domingo, 7 de abril de 2019

A questão do Brexit


O artigo de Rui Ramos, historiando as razões do Brexit, parece defendê-lo, responsabilizando a U E na sua intransigência contra o RU. Logo provocou comentários ferozes, cujas razões nos vão alertando para a fragilidade dos conceitos de RR, sobretudo o primeiro comentador, Miguel Queirós, que se atira assanhadamente contra o articulista, em texto ainda mais extenso do que o deste, desmontando os seus argumentos e combatendo-os. O mesmo fazem muitos outros, tornando o assunto lição preciosa, que nos transmite tantos dos cordelinhos que movem os vários intervenientes na farsa. Gostei da lição e termino com o comentário seguinte, de William Smith, que coloco antecipadamente, como uma nota de humor e graça, em que alinho: “Eu já não percebo nada relacionado com o Brexit. Mas o pior é que já reparei que todo o mundo tem uma opinião sobre o assunto. A minha, de certeza que é igual a uma delas. São tantas! No entanto, se virmos bem, tem de haver alguém (se ainda não morreu) que saiba realmente o que se está e irá passar.”
 O Brexit para além da indignação e da chalaça /premium
RUI RAMOS
OBSERVADOR, 5/4/2019
O Brexit revela a vulnerabilidade da União Europeia, incapaz de lidar com questões políticas e diplomáticas, a não ser sob uma forma legalista e burocrática.

Se houvesse dúvidas sobre a incapacidade contemporânea para enfrentar o lado mais trágico da política, bastaria examinar os comentários sobre o Brexit, onde toda a gente parece ficar satisfeita com descobrir “erros”, britânicos ou europeus. É tempo de ir além dessa santa simplicidade.

A ideia de David Cameron, com o referendo de 2016, não era provocar o Brexit. Era, pelo contrário, matar de vez a questão europeia que desde a década de 90 divide e corrói a política no Reino Unido. Cameron esperava obter primeiro algumas concessões da UE e assustar depois o eleitorado com a ideia da saída. Parecia uma boa jogada, como no caso do referendo escocês. Acontece que os europeus não lhe concederam nada e que a crise das migrações contrabalançou outros receios. E se Cameron não tivesse arriscado? Talvez estivesse agora a ser destruído pela questão europeia, tal como John Major em 1995, e todos deplorassem ele não ter liquidado a questão com um referendo há três anos.
Theresa May não tem força para impor acordos às facções no parlamento. Mas o problema agravou-se precisamente pela tentativa de May, em 2017, para arranjar essa força, através de eleições antecipadas. Todos contavam que ganhasse, até os seus inimigos. De facto, teve uma enorme votação, que noutras circunstâncias lhe teria dado uma bela vitória, não se desse o caso de os trabalhistas, pelo seu lado, também terem conseguido mobilizar o seu eleitorado. Em vez de aumentar a sua maioria, May perdeu-a e ficou mais fraca. E se não tivesse arriscado? Provavelmente, estaria com os mesmos problemas de disciplina partidária, mas com toda a gente a lamentar que não tivesse feito eleições em 2017 para submeter as facções.
Os azares de Cameron e de May nunca, porém, teriam tido efeitos tão graves sem a intransigência e incompreensão da UE, isto é, da França e da Alemanha. O Reino Unido foi sempre um problema para o eixo franco-alemão. A UE funciona essencialmente como um mercado agrícola e industrial protegido. É um bom negócio para a agricultura francesa e para a indústria alemã. Mas a grande especialidade britânica são os serviços. Ora, os serviços são o sector com mais barreiras dentro do mercado único. Por isso, a UE tem servido sobretudo para abrir o mercado britânico à agricultura e à indústria do continente. Daí o enorme défice comercial do Reino Unido com a UE. A Alemanha e a França, porém, nunca gostaram de abrir excepções. Perante o referendo e depois o Brexit, mostraram-se ainda mais duras. Primeiro, tiraram o tapete a Cameron, não lhe fazendo concessões. Depois, recusaram-se a entender o Brexit como uma questão política e diplomática, preferindo reduzi-lo a um processo legalista e burocrático, com alguns vexames à mistura sobre a Irlanda do Norte e Gibraltar (leia-se a esse respeito a investigação do Político).
Como noutros casos de arrogância, talvez aqui haja sobretudo consciência de uma fragilidade. Os governos da Grécia, da Itália, da Polónia ou da Hungria, cada um à sua maneira, têm sugerido o que poderia acontecer se, de repente, houvesse flexibilidade. O entendimento da política também não é o mesmo dos dois lados da Mancha. No Reino Unido, há muitos políticos convencidos de que a UE não os deixa fazer política da maneira como ela deve ser feita, soberanamente. Mas nos países continentais, quase todos carregados com memórias de ditaduras fascistas ou comunistas, as classes dirigentes têm medo de colocar grandes opções políticas num horizonte de soberania. Daí, a tentação de fazer da integração europeia uma fatalidade jurídica e técnica, em vez de uma matéria de debates e de escolhas políticas e diplomáticas. Mas por vezes, o que não dobra acaba por partir-se.
Visto desta maneira, talvez o Brexit seja menos motivo de indignação ou de chalaça. Mas é tempo de ver as coisas como são, e não como nos convinha que fossem.

COMENTÁRIOS:
Miguel Queirós: … Rui Ramos é conhecido pelas suas crónicas de exaltação da extrema direita. Por ele, o Observador era um pasquim de propaganda alt-right. Hoje presenteou-nos com mais este dispensável exercício de desinformação, num artigo pejado de ideologia populista e visões distorcidas da realidade. Analisemos pois o seu conteúdo:
"A ideia de David Cameron, com o referendo de 2016 [...] era matar de vez a questão europeia que desde a década de 90 divide e corrói a política no Reino Unido."
ERRADO: A ideia de Cameron com o referendo era ganhar as eleições roubando votos ao UKIP. No mandato anterior, Cameron tivera de dividir o poder numa coligação com os Liberal Democrats e as sondagens apontavam para um resultado ainda mais fraco dos Conservadores. O Referendo foi uma promessa eleitoralista de Cameron. A questão da UE não corrói a política do Reino Unido. A maioria do Parlamento é Remainer. A questão da UE corroi é o Partido Conservador onde há quem tenha muito a ganhar com o Brexit, em negócios pessoais. Isso sim, talvez preocupasse Cameron.
Rui Ramos defende que Theresa May ficou enfraquecida por causa do fraco resultado das eleições antecipadas que ela própria convocou. Mas isso foi o sintoma... Não a causa. Theresa May está enfraquecida em primeiro lugar porque ela que era Remainer, vendeu a alma ao diabo a troco de poleiro como PMA fraqueza de May é estrutural: Começa quando ela trai as suas próprias convicções, por ambições de carreira, aceitando o presente envenenado de descalçar a bota indescalçável do Brexit, que é um brutal disparate político, e um tiro no pé económico.
Ou seja Cameron para ganhar as eleições, largou uma bomba e fugiu. May por ganância carreirística aceita agarrar a bomba e em vez de a tentar desactivar, prefere dizer que a bomba talvez não rebente com muita força. A isto, Rui Ramos chama "Os AZARES de Cameron e de May". Veja-se bem... "Azares", coitadinhos que não tiveram culpa nenhuma. Quem é mau aqui segundo Rui Ramos é a UE!.. Ou seja a França e a Alemanha (dois partidos governados por Sociais Democratas centristas - tipo Rui Rio, que o Observador odeia).
Já toda a gente sabe que o RU exporta mais serviços e a EU exporta mais indústria. Mas a forma como Rui Ramos distorce as coisas dizendo que a UE é que tem forçado o RU a aceitar condições desvantajosas, é demagógica e falsa. Para começar o RU tem sido sempre um privilegiado na UE. Não está no Espaço Schengen, não aderiu ao Euro, etc... E Cameron até já queria que a Libra fosse moeda oficial da UE a par do Euro, imagine-se!..
Os Britânicos, ainda vivem sob a fantasia nostálgica de que são donos do mundo, como quando tinham um império que se foi no Sec XX. A ficha ainda não caiu... E como tal continuam sempre presunçosamente a achar que podem, fazem a mandam... E quando lhes dizem que não a mais caprichos, fazem birra e viram as costas. Aliás é apanágio do RU no mundo: Entrar, estragar e vir embora.
Mas Rui Ramos ainda diz que a UE está a ser dura e intransigente com o RU, e que também o foi com Cameron??!!.. Mas por acaso foi a UE que os mandou sair? E é sequer razoável esperar que depois de sair, o RU continuasse a ter as vantagens sem contrapartidas, ainda mais do que quando estava dentro da UE? Escolher "a la carte" quais das "4 Liberdades Indivisíveis" da UE lhes interessam, e quais não interesassam?
"Depois, recusaram-se a entender o Brexit como uma questão política e diplomática, preferindo reduzi-lo a um processo legalista e burocrático"
É claro que o Brexit é antes de mais uma questão legalista e burocrática! Acham que um órgão de soberania supra-nacional como a UE pode ser outra coisa? Questão política e diplomática??. Por que carga de água?.. Falar de "arrogância" da UE?.. MAs haverá maior arrogância do que a do Reino Unido nesta história toda? Quererem tudo à maneira deles como se ainda fossem donos do mundo? Quer dizer, depois de terem sido durante décadas um membro privilegiado da UE com condições especiais de corrida para tudo, ainda querem sair mantendo as vantagens mas sacudindo os compromissos. Tenham juizinho, que já têm idade para isso.
Já não basta saber-se que a campanha do Leave mentiu ao eleitorado e infringiu a Lei Eleitoral, que Arron Banks recebeu dinheiros Russos para financiar a campanha Leave, que um Referendo na Lei Britânica tem apenas carácter consultivo e não vinculativo, e que nunca se referendam questões de tão complexas consequências económicas a uma população impreparada para as avaliar... E Rui Ramos ainda vem defender o Brexit contra a UE??... Esta posição de Rui Ramos apenas pretende posicionar-se ideologicamente alinhada com Marine Le Pen, Nigel Farage, e os emergentes movimentos populistas de extrema direita em geral.
"No Reino Unido, há muitos políticos convencidos de que a UE não os deixa fazer política da maneira como ela deve ser feita, soberanamente."
Não os deixa fazer política?.. Caro Rui Ramos, diga-me uma, apenas uma lei que o Reino Unido não podia fazer dentro da UE e que agora possa fazer?.. Claro que não consegue dizer porque, essa conversa é mais um slogan populista.

José Barros: Que arrogância, Rui Ramos! Quem tem acompanhado o Brexit sabe que ele tem sido uma chalaça. Os seus mentores (Johnson, Rees-Mogg etc) são de uma desonestidade intratável e a May é de uma mediocridade confrangedora e um boneco de trapos nas mãos dos hard brexiters. Bastar-se com retórica tão superficial não é aceitável em si Rui Ramos.  Inteiramente em desacordo com este artigo de RR! E quanto a arrogâncias, que pelo menos haja o decoro de não se apontar o dedo a este lado do canal da Mancha! 

António Eliphis > António Sennfelt: O "historiador patriota" Rui Ramos esqueceu-se da história do ultimato e do mapa cor-de-rosa.

Luís Soares Ribeiro: O Brexit não sei como vai acabar. Mas pôs à vista de todos que os Governos, as famílias partidárias, governam sem terem em atenção aquilo que as populações querem.  Felizmente na Inglaterra os deputados são eleitos tendo em conta as populações e não em listas preparadas pelas famílias partidárias. Em Inglaterra os Governos respondem perante o Parlamento, em Portugal e muitos outros Países Europeus os parlamentares respondem perante os Governos e suas famílias partidárias. Vamos ver como o Brexit vai acabar.

Cipião Numantino: Confusas as conclusões e abstracções avançadas pelo nosso caro RR, tentando desculpabilizar Cameron por um devaneio irresponsável que acabou por lhe rebentar no nariz. Quando se anda à procura de notícias como foi o caso dele, deveria estar preparado também para absorver as más. E não foi isso que aconteceu. Concedo que os ingleses sempre quiseram estar dentro e fora da UE. Mas, até por isso mesmo, deveria sopesar e filtrar por antecipação a eventual resposta do eleitorado Como diz o povão " quem não quer ser lobo, não lhe vista a pele"!...

Ana Vasconcelos: Este espectáculo, lamentável, mostra a sombra de um poder sem rosto que não quer cumprir a vontade popular porque ela não lhe convém. É pior para a democracia que todos os populistas juntos, porque é um desrespeito frontal à democracia. E o pior ditador é aquele que não vemos porque se esconde atrás de instituições supostamente democráticas. Depois não se queixem.

Ana Ferreira: Ao contrário do que pretende fazer RR, claramente alinhado nesta, como noutras matérias, com a extrema direita que odeia a UE por ser o único antídoto contra os nacionalismos xenófobos, o problema está na falta de líderes à altura dos novos desafios. Cameron sempre foi o paradigma disso mesmo. Protegê-lo para acusar a União, só vem provar que é exactamente esse o tipo de liderança que convém aos saudosistas da direita mais conservadora e reaccionária.

António Eliphis: É fácil identificar os pseudofascistas como Rui Ramos, em contraste com os liberais, defensores de uma democracia liberal. Nas questões europeias têm exactamente as mesmas ideias e críticas que os comunistas! Este artigo poderia ter sido escrito por Pacheco Pereira! É interessante observar que a Frente Nacional de Le Pen retirou imensos votos aos Comunistas! Rui Ramos e a esquerda radical navegam na mesma lama da demagogia barata e do medo, com os chavões típicos de qualquer demagogo e populista.

victor guerra: Um chorrilho de disparates. O Brexit aconteceu, porque políticos de baixa moral, como o Farage e o Johnson, conseguiram impingir à fracção mais primária do UK ,a ideia de que a UE, onde apenas tinham "um pé", estava a oprimi-los. E como o voto é a "arma do povo" saiu asneira, a tentativa do idiota Cameron. O resto é incompetência da May e a típica hipocrisia inglesa

Mosava Ickx: O projecto económico comum, CEE, não funcionava muito mal, era promissor. O projecto político UE decidido pelos socialistas franceses em conluio com os alemães visa a estabelecer uma supremacia do eixo Paris-Berlim em prejuízo de todos os outros membros, os mais prejudicados sendo os britânicos. Muito claro e bem explicado nesta peça. Tão simples como isso. Juntem a isso a arrogância do Macron e da Merkel, a rigidez dos aparatchiks esquerdistas não eleitos da Comissão de Bruxelas, e terão a receita perfeita para o desastre anunciado dessa UERSS!

Joao MA > Mosava Ickx: Sou insuspeito de ser socialista e discordo de muita coisa na UE nomeadamente do socialismo encapotado e forçado . Mas recomendo lhe uma temporada no RU (fora de Londres) para perceber a mentalidade dos brexiteers, o seu projecto de poder, xenofobia , imperialismo, egoismo, mania da superioridade, sentimento anti-Europeu, desprezo completo por paises tipo Portugal. 

Mosava Ickx > Joao MA: Acabou de descrever também o povo francês.

António Eliphis > Joao MA: Correcto, caro Joao! Nas questões europeias, os comunas e os fascistas andam de braços dados! Veja o caso da Alemanha nazi. Os nazis só chegaram ao poder com o apoio dos comunas, porque para os comunas não havia diferença entre nazis e social-democratas, eram todos servidores do sistema capitalista.

Joao MA: Mas importa perceber quem dentro do RU advoga o Brexit: Alguns Bilionários com off shores a quem não interessa estar sob leis europeias que imponham algum controlo financeiro; Racistas, xenófobos ; Classe mais baixa / subsídio-dependente com o mais baixo nivel de educação e até civismo; intoxicados por uma comunicação social anti-Europeia; Saudosistas do império; Combinação dos acima mencionados 

Paulo F. > Joao MA: Têm o mesmo direito a escolher que os emigrantes que também vivem a vida inteira a receber subsídios, casa, etc, qualquer artista de artes performativas, e outras "forças vivas da nação" sem sustento próprio, a viver de subsídios também, pessoas a trabalhar para as instituições europeias, com interesse directo no caso, multimilionários e muitos mais. Só que ganharam. Temos pena.

 

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