sexta-feira, 25 de março de 2022

Quando foi na Chechénia não houve ralação


Por cá. Era fora de portas. Mas a Rússia ganhou poder e Putin ganhou garbo a matar, ou seja, a pôr os seus homens a matar e a morrer, que lá nisso, ele provavelmente não se mete, pois tem muitos a fazê-lo por ele, sabemo-lo. Nós por cá, desde a 2ª guerra que vivemos mais em paz, desabituámo-nos das armas, excepto aqueles que tinham guerras em África, mas eram mais harmoniosas, para todos os efeitos, e livrámo-nos delas, também para os russos e americanos fazerem os seus negócios sem tanta bagunça para eles. E Putin, vá de se rir dos Ocidentais, ameaçando-os com o seu poder nuclear, que aqueles também possuem, mas não se atrevem a usar, é claro, sensatos que são, ou cobardes, na opinião de Putin. Rui Ramos mostra bem que o pretexto de não entrada na guerra, válido para a Ucrânia, que não pertence à Nato, deixará de ser válido no caso das outras repúblicas que ladeiam a Rússia e que Putin vai destruir a seguir. O Ocidente terá que entrar mesmo na guerra, deitando tudo a perder, mesmo para Putin.

A liberdade não se compra, defende-se

Não vale a pena correr o risco de uma guerra mundial por causa da Ucrânia? E pela Estónia, vale? Ou pela Lituânia? Ou pela Polónia? Até onde pode ir Putin?

RUI RAMOS Colunista do Observador

OBSERVADOR, 25 mar 2022, 00:4211

A Guerra Fria entre a União Soviética e o Ocidente não decorreu sem algumas regras. Uma delas era evitar confrontos directos. Guerras por procurador, em que um dos lados armava um adversário local do outro, eram aceitáveis. Mas não mais. A cautela tinha uma razão óbvia: o armamento nuclear, e o risco da sua utilização numa guerra aberta entre o Ocidente e a União Soviética. Tudo isso fazia sentido, e ainda faz sentido, agora que já não há União Soviética, mas há a ditadura de Putin.

É por isso que nada há a dizer acerca do cuidado da NATO em furtar-se a situações de combate com a Rússia de Putin. Mas já há, no entanto, algo a dizer acerca da aparente falta de um cuidado similar do lado de Putin. A invasão da Ucrânia revelou assim uma estranha assimetria entre a Rússia de Putin e a NATO, e é óbvio que essa assimetria é uma grande vantagem para Putin. Para já, permitiu-lhe invadir mais um país, e, segundo a táctica refinada na Chechénia, começar a cercar e a destruir as suas cidades. Está para se saber até onde é que Putin aproveitará a relutância ocidental em fazer-lhe frente no terreno. Não vale a pena correr o risco de uma guerra mundial por causa da Ucrânia? E pela Estónia, vale? Ou pela Lituânia? Ou pela Polónia?

Como é que se chegou a esta assimetria? Se perguntássemos a Putin, o ditador falar-nos-ia talvez da “decadência” do Ocidente, e da ansiedade com que os ocidentais fogem de todos os riscos. Nos anos 80, a esquerda pró-soviética marchava nas capitais europeias aos gritos de “better red than dead”, que poderíamos traduzir muito exactamente por “mais vale viver ajoelhado do que morrer de pé”. Teremos chegado a esse ponto? Estamos medrosos? Não, é pior do que isso: estamos iludidos sobre o nosso poder.

Na Guerra Fria, a União Soviética quebrou primeiro. Dessa vitória sem combate, tirou muita gente no Ocidente a lição de que, contra sistemas políticos menos eficazes em gerar inovação e conforto, não precisava de lutar para vencer. A história estava do seu lado. Bastaria aos ocidentais ficarem sentados no sofá, para verem o mundo render-se às suas ideias e modo de vida. A globalização, só por si, resolveria tudo. Sim, a China ainda teria uns anos de ditadura comunista e a Rússia de caos pós-comunista. Mas encaixadas no comércio mundial, acabariam por democratizar-se ou, no mínimo, por ter interesse na manutenção da ordem global. Daí, a Ocidente, a redução dos gastos com a defesa, a retirada militar do resto do mundo (que só Bin Laden perturbou brevemente), e a dependência energética e industrial da Rússia e da China. Os ocidentais acreditaram mesmo que podiam comprar a liberdade, como compram gás russo ou telemóveis chineses. Mas as compras de gás e de telemóveis não democratizaram a Rússia e a China, nem sequer as colocaram do lado do Ocidente.

Esta visão deriva de uma ideia errada da Guerra Fria. O Ocidente não prevaleceu simplesmente por ser mais rico, mas porque nunca houve dúvidas da sua determinação em defender-se. Em 1948, os EUA e os seus aliados não deixaram cair Berlim Ocidental; em 1950, combateram pela Coreia do Sul e arriscaram mesmo um choque com a China comunista; em 1962, os EUA enfrentaram a União Soviética em Cuba. Nem tudo correu bem. A ajuda ao Vietname do Sul contra a agressão do Norte comunista, a partir de 1965, correu mesmo mal. Mas a disponibilidade das nações ocidentais para combater foi sempre clara e ajudou a União Soviética a perceber que não podia passar certos limites. Em 1962, Khrushchev recuou em Cuba. Durante a Guerra Fria, a União Soviética teve tanto receio de uma guerra com o Ocidente como o Ocidente de uma guerra com a União Soviética. Foi essa reciprocidade no medo que garantiu a paz na Europa até 1989. É essa reciprocidade que tem de ser claramente restabelecida agora com a Rússia e com a China, como única maneira de evitar guerras maiores.

Não, não estou a recomendar um confronto directo da NATO com a Rússia na Ucrânia. Os ucranianos, depois de um mês de invasão, já provaram que não precisam de quem combata por eles. Mas precisam certamente de armamento, de informações e de outros apoios. O Ocidente deve fazer o que aparentemente já está a fazer: submeter a ditadura de Putin a todas as sanções e dar aos ucranianos os meios necessários para resistirem à invasão e ocupação estrangeira. Mas deve fazer mais: esclarecer “linhas vermelhas” (por exemplo, sobre a violação de fronteiras da NATO ou o uso de armas nucleares na Ucrânia) e não deixar a Putin qualquer dúvida de que sofrerá consequências se as pisar; e declarar, como a ONU já declarou em 2014 no caso da Crimeia, que nunca reconhecerá qualquer alteração de fronteiras imposta pela violência.

Irrealismo? Irrealismo é pensar que Putin passará a ser um bom rapaz se lhe derem Odessa para juntar à Crimeia. Ganhando, não ficará por ali, porque é o ditador de um Estado falhado, que só pode manter-se pela expansão imperial. Por isso, o Ocidente não tem outra opção senão fazê-lo perder a face na Ucrânia, como explicou ontem a primeira-ministra da Estónia. É arriscado? Mais arriscado é deixá-lo convencido de que tem toda a licença para mais aventuras violentas. Só uma derrota fará a ditadura russa recuperar a sua parte do medo. Trata-se da Ucrânia, o que já seria muito, mas não se trata só da Ucrânia. Trata-se da segurança das nações ocidentais e da sua liberdade: porque se alguma coisa esta guerra já provou, é que a liberdade não se compra, defende-se.

GUERRA NA UCRÂNIA   UCRÂNIA   EUROPA   MUNDO

COMENTÁRIOS:

PortugueseMan: ...É por isso que nada há a dizer acerca do cuidado da NATO em furtar-se a situações de combate com a Rússia de Putin...Não há...? Esta está mesmo muito boa. Não há nada a dizer sobre as declarações diárias de que Putin não se atreva a atacar países membros da NATO...? Mas é preciso andarmos com declarações destas todos os dias? Pensava que não havia dúvidas... Há...? É claro que se queremos atrasar a Rússia, antes que esta venha falar com a NATO, deveríamos estar muito mais empenhados na Ucrânia. A NATO não se pode envolver? Bem, os países europeus podem por sua livre iniciativa e fora do âmbito da NATO, ou seja, declarando que os EUA estão fora nesta iniciativa ir ajudar a Ucrânia por todos os meios. Os europeus, mais de 400 milhões e a zona mais rica do mundo, podem dar assistência aos ucranianos. Com as tropas europeias, aviões europeus, mísseis europeus, navios europeus... Podem deixar de comprar energia russa, agora até é uma óptima oportunidade, a Rússia quer pagamentos em rublos a partir do mês que vem, coincidência, costuma ser o mês em que a Europa começa a encher os seus reservatórios com gás russo para o próximo inverno... E deixamos os americanos livres para fazer outras coisas. Como por exemplo terem tempo de apanhar Assad quando este resolve ir fazer uma viagenzita aos Emiratos. É que os americanos devem andar mesmo distraídos, porque Assad teve que passar por espaço aéreo controlado pelos americanos, DUAS vezes. Se calhar ainda escoltado por algum F-15. Portanto os europeus que tratem das coisas sem se preocuparmos com o nuclear e sigam os sábios concelhos de alguém que tem experiência em martelar com força, teclas de um teclado.              FME: O poder na Rússia também mudou, creio. Na URSS, nunca nenhum líder comunista, à exceção de Stalin, mas não existia o risco nuclear, teve tanto poder como Putin. Na era soviética o poder emanava do politburo, e se um membro defendesse a utilização do nuclear os restantes podiam acalmá-lo. Com Putin, como se viu nas reuniões televisionadas no Kremlin que antecederam a guerra na Ucrânia, não existe politburo. A Rússia e o mundo depende do estado de alma de um sanguinário. Putin reúne em si os três poderes; executivo, legislativo e judiciário. Putin é absolutista na Rússia. Mas acredito que Putin também terá medo do nuclear. Está a esticar a corda para sentir a têmpera do Ocidente. Já podia ter entrado pela Moldávia ou pela Geórgia mas não o fez. Todavia, ninguém consegue calcular o que vai na cabeça de Putin. Já sabemos que não tem medo de invadir países e já disse que sonha em recuperar o imperialismo russo da era soviética Putin está neste momento ao ataque. A Ucrânia parece ser um capítulo no plano de Putin para recuperar o imperialismo russo. Depois da Ucrânia pode haver um tempo de acalmia, mas depois voltará ao ataque. Na minha opinião, mais cedo ou mais tarde, o Ocidente vai ter que o enfrentar. Os apoiantes de Putin manifestam-se na Rússia pela anexação dos países Bálticos. Reclamam Riga, Vilnius e Talin. O corredor de Suwalki poderá ser o próximo objetivo de Putin. Os polacos estão com medo do agressor. O corredor de Suwalki corresponde à fronteira da Polónia com a Lituânia, países pertencentes à NATO e à UE, mas corresponde também à ligação por terra entre Kaliningrado e a Bielorrússia, além de poder isolar os países Bálticos de terem ligação terrestre com a UE.           Carlos Silva: Caro RR, Daqui a 15 dias falamos. Até lá, caso a coisa não se resolva, pode crer que a "brincadeira" não ficará só com a Ucrânia.         Carlos Quartel: Rui Ramos tem razão. Por este modo de ver, então Putin pode invadir quem quiser, em todo o mundo, com excepção dos países da Nato. O que há que assumir é que esta guerra só aconteceu porque americanos e europeus antecipadamente declararam que não iam intervir. Quanto Biden, muito sério, declarou que se Putin atacasse, viriam aí grandes sanções, estava a dar autorização a Putin para  avançar. Sanções?? Mesmo um idiota às vezes tem razão e neste caso Trump  esteve 100% certo. Se lhe tivessem dito que a Ucrânia é território independente, reconhecido por centenas de países, com forte espírito de nação (como se está a ver, no terreno) e que o mundo civilizado não podia tolerar invasões bárbaras em 2022, então talvez Putin pensasse duas vezes antes de lançar as suas hordas na destruição e aniquilamento de um estado, com todas as misérias que isso arrasta. Não se aprendeu nada com Hitler e repetiu-se o erro. Com doidos facínoras, bandidos, tocados por projectos megalómanos não há que ter contemplações

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