Foi em S. João do Estoril, que o conheci
e admirei, junto dum velho e enorme tanque seco, onde a malta jogou e ainda
hoje joga. Estranhei há tempos a sua ausência. Parece que secou, mas um rebento
continua, mais adiante, estranha árvore cuja foto Salles da Fonseca revela, da
ilha de Socotorá, como também aprendi, e não Socotra. E
assim vamos viajando e rindo, com o humor de SF, admirando a sua disposição
viageira, destemida sem dúvida, talvez numa curiosidade ridente, para conhecer
sítios de que se estudavam os nomes na escola antiga. E vamos simultaneamente tomando
nota das informações que transmite, acerca do que se vai passando nesse mundo assustador de pirataria que os povos da
civilização vão impedindo, felizmente.
SOCOROTÁ
HENRIQUE SALLES DA FONSECA A BEM DA NAÇÃO 03.04.19
Anda por aí muita «fake new» e estou em crer
que foi nesse estilo que se enquadrou a versão que há tempos circulou sobre a
pirataria no Corno de África.
Dizia essa fake que os navios europeus iam despejar resíduos perigosos e
pescar desalmadamente nas águas somalis, eritreias e iemenitas e que os
cidadãos desses países, escandalizados com o desplante estrangeiro, tinham
decidido combater tal prática fazendo o policiamento das respectivas águas e
atacando os navios prevaricadores. Não
sei se não terá havido ilegalidades daquele género ou outras vilanias ainda
mais torpes mas do que eu duvido seriamente é que os eritreus, somalis ou
iemenitas se tenham alguma vez preocupado com esse tipo de assuntos. O que eles
são é, pura e simplesmente, piratas. Assim foi que alguém tentou
culpabilizar as vítimas desculpando os atacantes. Uma completa inversão de
valores, esta, sim, torpe. E, zarpando de Salalah, foi para essas águas que
nos encaminhámos…Então, aí vamos nós de peito feito às balas da pirataria. Mas
como homem prevenido vale por dois, o Comandante – seguindo as orientações da
prudência – fizera embarcar em Mascate uma equipa de 14 atiradores especiais (snipers) que estavam autorizados a
atirar a matar tudo o que bulisse à tona da água e de que eles desconfiassem. Disseram-me que se tratava de um grupo tunisino pelo que
descartei a hipótese de serem «piratas reciclados».Tinha sido
precisamente em Mascate que me cruzara com dois deles na escada do portaló e
fiquei com a certeza de que optaria pela piscina em vez de tentar nadar à volta
do navio. Os fuzis deviam ir desmanchados dentro das malinhas «à James
Bond» que levavam discretamente na mão; duvido que fossem explosivos para
afugentar tubarões ou para a pesca ao candeio. Viemos a saber mais tarde que
a observação nocturna era feita também com infravermelhos.Os simulacros de
emergência já tinham sido feitos antes de chegarmos à zona problemática que é a
que vai das águas somali-iemenitas, passa o Estreito de Áden, entra pelo Mar
Vermelho e chega mesmo à boca do Golfo de Aqaba. Para além do simulacro
com passageiros, houve também mais dois apenas para os tripulantes em que um
dos exercícios era o da evacuação dos camarotes e condução dos passageiros para
os respectivos locais de concentração e eventual resgate. A minha
trincheira era no casino, atrás duma slot
machine. Passei a associar pirataria a «Bally», a marca da dita máquina. Foi
de noite que passámos ao largo da ilha de Socorotá (hoje, iemenita) pelo
que não a vislumbrei assim registando um desaire da minha curiosidade. Sim,
essa ilha era o ponto de apoio dos navegantes portugueses quinhentistas na rota
entre a amiga Etiópia (a do Preste João) e Diu. De clima horrível, até
as árvores (poucas) assumem formas estranhas. Nunca a povoámos devidamente e
apenas os Franciscanos ali instalaram uma missão para pregarem… às pedras. Entrámos
no Golfo de Áden e navegámos paulatinamente até ao Estreito (que Afonso de
Albuquerque tentou debalde conquistar) onde amanheceu. Tomámos o pequeno
almoço e fomos para o deck 10 da ré onde o vento
(entrando pela proa) não incomodava. Vimos o mar a fugir por baixo de nós,
peguei num livro e apanhei Sol. Até que a velhota baixinha se sentou ao meu
lado e pôs os pés sobre a banqueta que estava à sua frente a ver o mar a fugir.
Fez-me lembrar a minha professora de geografia no liceu que nos falara dos tubarões
que enxameavam o Mar Vermelho durante uma viagem que ela fizera de Goa a
Lisboa. Cheguei-me à amurada e só vi água. Disse-lhe em castelhano (a maior
parte dos passageiros era de espanhóis) e depois em inglês, que não havia
tubarões. Não esboçou qualquer reacção e admiti que se considerava superior à
minha insignificância ou que era apenas malcriada. Deixei passar o
não-incidente e regressei à minha confortável cadeira. Daí a pouco, chegou
outra velhota que lhe gesticulou qualquer coisa que não percebi. Sim, é
verdade, nunca aprendi língua gestual, não consigo comunicar com surdos-mudos.
E
foi então que… (continua) Abril de 2019
10 comentários
Adriano Lima 03.04.2019, 13.52: Fico
com a impressão de que este episódio com a "velhinha" brasileira já
tinha acontecido em post anterior, ou então foi ela que voltou à carga. Mas
posso estar equivocado.
Henrique Salles da
Fonseca 03.04.2019 15:33: Sim, constava da apresentação da generalidade ao
estilo de índice da viagem como ponto de humor. Agora, vem no processo
cronológico. Da pirataria também já referi algo mas amanhã aparece
tudo devidamente enquadrado.
Adriano
Lima 03.04.2019 19:53: Percebido,
e já calculava que assim fosse. E desconfio que a "velhota", e não
"velhinha", como eu erradamente disse, pois há uma diferença nos
diminutivos, ainda vai fazer das suas, ah-ah-ah. Quanto aos snipers
Henrique Salles da
Fonseca 03.04.2019 20:27: Quanto à velhota presumivelmente surda-muda, não
voltei a cruzar-me com ela. No que se refere aos snipers, fiquei com a ideia de
que se trata de iniciativa dos Armadores, aliás à semelhança do que se vê nos
muitos vídeos que há no YouTube sobre o mesmo tema com navios mercantes. Por
exemplo, os navios russos estão armados com canhões, fazem tiro ao alvo nos
barcos suspeitos e vai tudo directo para os tubarões; com ingleses e
americanos, há mais subtileza e demoram mais tempo a enviar os piratas ao
fundo. Aqueles países estão quase todos em alvoroço (Iémen, Somália,
Eritreia) e têm outras preocupações que não a regulamentação da segurança a
bordo dos passantes. Quanto às outras questões que o Senhor Coronel
coloca, não sei responder.
Adriano
Lima 03.04.2019 21:46: Obrigado
pelos esclarecimentos, Sr. Doutor. Esse tipo de actuação dos russos eu já tinha
lido e, conhecendo-os como conhecemos, não haverá razão para pensar que é
"fake new" Fica-se com a ideia de que cautelas e caldos de galinha
não fazem mal a ninguém lá para aqueles lados.
Henrique Salles da
Fonseca 03.04.2019 16:56: A ilha (arquipélago de 4 ilhotas) chama-se SOCOTRA e
as árvores são DRAGOEIROS ou em inglês DRAGON TREES, das quais em Sta Apolónia
há 2, plantadas por antepassados meus e conheço uma em Algés!! Vasco van Zeller
Henrique Salles da
Fonseca 03.04.2019 16:57: Em português, dos tempos em que por lá andámos com
mando e não mandados, diz-se Socotorá.
Henrique Salles da
Fonseca 03.04.2019 16:59: Prezado Dr. Salles
da Fonseca: É apaixonante
acompanhar as suas aventuras por paragens, que não sendo nova , de uma maneira
ou outra, envolveram e envolvem ainda Portugueses com curiosidades e
apontamentos interessantes para os tempos que se vivem actualmente. Nestas aventuras
a família fica em casa? Muito obrigado pela partilha e aproveito para lhe
desejar, e à sua família, uma Santa Páscoa. Nós vamos até Sint Niklass, ter com
a família belga.Um abraço. Manuel
Henriques
Henrique Salles da
Fonseca, 03.04.2019 17:01: Páscoa feliz para vós todos, também.
A minha mulher vai sempre comigo; as filhas estão casadas e com as famílias delas, já não andam habitualmente connosco nestas aventuras. Abraço
A minha mulher vai sempre comigo; as filhas estão casadas e com as famílias delas, já não andam habitualmente connosco nestas aventuras. Abraço
Adriano
Lima 03.04.2019 19:54 O dragoeiro é uma árvore que também existe em Cabo Verde,
e que creio que também nas Canárias.
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