O texto de Maria João Avillez é uma crónica
ponderada segundo os parâmetros da sua habitual elegância de pensamento e forma
discursiva, sobre uma tal monstruosidade praticada nestes tempos de fraternidade
instituída em doutrina, que não pode deixar ninguém discordante do claro e
honesto pensamento da sua autora. Mas deixou, afinal, nesse exemplar de
comentador que ironiza alarvemente sobre a “tiazinha”, na sua raiva de lhe
reconhecer uma nobreza que a ele falta, aparentemente apoiante da tal
monstruosidade, sem ousar afirmá-lo, todavia, na sua cobardia de macho que
desfere a sua valentia sobre o sexo da fragilidade física, sem outros
argumentos que esses tais que apresentou, próprios da sua fragilidade mental.
Novos ventos, outros tempos
Na análise de Putin, a Ucrânia é uma
“ficção”. O argumento despedaçou-se: ao defender-se assim, a Ucrânia demonstrou
o contrário. Só se defende assim o que é muito nosso.
MARIA JOÃO AVILLEZ
OBSERVADOR, 02
mar 2022, 00:546
1 Não
sei se foi, mas pareceu que foi. Pareceu que ao fim de três dias da acção mole
e do gesto hesitante das instituições políticas europeias e norte americanas
face a Putin, a resposta tonitruante começou pelos “leigos”. Primeiro foi a
inesperada capacidade de heroicidade da resistência ucraniana, uma espécie de
indiscutibilidade que espantou o mundo. (Voluntariamente pertencentes a
sociedades instaladas, estranhamos qualquer forma de heroicidade); depois houve
as pessoas: esses “leigos”, os anónimos, a rua, os povos. Isso a que
vulgarmente se chama opinião pública e que encheu, de lés a lés, os écrans do
planeta, numa veemente, espontânea condenação do monstro. Porventura também ela
um ímpeto inesperado que se auto-organizou numa veloz cadeia contra a
brutalidade. Um sobressalto que ditaria outros. (ah, afinal o mundo não estava
perdido?)
2E
houve a política, bem entendido. Posso ter-me comovido com a dimensão global da
rejeição popular a Putin, mas não distraído: à política o que é da política. Antes
do mais a unidade sem fissura entre os estados membros da UE, um extraordinário
factor político no qual não se acreditaria meia hora antes. (não nos
iludamos, porém: não fora a bravura de aço dos ucranianos e a sua
coragem sem freio, amparadas na extraordinária figura de Zelensky e teria
havido essa coesão que agora nos parece segura?)
Mas
sim, seja: dissiparam-se as idiossincrasias e os humores políticos a que
27 países e os seus chefes nos têm sobejamente habituado e ergueu-se uma
vontade comum, capaz de uma resposta política comum. A inexcedível gravidade e complexidade da invasão da
Ucrânia pelas tropas russas não era para menos, mas era preciso fazê-lo e a
União Europeia fê-lo. Tardou mas arrecadou.
Agiu a uma só voz, uma só vontade política, uma só resposta, no muito eloquente
endurecimento das sanções.
Tal
concertação veio mais tarde do que devia e teria sido preciso, mas veio. Veio
também graças ao indispensável — e oh quão também ele inesperado — alicerce que
foi a histórica
mudança geo-estratégica da Alemanha.
Não se sabe se Olaf Scholz inquietou esse — só aparentemente? —
inassustável Putin com o estarrecedor discurso onde anunciou como a Alemanha
pensará daqui em diante as suas relações externas. Sabe-se que surpreendeu a própria União Europeia, o
ocidente e o mundo com um novo posicionamento face à Rússia e com tudo o
que isso implicará de diferente por um lado, de novo por outro. Não foi pouco e poderá ter sido salvífico.
Seguiram-se outros gestos politicamente
muitíssimo relevantes no actual desconcerto do mundo: a reacção da Turquia — segundo
poderio militar no seio da Nato e comandada por um líder do qual o ocidente
desconfia e que o mundo teme; a atenção
prudente da China (com os olhos em Tawain); a “colaboração” da
neutral Suíça também ela promotora de sanções; a resposta do Japão, da
Austrália, de alguma África. E veja-se — e ouça-se — a propósito do
continente africano o discurso do embaixador do Quénia na ONU há dois
dias, para citar alguns dos que se juntaram a esta espécie de inorgânica
task-force — política, militar, diplomática, económica, monetária. Para a
qual não pode ter deixado de contribuir a arma de destruição maciça enviada a
Putin pelo embaixador da Ucrânia no mesmo dia e na mesma ONU, através da parte
final do seu extraordinário discurso. Um dia
histórico: haverá
melhor certificado da excepcionalidade deste momento global que a própria excepcionalidade
da convocação desta Assembleia Geral das Nações Unidas? Outro sobressalto, mais
um ciclone.
3Putin,
que acha a Ucrânia uma ficção” — a Ucrânia é dele, tem de voltar ao redil —
deve ser o mais espantado com a capacidade de resistência que ela tem exibido
ao mundo, a si própria, mas sobretudo à Rússia e especialmente a ele, Putin. E eis-nos no ponto mais frágil da argumentação do
chefe russo: a Ucrânia demonstrou que não é uma ficção justamente
pela forma como se tem defendido. Só se defende assim o que é nosso. Muito
nosso.
4Os
ventos também sopraram sobre mentes e gentes, convocando-as para a dádiva de
toda a ordem na escala da necessidade humana. Tem havido acolhimento
(imediato), disponibilidade, bens, meios, dinheiro, tempo. O tempo livre e não
livre de cada um, os meios ou a falta deles de todos. Por entre a barbárie e o
infortúnio, no limite do horror, a natureza humana lembra-nos que é capaz de
produzir o bem e de o multiplicar dentro e fora das suas portas, nas piores
condições.
É também no limite do horror que a
dignidade se pode tornar sinal e luz: a dignidade que vê nos rostos ucranianos,
nas praças, nas filas, nos escombros, nos comboios. Nas longuíssimas esperas
por algo que não seja aquilo: um país devastado pela irracionalidade da
demência e da violência. Uma pátria remota e arredada da confortável bolha ocidental
onde nos repimpamos de liberdade, relativismo, demissão, consumo e uma
considerável dose de irresponsabilidade. Talvez a bolha agora se transforme em
algo de menos deprimente. Que é outra maneira de falarmos de seriedade.
5À
hora a que escrevo, terça-feira de manhã, todos temem o pior: estamos a
falar de Putin. O pior é a invasão e depois ocupação de Kiev que deixará
inevitavelmente expostas a heroica mas desamparada fragilidade militar e
numérica de uns – os brutalmente invadidos; e a violência bárbara dos ocupantes.
Conhecemos o guião: sirenes, tanques,
invasão, ocupação, mortos, feridos, rendição, prisão, mais mortes.
Desaparecimentos. Horas depois, o silêncio e, sobre ele, a bota de um fantoche
governo. Talvez
também rezar. Sim, porque não?
GUERRA NA
UCRÂNIA UCRÂNIA EUROPA MUNDO
COMENTÁRIOS:
Cisca Impllit: Repimpamos, repimpamos! Até que uma crise séria
nos faça ter a cabeça límpida. Fernando
Pinto: "Na
análise de Putin, a Ucrânia é uma “ficção”. O argumento despedaçou-se: ao
defender-se assim, a Ucrânia demonstrou o contrário. Só se defende assim o que
é muito nosso" ....ao nível da escola primária.... um texto com muito,
para não dizer nada ...tipo novela...lugares comuns, refrasear o que já está
escrito há semanas... a tia não deve saber nem em que dia está... Cisca
Impllit > Fernando
Pinto: Escola
primária - faz bem a todos nós! E falta, muita falta e de há muito! josé maria: Maria João Avillez, não sei se já reparou mas o
Rússia Unida é um partido de direita liberal, liderado pelo cristão ortodoxo,
Vladimir Putin, o equivalente russo da IL e do CHEGA, que se encontra
associado, como observador, na Internacional Democrata Centrista, grupo que
abrange apenas partidos de direita, mormente de inspiração democrata-cristã?
Não tem nada para comentar? Ignora esses factos? Passam-lhe ao largo? Cisca
Impllit > josé maria: Desculpe, Sr. JMaria, a leste anda V.Exa há
muito; a vaguear por aí aos tropeções e a a tentar fazer outros tropeçar em si! Joaquim Rodrigues: Neste momento é o povo ucraniano que está a dar o
peito às balas, na primeira linha da defesa da Europa, dos direitos humanos, da
liberdade e da democracia, naquela linha vermelha que nos separa dos oligarcas
russos, com o Putin à cabeça. Senhores do
PCP, BE e derivados, escutem bem: quem vai tratar da saúde ao Sr. Putin vai
ser, mais tarde ou mais cedo, o povo russo. O
tempo de vida do Sr. Putin vai ser o tempo necessário até que o “povo russo”
tome consciência de que o Sr. Putin não passa de um impostor ao serviço dos
“oligarcas” russos. O Sr. Putin, nascido
e criado no KGB, está a servir-se dos “mitos de grandeza imperial” inculcados,
durante décadas, pelo regime totalitário soviético no povo russo, para esconder
o fracasso económico e social e a miséria moral a que o dito “comunismo”
condenou a Rússia. São, por isso, muito
importantes, todas as manifestações civis que, por todo o Mundo, se realizem,
de repúdio à acção terrorista da oligarquia russa e do Sr. Putin, contra o povo
ucraniano. Cada manifestação civil,
qualquer que seja o local do mundo em que se realize, é mais um incentivo a que
mais medidas sancionatórias, contra a oligarquia russa, sejam tomadas e é,
acima de tudo, mais um ponto de interrogação na mente de cada cidadão russo,
acerca da bondade dos propósitos do Sr. Putin.
O “povo”, de que os “iluminados” do PCP e BE, totalitariamente, se
arrogam ter o direito exclusivo de representação, vai ser o “povo” e, em
particular, neste caso, os “povos ucraniano e russo”, que vão
"tratar" da saúde ao Sr. Putin. Quanto
mais depressa melhor.
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