segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Que se pode fazer?


Helena Matos traça-nos um perfil malandro, de gente acomodada que somos, vergando a espinha ao poder e fechando os olhos às irregularidades nele cometidas, de resto, de há muito, bons alunos na escola da servidão sem reclamação e da coscuvilhice sem educação. E o governo sabe-o e estimula-o com políticas autoritárias impertinentes. E assim nos vamos confinando, sábios e resignados, apenas pouco educados inter opositores, como se lê nos muitos comentários ao texto de Helena Matos, as mais das vezes em diálogo interno crítico, direccionado para os de opinião contrária, com insolências e farsas sem nível… ao nosso nível.

Mas há muitas excepções para contrariar o derrotismo. Ontem, por exemplo, assisti a mais um programa de Júlio Isidro, que nos brindou com um Inesquecível de inesquecível efeito, desta vez com a presença dos entrevistados Tozé Brito e Olga Prats, de que repescou excertos de programas que nos orgulharam e nos trouxeram memórias passadas, programa simultaneamente revelador da qualidade intelectual do entrevistador Júlio Isidro e do seu intenso trabalho de repescagem de programas de muitos dos quais foi também mentor. O de ontem terminou com Olga Prats a brindar-nos ao piano com dois trechos musicais, para além da revisão musical a que o programa de Júlio Isidro já nos fizera assistir, com tanto prazer…

Os passados da cabeça /premium

O ministro da Economia manda esvaziar prateleiras de supermercados; a ministra da Saúde quer confiscar empresas; do ministério da Justiça saem documentos manipulados… e nós a ver cornos no Capitólio.

HELENA MATOS

OBSERVADOR, 17 jan 2021

As cirurgias aos doentes com cancro são adiadas (ainda mais) e os computadores prometidos aos alunos em Março do ano passado  nunca chegaram. Mas o que leva os portugueses a manifestar-se? A vinda de Marine Le Pen a Lisboa.

Portugal é um país literalmente passado da cabeça: quanto mais a nossa vida se agrava e o regime se esboroa, mais nos indignamos com o longínquo e nos tornamos indiferentes ao que nos toca.

Assim, fazem-se manifestações porque uma dirigente política francesa vem a Lisboa mas caso alguém se manifeste por aquilo que está a acontecer neste país ou nesta mesma cidade de Lisboa, logo se vê oportunamente rodeado de suspeições várias como aconteceu a Ljubomir Stanisic aquando dos protestos dos proprietários de restaurantes.

O nosso corpo está aqui mas o cérebro está onde o leva a agenda mediático-socialista (eu sei que estas duas palavras se tornaram sinónimas mas mesmo assim insisto no pleonasmo). Todos os dias gente que a si mesma atribui certificados de democrata discute como ilegalizar aqueles que eles definem como fascistas. Simultaneamente medidas em catadupa normalizam o que é próprio das ditaduras. Agora dá-se como certo que os velhos residentes em lares ilegais não terão o seu voto recolhido. Quando nos passou pela cabeça que em Portugal se inibiria o direito de voto a alguém em função da natureza da sua residência? Nunca, claro. Nós somos uma república. Estamos imbuídos dos princípios da igualdade, da solidariedade… Para lá do óbvio – não foram os velhos que escolheram ir para um lar ilegal, eles foram para lares ilegais porque não existem outros (e vão continuar sem existir porque deste modo a Segurança Social poupa o financiamento que teria de lhes garantir caso os legalizasse)não se pode aceitar que a natureza da residência defina quem pode ou não votar. Indignações com este grave precedente? Os constitucionalistas que tanto constitucionalizam a propósito dos direitos adquiridos não têm agora nada a dizer? Ora, ora quem se pode preocupar com os votos dos velhos instalados em lares ilegais quando Marine Le Pen veio almoçar a Portugal? Isso sim é que é preocupante!

Disseram-nos que Portugal era um milagre e a nossa cabeça passou-se com tanta alegria. Depois do milagre da descrispação, do milagre do dinheiro para as reposições, do milagre do futebol, do milagre do Festival da Eurovisão, éramos outro milagre no combate ao Covid. Todos os dias a nossa cabeça partia à descoberta dos falhanços em geografias políticas rigorosamente seleccionadas. Um dia, no meio de mais umas notícias sobre o horror do Covid nos EUA e do desastre da estratégia seguida pelos suecos, descobrimos que o inferno era aqui. E o país o que discute? Manaus. Sim, Manaus. Porquê Manaus no Brasil e não a Bélgica, país onde o número de mortos ultrapassa tudo o que se pode imaginar? Ou com a Argentina, o país que uma “quarentena eterna” não salvou do Covid mas garantiu a fome (sim, na Argentina outrora grande potência agrícola, agora existe fome)? Ora, porque como toda a gente sabe a culpa das consequências do Covid no Brasil é de Bolsonaro. Já a culpa das consequências do mesmo Covid pelo mundo varia em função da simpatia ou do respeitinho que esses governos têm ou impõem nas redacções e organizações internacionais. No topo da tabela da desresponsabilização está o governo de Portugal, país onde a culpa dos maus números é sempre do portugueses que não cumprem como deviam as sábias instruções do seu governo. Portugal, recordo, é o país em que não se conhece um caso de contágio por Covid em nada que resulte da responsabilidade do Governo, como são os transportes públicos cheios e as filas resultantes da imposição de horários reduzidos nos supermercados mas em que, dos parques infantis aos passeios ao ar livre, se considera perigoso tudo o que não seja ficar encerrado em casa.

Em conclusão, os governos de esquerda terão sempre um Manaus para entreter a cabeça dos portugueses. E quanto pior as coisas correrem em Portugal mais vamos andar empenhados em apedrejar o ódio de estimação do momento e mais tempo vamos gastar em combates que nada têm a ver com a nossa vida presente.

Pode o Governo, numa espécie de treino antecipado para a Venezuela que seremos, mandar, em nome da regulação da concorrência, esvaziar prateleiras de supermercados e interferir desastradamente nas taxas cobradas pelas empresas de distribuição pois grupos como o agora nomeado para combater o racismo inventarão todos os dias um caso para gerar comoções e fúrias.

Pode o procurador José Guerra manter-se no cargo apesar das evidentes falhas no seu curriculum e das ainda mais evidentes tentativas do ministério da Justiça para as esconder que ninguém perguntará o porquê de tanta manobra pois esgotaremos a nossa indignação com a morte dos veados numa herdade. Ou dos cães num canil. Ou dos ursos lá longe.

Pode a ministra Temido continuar a privar milhares de portugueses de tratamentos médicos unicamente por razões ideológicas pois o foco das nossas preocupações estará no combate ao heteropatriarcado. Ou no combate ao que designam como alterações climáticas.

Pode António Costa acusar quem o critica de liderar uma “campanha internacional contra Portugal” …

Podem o que quiserem porque nós estaremos sempre com a cabeça longe. Enquanto não se perceber isto não se percebe por que razão está antecipadamente derrotado o espaço da direita mesmo quando ganha.

Nunca nos passou pela cabeça que viesse a ser assim. Mas é assim que é.

POLÍTICA  GOVERNO  EXTREMISMO  SOCIEDADE  SOCIALISMO

COMENTÁRIOS

Artur Parracho: Como sempre HM assertiva, objectiva. Infelizmente ė o estado em que se encontra Portugal, e num futuro próximo não se vislumbra que algo se altere. Parabéns pelo excelente artigo.

Alfaiate Tuga: Não são passados da cabeça, têm a cabeça no lugar e a funcionar a 100%, tudo o que é referido e bem no artigo é verdade e lamentável, mas só afecta uma pequena parte da população, a grande maioria dos eleitores estão como querem e nenhum partido político lhes oferece melhor perspectiva do que os que sustentam o actual governo. Vejamos, perante uma crise sanitária prolongada e sem precedentes nos últimos 50 anos, quem não perdeu rendimentos? FPs e pensionistas, qual foi o último governo a cortar rendimentos a esta gente? PSD + CDS, resultado á vista, CDS quase desapareceu e PSD com 25% de intenções de voto, quem devolveu rendimentos? O PS mais a sua geringonça, resultado PS com 40% de intenções de voto. Uma parte substancial dos FP’s estão agora em casa em Teledescanso com salário a 100% e com garantia de que a empresa lhes deposita mensalmente os euros na conta o vai continuar a fazer até à sua aposentação, tem ainda um cartão ADSE no bolso não vão necessitar de cuidados de saúde que o seu patrão não é capaz de prestar aos restantes cidadãos. Esta casta protegida é composta por 700 mil FPs e 3 milhões de pensionistas que de passados da cabeça não tem nada como acabei de explicar. Mau está para os que estão a perder rendimentos e pior para os que estão a tirar bilhete por incapacidade de SNS (os FPs e aposentados do estado não padecem destas maleitas, têm ADSE). Portanto passados da cabeça estão os que acham que isto tem solução que não passe pela pré-bancarrota, pois só quando estiver prestes a acabar o dinheiro para salários e pensões assegurados pelo estado é que a esquerda abandona o poder, até lá pode fazer bem pior do que já fez, que não passa nada. Já agora, para não restarem dúvidas, sou a favor para fazer face aos custos da pandemia e distribuir os sacrifícios por todos, de um corte temporário nas pensões acima de 1000€ de 10% e 20% para pensões acima dos 2000€, os FPs que estão em casa em teledescanso deveriam ser abrangidos pelas mesmas medidas. Sou também contra o Lay-off pago a 100%, permite que uns vão para casa com o salário completo e outros tenham o azar de ter que continuar a vergar a mola para levar o salário para casa no final do mês. Já sei que não vai acontecer, senão lá se iam os 40% de intenções de voto.

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