sábado, 13 de abril de 2019

Resignemo-nos, persignemo-nos



Somos fatalistas, temos o fado como nossa canção representativa, merecemos a crítica contida nas transcrições de SF que tão bem se nos aplicam, Santa Bárbara! Não queiramos ser mais que os outros, mudando. A nossa realidade é esta também, descrita por Blum e Aron, e transcrita por Salles da Fonseca, para nos abrir os olhos, com perícia certeira. Mas não resulta. É assim mesmo, também connosco. Creio que os outros se safam melhor, os de lá de fora. Nós é mais fado.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA          A BEM DA NAÇÃO,  13/4/19
Título – O PESO DA RESPONSABILIDADE
Autor – Tony Judt
Prefaciador – Rui Bebiano
Tradutora –Patrícia Xavier
Editora –Edições 70
Edição – Maio de 2018
A bem da verdade, deveria ter juntado o subtítulo «BLUM, CAMUS, ARON E O SÉCULO XX FRANCÊS» na ficha técnica inicial mas ficaria uma paginação muito pesada e optei por esta solução que me parece razoável.
Esta, a minha leitura principal enquanto viajei pelo mundo de Mafamede assim me fazendo recordar que nem tudo é Talião.
São 280 páginas de substância, fora, portanto, as habituais fichas técnicas, título, índices e etc.
Trata-se de uma apreciação da vida intelectual de três vultos da França do séc. XX, Léon Blum (que foi primeiro ministro duas vezes), Albert Camus (que foi Nobel da Literatura) e Raymond Aron (que foi um dos mais importantes filósofos modernos franceses).
Mas, curiosamente, nenhum deles entrou neste livro por ter sido o que acima refiro: Blum, por ter sido o civilizador do socialismo; Camus, entrou como o grande moralista; Aron, pelo rigor da sua análise social.
E é sobretudo nestas perspectivas que toda a obra se desenrola numa leitura fácil apesar de constantemente abordar temas difíceis. Porquê difíceis? Porque todos eles mobilizaram as elites intelectuais e políticas francesas durante quase todo o séc. XX em discussões públicas, tanto políticas como académicas (as que transpareceram cá para fora, que não foram poucas).
Não vale a pena ler a correr, o livro não foge. Eu não o li, saboreei-o.
Uma curiosidade que só pude constatar quando cheguei ao fim da substância: a primeira frase e uma das últimas merecem a minha incondicional concordância.
A primeira frase (pág. 25, primeira frase da substância relativa a Blum): A História não é escrita como foi vivida – que o diga quem, como eu, viveu o 25 de Abril de 1974 num turbilhão comunista em que as loas à liberdade ainda hoje apregoadas mais não são do que a liberdade que os comunistas adquiriram de mandar prender quem se lhes opunha.
Frase quase final (pág. 289, última página da substância relativa a Aron): Os intelectuais franceses, observou [Aron] um dia, não procuram nem compreender o mundo nem mudá-lo, mas denunciá-lo – eis ao que continuamos a assistir tantos anos depois da morte de Aron (1983) em que a contestação permanente tudo exige sem querer saber da plausibilidade das exigências nem das consequências de uma putativa satisfação dessas mesmas pretensões às quais não apresenta alternativas - talvez porque as não tenha e porque talvez mesmo nunca tenha querido tê-las. Denúncias irresponsáveis, portanto, a que os órgãos da comunicação dão muita cobertura criando uma tensão social que muitas vezes mais não conduz do que a becos. Porquê? Porque a tensão factura e os becos são problemas alheios, não das instituições da comunicação. Os outros que se danem porque eles, entretanto, já tiveram as audiências, as tais que facturam.
Muito mais haveria para contar mas nada melhor do que ser o meu leitor a fazê-lo directamente.
NOTA FINAL – A reler, Camus na sua perspectiva moral, sobretudo na da não ficçãoBoa leitura!

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