É o que denota a irritação de Salles da
Fonseca – como, de resto, aconteceria com qualquer turista, que, indo entusiasmado
conhecer sítios do seu interesse, para cujo efeito pagou bem, de repente se
sente paralisado no seu entusiasmo viageiro, ao confrontar-se com a avidez
malandra de gente mísera e sem quaisquer princípios de ética, habituada já por
longa tradição a comerciar através de truques ou malabarismos fraudulentos,
como também fazem os ciganos - reais ou metafóricos - perante a passividade permissiva do seu governo astuto. Mas
tudo isso serviu para partilhar connosco, generosamente, as suas experiências
viageiras, e passámos horas de encanto - sem os incómodos das deslocações,
incompatíveis com a nossa idade e com a nossa bolsa - a consultar as fotos e as
histórias que a Internet nos conta, sobre Petra.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 08.04.19
PETREFICADOS
Chegados à placa toponímica de
Petra, logo começámos a descer por uma estrada em rampa sinuosa através
de filas de casas em socalco que nem percebi bem como lá se chega se se for com
pressa. Mas como não vi ninguém apressado, pode ser que esse não seja um
problema.
E descemos, descemos…
até que demos com um parque de estacionamento de autocarros de turismo
completamente apinhado. Mas, lá estava outro socalco logo ali por baixo
com mais lugares de estacionamento, desta vez disponíveis.
O hotel onde haveríamos de
almoçar era no socalco por baixo deste local de estacionamento e a
entrada do sítio arqueológico era por baixo da entrada do hotel.
Até ali, tudo funcionava a
descer mas o pior seria na volta em que tudo funcionaria a subir.
O já «famoso» guia disse-nos
que poderíamos alugar uma charrete
ou um cavalo para descermos até aos locais a visitar e que, de preferência,
deveríamos estabelecer logo o preço para o regresso, na subida. Que seriam
cerca de dois quilómetros em cada sentido, o que corresponderia a € 40,00.
Se o cavalo era hipótese do meu
agrado, já o mesmo não disseram os outros membros do meu grupo: a minha mulher
que, sabendo montar, não o pode fazer por causa de um problema nas costas, o
outro casal porque nunca montou a cavalo na vida. A charrete
seria a solução. Mas não foi porque um jordano de ar rude e «dono» daquele
negócio rugiu para o nosso «famoso» que já não havia charretes
disponíveis, que teríamos que descer a pé e contratar lá em baixo quem nos
trouxesse para cima.
Pelo mapa do campo arqueológico
ficámos então a saber que a distância completa a descer (e, depois, a subir) não
eram dois quilómetros mas quase oito. E descemos… mas chegámos todos lá
a baixo em boas condições para sermos lançados ao guano. Depois de não sei
quantos dias de inactividade no barco, descer custa quase tanto como subir
porque, apesar de os músculos serem outros, também estão habituados a não fazer
nada e queixam-se amargamente. E o cansaço era tanto que a minha mulher e eu
decidimos que dávamos uma vista de olhos na primeira fase, a da fachada do «Tesouro»
e trataríamos de contratar a tal charrete
que nos levasse até lá a cima. Quanto ao resto, haveríamos de voltar a ver na
Internet, agora que tínhamos uma noção do local e da dimensão fantástica de
tudo aquilo.
Então, vendo por ali uma charrete
vazia, logo tratámos de a contratar mas o timpanas
viu que estávamos derreados e explorou a situação de um modo que se assemelhou
à diplomacia dos piratas do Mar Vermelho: o preço da subida seria, afinal,
igual ao que o «famoso» nos tinha dito que correspondia à ida e volta, € 40,00.
Tudo bem, nem discutimos. O que nos chocou mais foi, contudo, o facto de a charrete
ao lado desta que arrematáramos estar já contratada por alguém que pagara na
origem, lá em cima, a descida e a subida e cujo timpanas, vendo que por ali havia
outras situações de grande exaustão, fechou outro negócio por € 100,00 só pela
subida deixando o cliente inicial sem outra solução que não fosse perder o
dinheiro que já pagara e subir a pé.
Mas o que mais me chocou ainda
estava para vir: a nossa exaustão não foi nada em comparação com a dos cavalos
das charretes
quando chegavam lá a cima em haustos de grande aflição e um deles, cheio de
«cornage», ouvia-se à distância. Um verdadeiro crime cuja cessação deveríamos
promover com a maior urgência. Um Governo que permite tal «cartão de
visita», presta um muito mau serviço ao prestígio da sua Nação. Só animais tão
voluntariosos e generosos como os cavalos é que se submetem a tal situação e o
bicho homem, selvático, explora-os ignobilmente até à exaustão. Um verdadeiro
crime!
Zangados com tudo aquilo,
arrastámo-nos até ao hotel para o almoço. Tudo bem, mas cada pessoa só tinha
direito a um copo de água. Se quisesse outro, tinha que comprar uma garrafa de
litro e meio que eles vendiam ao preço de quem a tinha ido buscar às neves
eternas do Kilimanjaro mas se quisesse álcool, então teria que pagar uma bula
salvadora do crime de lesa não sei quem.
Um amigo meu diz-me que
gosta muito da Jordânia porque conhece lá muita gente muito civilizada. Pena eu
não ter conhecido essa elite e me ter limitado a esta ralé do mais vil com que
alguma vez me cruzei. E eu até já conheço um bocado do mundo - mas tão reles
como isto, nunca tinha visto.
(continua)3 COMENTÁRIOS
Henrique Salles da Fonseca 08.04.2019 12:17: Caro Henrique: Tenho lido com muito interesse (e em silêncio) as tuas crónicas, mas esta fez-me quebrar o silêncio e dizer-te que me entristeceu tanto que antes não a tivesse lido. Um dos livros que me viu crescer foi “Homens e bichos”, de Axel Munthe, onde consta a famosa frase “Quanto mais conheço os homens mais gosto dos animais” e é bem certo. Não poderias fazer chegar a tua crónica ao Consulado da Jordânia, já que não existe, segundo o Google, Embaixada? O Cônsul até é português, segundo a mesma fonte… Abraço. Carlos Traguelho
Henrique Salles da Fonseca 08.04.2019 12:18: Assim farei. Obrigado pela sugestão.
Henrique Salles da Fonseca 08.04.2019 12:19 Obrigado por mais este testemunho. Abençoada Europa apesar de todos os seus defeitos. Um abraço, Bartolomeu Costa Cabral
Adriano
Lima 08.04.2019 14:35: Pelo que foi
anteriormente anunciado, eu já estava a contar com este cenário, mas não
esperava tanto. O estranho é não haver fiscais do Estado presentes no lugar
para evitar estes desmandos que, de facto, só podem prejudicar o negócio.
Tratando-se de uma atracção turística deste quilate, não se percebe semelhante
"distracção". Justificam-se
denúncias individuais, é verdade, mas também não entendo como as coisas
chegaram a este ponto sem que as empresas de turismo estrangeiras tenham saído
do seu mutismo. A não ser que aquelas "petras" sejam tão duras, mas
tão duras, que não surte efeito o provérbio: "água mole em pedra dura
tanto bate até que fura". Há um ano,
fomos a Piódão, aldeia típica em lugar de difícil acesso que nunca tínhamos
visitado. Para quem vive em Tomar ou ainda mais longe, a viagem é longa e
penosa. Não tanto pela distância mas pelas estradas estreitas e longamente
sinuosas que se tem de percorrer em grande parte do percurso. Mas o pior foi
que o GPS enfiou-nos pela pior alternativa rodoviária para lá chegar, momentos
antes de Pampilhosa da Serra, isto porque a ligação com o satélite sofrera uma
interrupção e quando foi retomada o critério para o ajustamento/correcção do
percurso não foi o melhor. O problema principal é que a minha mulher tem um
medo tremendo das alturas, autêntico pânico, pelo que, além do cuidado
permanente que eu tinha de dar à condução, tinha ainda de a ir mantendo sob
vigilância e controlo. Chegados a Piódão, verificámos que a aldeia é de facto
linda no seu tipicismo mas que talvez não se justificasse tanta maçada para a
visitar. A compensação é que não há lá o tipo de exploração ao visitante que há
em Petra, sendo o principal problema a dificuldade de estacionar porque aquilo
fica também num "buraco", mas não tanto como no jordano. Ciente ainda
de que tínhamos de fazer a viagem de retorno, mas que foi feita por uma
alternativa melhor (via Coimbra), eu e a minha mulher convergimos na seguinte
opinião: futuramente, se quisermos rever Piódão, mais vale adquirir um postal e
contemplar as vistas do lugar sentados num sofá. Receio que em relação a Petra
venhamos a optar pela mesma solução, ah-ah-ah.
NOTAS DE APOIO
Petra
e os encantos de uma cidade perdida (< MUNDO – SAPO VIAGENS)
Premiada
com o título de Maravilha do Mundo, a cidade antiga de Petra é a maior atracção
turística da Jordânia e a mais visitada do país. Explorar Petra faz parte
dos sonhos de todos os viajantes. A região de Petra é povoada desde a
pré-história, mas foram os Nabateus, povo originário do nordeste da Arábia, que
construíram a cidade cujas ruínas atraem hoje turistas de todo o mundo. Os
Nabateus, povos árabes nómadas, cujo êxito assentava no aproveitamento,
controle e conservação da água, bem precioso neste terreno desértico, terão
criado uma cidade império no actual território da Jordânia, três séculos antes
de Cristo. Chamaram-lhe Raqmu. A cidade perdurou no tempo, mas o seu nome
passou a ser Petra. O seu legado ainda hoje pode ser observado quando se entra
nas ruínas da cidade de Petra, em que se seguem os canais de água nas paredes
da garganta, designada por Siq. Esta entrada em Petra através do Siq é
triunfal, e no final da garganta, tem-se a visão mais clássica de Petra, o
chamado Tesouro, pois pensava-se que albergava um tesouro de um faraó egípcio.
O momento em que a fachada do monumento de Petra
surge, na sua tonalidade rosa e castanha, por uma abertura nas escuras e
apertadas paredes do Siq, é aquele que a maior parte dos turistas retém como
principal recordação de Petra. Daí que seja conhecido por muitos como a Cidade Rosa.
Os Cruzados passaram por aqui no século XII, assim
como os Romanos, os Cristãos e os Árabes, sendo esta mistura de povos e
culturas bem evidente na abundância de estilos arquitectónicos que se podem
admirar nas ruínas de Petra.
Mas
Petra é muito mais do que essa imagem clássica. Petra é uma cidade inteira, que
abrangia uma área considerável em terreno montanhoso e desértico. Uma cidade
com legado cristão, árabe e romano. Com ruínas romanas no seio de edíficios
Nabateus e com uma profusão arquitectónica difícil de igualar.
História (Origem:
Wikipédia, a enciclopédia livre).
A região onde se encontra Petra foi
ocupada por volta do ano 1 200 a.C. pela tribo dos edomitas, recebendo o nome de Edom. Como a
cidade se situava perto do monte Hor,
é muito possível que os horitas,
um povo mencionado na Bíblia (Gênesis 14:6, 36:20, Deuteronómio 2:12), habitassem essa
região ainda antes da chegada dos edomitas. A região sofreu numerosas
incursões por parte das tribos israelitas,
mas permaneceu sob domínio edomita
até à anexação pelo Império Aqueménida. A cidade de
Petra era denominada Sela em edomita, nome que
significa "pedra", "penhasco" ou "rocha" nessa
língua; o nome grego πέτρα - Pétra e latino Petra - pedra, penhasco, é a
tradução da palavra edomita. O nome árabe Al-Bitrā ou Al-Batrā é a arabização
do seu nome grego e latino. Importante
rota comercial entre a península Arábica e Damasco
(Síria)
durante o século VI a.C., Edom
foi colonizada pelos nabateus
(uma das tribos árabes),
o que forçou os edomitas
a mudarem-se para o sul da Palestina, que passou a ter o nome de Idumeia, nome derivado
dos idumeus
ou edomitas.
Fundação: O ano 312 a.C. é apontado como data do estabelecimento
dos Nabateus
no enclave de Petra e da nomeação desta como sua capital
Época romana Entre os anos 64 e 63 a.C., os territórios nabateus
foram conquistados pelo general Pompeu e anexados ao Império
Romano, na sua campanha para reconquistar as cidades tomadas pelos Hebreus.
Contudo, após a vitória, Roma concedeu relativa autonomia a Petra e aos
nabateus, sendo as suas únicas obrigações o pagamento de impostos e a defesa
das fronteiras das tribos do deserto.
No
entanto, em 106 d.C., Trajano retirou-lhes este estatuto, convertendo Petra e
Nabateia em províncias sob o controlo directo de Roma (Arábia Pétrea). Adriano,
seu sucessor, rebaptizou-a de Adriana Pétrea (Hadriana Petrae), em honra de si
próprio.
Época bizantina: O domínio do Império Romano, com uma forte pressão
económica, gradualmente fez com que o comércio dos nabateus entrasse em
declínio. No século III, Petra já não estava mais nas rotas comerciais, e
sua economia ficava cada vez mais decadente. Em 324, Constantino fundou o Império Bizantino, com capital em Constantinopla
(actual Istambul).
Um bispado
instalou-se na cidade durante esse período, utilizando como catedral um templo
afastado da cidade, que ficou conhecido como o Monastério Al-Deir. Sob o
domínio de Constantino, Petra passou por um período mais próspero até o ano de
363, quando um terramoto destruiu quase metade da cidade,
o terramoto na Galileia em 363. Contudo a
cidade não desapareceu. Depois deste sismo, muitos dos edifícios
"antigos" foram derrubados e reutilizados para a construção de novos,
em particular igrejas e edifícios públicos.
Em
551, um segundo terramoto, mais grave que o anterior, o terramoto em Beirute em 551, destruiu a cidade quase por
completo. Petra não conseguiu recuperar desta catástrofe, pois a mudança
nas rotas comerciais diminuíram o interesse de entreposto comercial da cidade.
As ruínas de Petra foram
objecto de curiosidade a partir da Idade Média, atraindo visitantes como o
sultão Baibars
do Egipto,
no princípio do século XIII. O primeiro europeu a descobrir as ruínas
de Petra foi Johann Ludwig Burckhardt (1812), tendo o primeiro
estudo arqueológico científico sido
empreendido por Ernst Brünnow e Alfred von Domaszewski,
publicado na sua obra Die Provincia Arabia (1904). O nome Petra vem do grego e
significa rocha. Pois quando os primeiros nativos chegaram lá, viram muitas
pedras e rochas e, então surgiu a ideia de colocar o nome Petra e traduzido
basicamente A cidade das rochas.
Património: A 6 de dezembro de 1985, Petra foi reconhecida como Património da Humanidade pela UNESCO.
Em 2004, o governo jordaniano estabeleceu um contrato com uma empresa inglesa
para construir uma autoestrada que levasse a Petra tanto estudiosos como
turistas. A 7 de julho de 2007, foi eleita em Lisboa,
no Estádio da Luz uma das Novas sete maravilhas do mundo.
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