terça-feira, 1 de dezembro de 2020

«Há sempre alguém»


Felizmente que é assim, como dizem os Trovante, pela análise de Paulo Trigo Pereira: Há sempre alguém a travar. Ou antes pelo contrário. A tramar que seja...

«Há sempre alguém que nos diz: tem cuidado
Há sempre alguém que nos faz pensar um pouco
Há sempre alguém que nos faz falta
Ahhh, saudade…»

E João Miguel Tavares também ajuda a perceber, no seu artigo do PÚBLICO de 1/12:

«OPINIÃO: PCP anuncia o seu apoio ao Governo até 2023

Se o país se afundar e a direita vencer as eleições, o PCP corre o risco de se tornar o partido do Trabant. Se o país resistir ao pós-pandemia e a esquerda ganhar em 2023, o PCP pode ser premiado pela fidelidade ao PS – e assim continuar a exibir ao mundo o incrível milagre da sua existência……»

 

O PCP tem a chave desta legislatura /premium

Doravante os OE só poderão ser aprovados com a abstenção do PCP e as suas propostas serão cada vez mais prejudiciais no futuro por serem um travão ao relançar do emprego, da inovação e do crescimento.

PAULO TRIGO PEREIRA

OBSERVADOR, 29 nov 2020

1Conforme se esperava, o Orçamento de Estado de 2021, passou só com os votos favoráveis do PS. O PCP absteve-se, e o Congresso do PCP realizou-se como previsto. Este arranjo de conveniência entre PS e PCP, decisivo para a sua aprovação, não é solução para o país, nem para o PS, mas é uma estratégia inteligente do PCP.

Nos idos anos revolucionários (de Abril de 1974 a Novembro de 1975) o PCP denunciava a democracia burguesa e não estava ainda decidido a viver com as suas regras, mas com a estabilidade constitucional, e com a constituição socialista de 1976, tornou-se seu acérrimo defensor. Do ponto de vista dos princípios o PCP teve toda a razão em não adiar o Congresso. A razão de ser da lei sobre o estado de emergência é precisamente de, ao mesmo tempo que dá poderes extraordinários ao executivo, não suprime os direitos políticos fundamentais. Alguém ainda não percebeu que apesar da COVID, estamos em plena pré-campanha para as presidenciais (apesar do-que-não-declara-se-é-candidato-já-o-ser)? Como diz a Susana Peralta, na corrida ao tabu Marcelo ganha a Cavaco. Ao contrário do PS, cuja posição é não ter candidato e desvalorizar as presidenciais, o PCP tem e já marcou terreno neste congresso com as fortes críticas do candidato presidencial João Ferreira a Marcelo. Aproveitou também o congresso para divulgar as cedências todas que o governo fez ao PCP e as propostas que conseguiu aprovar, umas vezes com o governo outras com a oposição, e que significarão um acréscimo de despesa de mais de 600 milhões.

A estratégia do PCP é assim clara e serve os interesses do seu eleitorado. Nunca dará um voto favorável ao Orçamento de Estado, e manterá a abstenção, a menos que haja algo muito “anti-patriótico” num orçamento e seja forçado a votar contra. A abstenção é algo que o PCP estará sempre disposto a negociar em cada OE em troca de concessões à sua base eleitoral: parte dos pensionistas e dos trabalhadores em funções públicas. Neste ano em particular, ter um orçamento um pouco mais expansionista, em grande parte financiado por fundos europeus, até será positivo para a economia sem grande impacto na dívida pública. Ter um orçamento aprovado e não ficarmos em duodécimos também é claramente benéfico. Ao contrário do BE a posição política do PCP foi mais construtiva. Porém este arranjo, a breve prazo, não é sustentável, nem para o país nem para o PS se quiser continuar a ser um partido relevante.

2A manter-se a viabilização do OE pelo PCP em 2022 e 2023, isso significaria o PS ser progressivamente incapaz quer de relançar o crescimento e o emprego, quer de controlar as finanças públicas. As medidas do PCP são, como de costume, todas no sentido de aumento da despesa e de diminuição de receita. Se isto em 2021, até é defensável, não o será em 2022 e 2023 com as previsões que temos neste momento, quer para a redução dos efeitos da pandemia, e da vacinação associada, quer para o crescimento económico e emprego. As medidas de política orçamental, neste período de emergência, de apoio às empresas e trabalhadores deveriam até ser mais fortes, mas de carácter temporário e não com um impacto estrutural e permanente nas finanças públicas. Se muitas são temporárias e outras de execução incerta (investimentos) há ainda outras que terão um impacto estrutural na despesa pública (e.g. contratação de novos profissionais das forças de segurança ou de médicos de família) caso aumentem o número de efectivos, mesmo considerando as saídas.

3O BE parece acreditar completamente na existência de uma crise política no final de 2021 e avaliou (provavelmente mal) que seria melhor estar claramente na oposição e colocará, por convicção ou por sentido de oportunidade, várias pedras no caminho do governo ao longo do ano de 2021 para que esta convicção se torne uma realidade (as famosas self fulfilling expectations). A questão do Novo Banco é uma delas e esta é por convicção pois sempre foi contra a venda à Lone Star, embora não usasse o principal argumento para ser contra (como explicarei em artigo só sobre o NB). Saltar fora do barco da governação é uma estratégia arriscada. Neste ano de 2020 tudo indica que o PCP terá tido mais ganhos reais e simbólicos. Não só ajudou a viabilizar o OE2021, sem se comprometer com a governação, como retirou o BE da esfera do arco da governação desta legislatura.

4.O PSD de Rui Rio, revelou através de algumas votações neste OE, quer na redução das portagens, quer no Novo Banco, posições que dificilmente serão compreensíveis pelo seu eleitorado e que necessitarão ser bem explicadas pois contrariam o sentido de responsabilidade e de sentido de Estado que Rui Rio tem tentado associar o PSD. Todos se lembram bem das reviravoltas do PSD na votação dos professores. O facto de Costa ter fechado a porta a entendimentos com Rui Rio levou-o a este voto contra. Em relação ao Novo Banco não tenho dúvidas de que viabilizará com abstenção a injecção de capital no Orçamento rectificativo. Só tenho dúvidas sobre se o montante será apenas o que estava inscrito na proposta de lei do OE ou se ainda será maior. Apesar deste voto, parece também definida a estratégia do PSD para esta legislatura. Saltou também para fora do barco.

Doravante, os OE só poderão ser aprovados com a abstenção do PCP. Se as suas propostas, neste orçamento, até foram benéficas, tornar-se-ão cada vez mais prejudiciais no futuro ao serem um travão ao relançar do emprego, da inovação, e do crescimento, ignorando por completo a justiça inter-geracional com o seu foco nos actuais pensionistas. Caberá a Costa fazer a sua análise custo-benefício político, económico e social deste apoio, mas é o PCP que tem a chave desta legislatura e para já está satisfeito em mantê-la na porta.

POLÍTICA  PCP  ORÇAMENTO DO ESTADO  ECONOMIA  GOVERNO

 

COMENTÁRIOS

Gabriel Moreira: Pensar que com o 25 de Novembro foi retirada ao PCP a sua influência ilegítima na governação do país e, agora, com um Ps pretensamente habilidoso, essa influência regressou, conclui-se que o Sr. Costa afinal é um aprendiz de feiticeiro.     Filipe Costa: Quando o objectivo de um partido passa pela automutilação, está tudo dito.     Nuno Viana: Acho que PTP tem vindo a evoluir e a assumir posições cada vez mais realistas e pragmáticas. Saúdo a evolução sem prejuízo de pensar que o Governo do sr costa é uma monumental pantominice, ausente de um projecto, senão a premissa inicial das reversões. O resto é populismo barato e inconsequente que nos levará a nova falência. De resto, como bem sabe, já temos a maior carga fiscal de sempre e a maior dívida de sempre ... chapeau.        manuel soares Martins: Como o BE se desarriscou de sócio do negócio, e já não há geringonça, proponho que daqui em diante se passe a falar de ARRANJINHO. O diminutivo sugere coisa pequenina e ...foi o que se arranjou.      Paulo Guerra: Com os principais países da UE muito mais confinados que Portugal, acho sobretudo piada ao movimento da restauração – que ninguém duvida que precisam de apoios económicos – que têm feito as manifestações que querem em Lisboa e no Porto - com muito menos cuidados que os vistos no Congresso do PCP - e agora inclusive acampados à porta da AR, com o seu porta-voz a reclamar que estamos a viver numa Ditadura?! Imagine-se o que dirá de Inglaterra, Alemanha, França, Itália ou Espanha, só para citar algumas das maiores economias. E nunca lhe deve ter passado pela cabeça que numa verdadeira Ditadura não estava de certeza acampado à porta da AR a dizer que vivemos em Ditadura ou outra asneirada qualquer. Provavelmente quando crescer também nem quer ouvir falar em vacinas. Já o pantomineiro de Belém enquanto puder utilizar as estruturas do Estado e do poder na sua campanha não passa nada. Quanto ao crescimento nunca esquecer que nada o promoveu tanto na última legislatura como os cortes da austeridade e a devolução de rendimentos às pessoas. Outra coisa totalmente diferente são as restrições da UE em termos de défice que voltarão mais cedo que tarde. Porque nenhum economista de bom senso pode pôr em causa que poucas vezes se justificou tanto investimento público como agora. E quando digo agora, digo o próximo triénio. Nem conheço outra maneira para sairmos da crise económico e social que ainda se vai sentir muito mais em 2021. O caso da TAP até pode ainda muito bem vir a ser paradigmático. Enquanto o transporte aéreo não normalizar por completo e dada a forma como chegámos à pandemia com a economia estruturada, vão ser precisos incentivos públicos. E a aviação civil não normaliza de certeza antes de 2022. Na melhor das hipóteses.       Nuno Viana >Nuno Viana: Só para citar "Mas também isso foi um logro. Sabemos hoje que Portugal foi um dos países na União Europeia que, até agora, menos apoiou a economia. Um estudo da semana passada do FMI mostra que em 38 países desenvolvidos, Portugal é o 35º em gastos com a crise em percentagem do PIB. O 4º a contar do fim!"        Paulo Guerra > Nuno Viana: O contrário é que era anormal. Não foi por acaso que antes ainda da ideia da bazuca europeia a Alemanha já tinha injectado mais dinheiro na economia alemã que a totalidade da bazuca. Por isso é que a bazuca ainda era mais urgente para países como Portugal sem recursos próprios. Não é por acaso que as crises por norma só acentuam ainda mais as diferenças entre as economias. De qualquer forma as economias também não são todas iguais. E em Portugal há uns sectores mais apoiados que os outros. Por exemplo a restauração, apesar de precisar de muitos mais apoios, também já teve muitos mais apoios que o que dizem os seus responsáveis. Há muitas formas de apoiar os diferentes sectores. Empresas já muito endividadas por norma vão sentir os mesmos problemas que países já muito endividados. E para quem decide o apoio ainda se levanta a questão se todas as empresas de um determinado sector devem ser todas apoiadas. Sobretudo quando já se sabe a posteriori que algumas já chegaram à pandemia com muitos problemas e muito dificilmente abrirão portas depois da pandemia. Além de que uma coisa é o que dizem os quadros e outra coisa é a realidade. Em França, só para citar um exemplo outra vez, há muitos fundos prometidos aos restaurantes mas até hoje ainda não viram nada. E só estamos a falar dos apoios à economia. Quando eu não acho nada menos premente os apoios sociais aos que mais perderam.      Paulo Guerra > Nuno Viana: Já para não falar que é impossível segurar alguns salta – pocinhas em Portugal sempre sem capitais próprios – também não sei de onde lhes vem o crédito - que ao segundo dia de confinamento já estavam a miar. E por mais moratórias que já estejam no terreno.   Nuno Romão: Fico estupefacto! Então quando, em 2015, António Costa, decidiu aliar-se á esquerda radical leninista e trotskista, para poder governar, não era já óbvio que essa aliança seria "cada vez mais prejudicial ao relançamento do emprego, da inovação e do crescimento económico"? Parece que as suas convicções não o impediram de colaborar com o governo Costa... José Monteiro > Nuno Romão: Tentou. Até que a desilusão o convenceu.          Antes pelo contrário: O que esta legislatura tem é as calças em baixo, e um alvo pintado no traseiro.          Joaquim Moreira: Confesso que até tenho muita dificuldade em começar, tantas as incongruências que gostaria de denunciar. Mas vou começar, pelo que, quase no fim, acaba por demonstrar. Que é um académico e também um cronista da área socialista, incapaz de ver com rigor intelectual o que se está a passar. Quando no ponto 4, depois de várias considerações, incluindo a da narrativa criada pelo PS, com o “caso dos professores”, é em conclusões muito pouco rigoroso e parco: “Apesar (...)”, o PSD, “Saltou também para fora do barco”. Já sobre os três pontos iniciais, apenas duas sugestões e nada mais! A primeira é que leia o artigo de ontem, no Público, de João Miguel Tavares: À direita, tudo é literal. À esquerda tudo é metáfora. A segunda, mais que uma sugestão é uma constatação. Com a realização do Congresso, o PCP demonstrou, que a forma como o PS está a lidar com a epidemia é um enorme insucesso!     bento guerra: Cabecinha pensadora. O "europeísta" Costa entregou a chave ao último partido comunista da Europa. Segue a recomendação da IS "o poder a qualquer custo". Aqui ao lado, Sanchez negoceia com os inimigos de Espanha, em Itália, o derrotado PD "casa" com o 5Estrelas, criado pelo clown Grilli para o "destruir", na Alemanha o SPD dá apoio ao seu adversário histórico, a CDU. O poder é que conta. Não é isso fazer política, contar assentos parlamentares?

 

Nenhum comentário: