitolo.
Armam dhôr, armam dhôr!
Zôm’ni vôir, dôria vôir,
Armam dhôr, armam dhôr!
Desa pasot zhuzpak!
Nôlliam add,
têz cholpak, têz cholpak!
--------------------------------------------
Tradução em inglês (tal como na internet).
Heroes of the sea
Heroes of the sea, noble people,
Valiant and immortal nation,
Raise once again today
The splendour of Portugal!
Through the haze of memory,
Oh Fatherland, one feels the voice
Of your distinguished forefathers,
That shall lead you on to victory!
To arms, to arms!
Over land, over sea,
To arms, to arms!
To fight for the Fatherland!
Against the cannons,
to march on, to march on!
--------------------------------------------
Dezembro de 2020 Em tempo: efeméride negativa não se celebra mas assina
Henrique Salles da Fonseca
Em tempo: efeméride negativa não se celebra mas refere-se fora da
data
Tags:
COMENTÁRIO:
Anónimo 16.12.2020: : Recordo-me
bem (e tu também, certamente, Henrique) daqueles dias de dezembro de 1961.
Portugal vestiu-se de luto e, naquele Natal, ao desgosto sofrido por familiares
e amigos de centenas de colonos portugueses massacrados em março desse ano, no
norte de Angola, pela UPA, vieram-se juntar, em tantos lares, a preocupação e a
angústia pela sorte dos militares destacados no Estado da Índia. Ao apelo de
Salazar do sacrifício de vidas, se necessário, bem como à sua previsão de não
haver tréguas, nem prisioneiros portugueses, nem navios rendidos, mas tão-só
soldados e marinheiros vitoriosos ou mortos, veio adicionar-se a falta de
informação do que se estava a passar realmente. Pouco e pouco emergiu a verdade
– a luta de 3 500 militares portugueses, deficientemente
armados, como dizes, perante uma força de 45 mil indianos, tinha sido débil e a
rendição rapidamente surgiu, impossibilitando a estratégia política delineada
de conseguir a condenação na União Indiana nos fóruns e areópagos
internacionais, designadamente no Conselho de Segurança da ONU. Como é sabido, a URSS exerceu o seu direito
de veto a uma moção dos EUA que condenava a invasão. Como não podia deixar de ser, estes acontecimentos
suscitaram sentimentos e reacções contraditórios, tentando-se identificar os responsáveis
pelo que acontecera, apontando uns para o pandita Nehru, outros para os militares, alguns para o poder
político que apelara a um sacrifício irrealista e que não dotara o Território
de meios de defesa adequados, enquanto outros ainda acusavam o Governo de não
ter sabido negociar a tempo. O certo é que, sete anos depois, quando
cumprimos o nosso serviço militar, notava-se ainda, nas conversas com os
militares do quadro, repercussão da invasão. Aliás, 1961 foi um annus
horribilis, pois começou com o assalto
ao navio Santa Maria e terminou com o assalto ao quartel de Beja, passando
pelos acontecimentos em Luanda em 4 de fevereiro, os quais para uns marcou o
início do terrorismo e para outros o da luta de libertação, pela “conspiração
da Sé”, para além da frustrada “abrilada” do general Botelho Moniz.
Mas o que realmente queria contar refere-se a um acto heróico, quando estava iminente a invasão do Estado da Índia.
O nome do protagonista é Jorge Anastácio e
era o responsável, naquele Estado, do Banco Nacional Ultramarino que era, como
é sabido, além de banco comercial também emissor. Pois, o
Senhor Jorge Anastácio, apesar de o administrador com quem conseguiu falar
telefonicamente tê-lo descansado porque não iria haver invasão, remeteu para
Lisboa, no navio Índia, todos os valores que estavam no Banco, designadamente
ouro e jóias. Estes valores estavam a servir de penhor a empréstimos concedidos
pelo Banco, ou estavam à sua guarda, a solicitação de clientes ou dos Serviços
do Estado, ou ainda haviam sido apreendidos por roubo ou contrabando. Esses
valores ficaram guardados na casa-forte do BNU, em Lisboa. Em dezembro de 1974, reiniciaram-se as
relações entre Portugal e a União Indiana, mas em finais da década de 80,
começou a notar-se que aquelas relações apresentavam um empecilho, para
utilizar uma linguagem dos nossos dias, e ele chamava-se – joias
da Índia. Em 1991, o BNU e o State Bank of India
assinaram um protocolo pelo qual eram devolvidos os valores dados em penhor e
os que haviam sido confiados ao Banco, desde que fosse demonstrado que eram os
respectivos proprietários. Na altura, eu estava na administração do Banco. E a
quem nós encarregámos de liderar o complexo processo de restituição? Exactamente,
ao Senhor Jorge Anastácio que, para além
de ser um verdadeiro Senhor (para não utilizar a expressão inglesa), era
assessor do Conselho de Administração. Como em tudo, desembaraçou-se
impecavelmente da incumbência.
Outros valores, indiscutivelmente pertencentes ao Estado Português,
permaneceram nos cofres, agora da CGD, accionista do BNU, a qual absorveu este.
Em 2014, ou seja, mais de meio século depois da invasão, o Museu de Arte Antiga
promoveu uma exposição das jóias que permaneceram em Portugal. Nela havia um
pequeno vídeo em que aparecia o Senhor Jorge Anastácio. Peguei no telemóvel, liguei-lhe e disse: “Meu amigo,
estou a vê-lo”. Ele riu-se muito, pois percebeu logo onde eu estava. Foi a
última vez que nos falámos. Abraço Carlos
Traguelho
Nenhum comentário:
Postar um comentário