Contas de confundir, cantos para vencer
(eleitoralmente falando), cintos para apertar… Nem sei o que dizer, sou dos
tansos de querer crer, mas gosto de me informar. Outros saberão melhor
percepcionar. Eu limito-me a transcrever para poder reler, quando a tragédia
chegar. E, como Anto, planger: “Ai do
Lusíada, coitado!”
O contributo de Centeno para a literacia
orçamental /premium
Com
a sua proposta de medida da carga fiscal, Mário Centeno revelou-nos que não
acredita em défices orçamentais virtuosos, que aumentam o crescimento potencial
da economia.
Há
uma teoria em economia que prevê que uma política orçamental expansionista – com aumento da despesa ou redução de
impostos – pode provocar um arrefecimento ou mesmo contracção da economia em
vez de, como acontece em regra, gerar mais crescimento. O raciocínio é este: as pessoas, famílias e empresários,
são tão racionais e antecipam tão bem o futuro que, quando vêem o défice
público a aumentar, prepararam-se para pagar mais impostos no futuro. Em face
disso, poupam, em vez de gastarem o dinheiro, a mais, que o Estado lhes está a
dar. Usando a nomenclatura que está na moda, esta é uma teoria que se poderia
classificar como ultra-liberal.
Mas é exactamente esta teoria que nos
vem à memória quando nos deparamos com a medida que o ministro das Finanças
propôs que fosse utilizada para medir a carga fiscal.
Na
sequência dos dados publicados pelo INE, concluiu-se que o ano de 2018
registou uma carga fiscal que é a mais elevada desde que há dados comparáveis,
1995. Essa carga fiscal é medida, como habitualmente, somando as
receitas dos impostos com as contribuições e dividindo pelo PIB. Em 2018
esse rácio vulgarmente conhecido como carga fiscal atingiu os 35.4% do
PIB, um ponto percentual acima dos 34,4% registados no início da
legislatura e naturalmente acima do “enorme” aumento de impostos anunciado por
Vítor Gaspar e aplicado em 2013. Mário Centeno destrona assim Vítor Gaspar
no indicador de carga fiscal.
O
ministro das Finanças foi sempre muito crítico dessa forma de medir o esforço
que os contribuintes fazem a pagar impostos. No passado usou como argumento o
facto de alguns sectores estarem a crescer mais do que outros – por exemplo o
turismo -, para considerar que o esforço fiscal, assim medido, não reflectia
com rigor o peso dos impostos nos portugueses.
Este
ano resolveu criar um novo indicador. Para o ministro das Finanças a carga
fiscal deve levar em conta não apenas os impostos presentes, mas também aqueles
que se vão pagar no futuro por via do défice orçamental.
Diz
o Ministério das Finanças no comunicado que emitiu a 3 de Abril que “o
défice orçamental” provoca um “aumento da dívida pública” que por sua vez “irá
traduzir-se em pagamento de juros em anos subsequentes e, assim, onerar
orçamentos futuros com mais impostos”.
Uma constatação que só em parte é
aritmética. Os défices de hoje são pagos com impostos no futuro, mas isso não
significa que tenha de ser com um agravamento dos impostos. Os defensores do
défice público dizem-nos que esses desequilíbrios orçamentais podem ser virtuosos:
os défices de hoje geram mais crescimento económico que nos permitirá pagar,
até, menos impostos no futuro.
O
ministro das Finanças revela, assim, no seu comunicado que não acredita nessas
virtudes do défice orçamental, de criar crescimento futuro. E se levarmos em
conta o que tem sido a nossa história económica recente, Mário Centeno tem toda
a razão. Os nossos défices públicos do passado traduziram-se basicamente em
mais impostos no presente, sem que se veja um aumento do crescimento potencial da
economia.
É
com base nesse facto – défices presentes são impostos futuros – que o
ministro das Finanças propõe uma nova medida para a carga fiscal: somar a
receita de impostos com o défice e dividir pelo PIB. Com essa medida chegamos a
uma espécie de carga fiscal inter-geracional: os impostos de hoje mais aqueles
que nós ou os nossos descendentes terão de pagar por causa dos défices públicos
que fazemos hoje.
De
acordo com essa medida multi-anual, o nosso esforço fiscal
reduziu-sede 28,5% em 2015 para 25,5% em 2018. Porque os impostos
desceram? Não. Porque o défice público diminuiu. Diz o Ministério das Finanças
que “a composição do financiamento da despesa nos últimos três anos foi
duplamente virtuosa: menor esforço fiscal presente e futuro (através de um
menor aumento da dívida futura)”. Ou seja, estamos a pagar menos impostos, mas
no futuro.
O
salto lógico da escolha do ministro por esta medida de esforço fiscal é
concluir que Mário Centeno coloca a hipótese de as políticas orçamentais
contraccionistas poderem ser expansionistas. É o mundo em que actuamos como
agentes racionais, ao saber que défices presentes são impostos futuros. Se assim fosse, neste momento estaríamos todos a
pensar assim: que bom, o défice está a descer, o que significa que vou pagar
menos impostos no futuro e por isso posso gastar mais no presente. E, por esta
via o consumo e o investimento privados aumentavam. Simetricamente, neste mundo
racional, um Governo que aumente o défice público provocará uma contracção na
economia porque todos nós vamos poupar mais para pagar os impostos que nos vão
cair em cima no futuro.
Se
todos passarmos a pensar e a actuar, reagindo com poupança ao aumento do défice
público, encontramos a melhor forma de evitar uma crise por falta de
financiamento: os défices do Estado são tapados com as poupanças do sector
privado.
Infelizmente, nós não somos assim. O nosso comportamento económico está mais
associado à medida clássica de carga fiscal: ou temos ou não temos dinheiro e
quando temos gastamos sem reparar se há ou não défice público. (E é muito raro
encontrarmos um caso em que os agentes económicos reajam com um aumento da
poupança a um agravamento do défice público).
É
verdade que Mário Centeno nos trouxe esta medida de carga fiscal por razões
puramente políticas – nenhum Governo gosta de estar associado a um aumento da
carga fiscal quando está a anunciar o fim da austeridade. Mas acabou por nos
permitir perceber que não acredita que os défices públicos criem um crescimento
sustentável e, mais importante ainda, explicou de forma simples que défices
presentes são impostos futuros.
Perceber
que défice público é igual a carga fiscal futura, quando a dívida é grande, é
fundamental para que os portugueses não voltem a premiar com o seu voto quem é
financeiramente indisciplinado. E ajuda-nos a conhecer um ministro das Finanças
que não conhecíamos, que contribui para nos tornar mais próximos do “homo
economicus” dos modelos económicos mais controversos.
COMENTÁRIOS:
Alexandre Policarpo: "Anita
vai às compras". Com esta frase, o Centeno conseguiu desviar as atenções
da gravidade do que ele afirmou na entrevista que deu: o dinheiro para
investir existe, os projectos de investimento é que não aparecem, ou seja, Centeno
confessou que este governo não tem absolutamente nenhuma capacidade para atrair
o investimento. Só uma manada de tansos que apoiam este governo é
que acredita que o Centeno é um mago das finanças públicas. Não é, e o percurso
dele no Terreiro do Paço, demonstra isso mesmo: reduzir o défice umas décimas
por ano enquanto aumenta brutalmente os impostos e a divida pública para dar
umas benesses a quem trabalha de e para o estado, até o Pato Donald era capaz
de fazer. Esta conversa sobre a carga fiscal, é mesmo conversa para burros, que
comem a palha toda que o PS lhes quer dar. P.S. porque será que o
Observador retirou a notícia sobre a inauguração do navio em Viana do Castelo?
mistério...
Joaquim Moreira: Como dizia Joaquim Aguiar no
seu “Dia das mentiras” publicado no Negócios do passado dia 4 de Abril, ‘Mário
Centeno pode dar o pino, mortais encarpados e até fazer o “flik-flack” tentando
reescrever toda a doutrina económica, mas é este o significado de “carga
fiscal”. Foi graças a este aumento, às cativações, à descida dos juros da
dívida e das receitas extraordinárias (dividendos do Banco de Portugal) que o
défice caiu para 0,5%’. Dizendo mais à frente: ‘o investimento ficou aquém do
orçamentado. E em percentagem do PIB, ficou mesmo abaixo de 2015. (...) a
receita foi desviada para devolver rendimentos a funcionários públicos,
aumentar pensões e baixar de 40 para 35 horas as horas trabalhadas no SNS.
Enquanto isto, assiste-se a uma degradação notória dos serviços na Saúde,
Educação e Transportes’. Trata-se na verdade de, por outras formas e meios,
continuar a austeridade.
Pedro Ferreira: Só faltava ele
receber um Nobel da economia com uma teoria tão estapafúrdia! O poder desse
senhor é imenso, ele até impediu o ex-ministro Álvaro Santos Pereira de
apresentar em Portugal um relatório da OCDE. Não vou votar PS, mas desejo de
uma forma fervorosa que o PS ganhe as eleições e seja obrigado a novo mandato,
aposto em nova pré-bancarrota, não acredito em nenhuma conta do Centeno, nem no
défice. Onde anda a ser contabilizado o buracão das empresas públicas de
transporte, agora acrescido com o passe social? Passou para as
autarquias?
António Eliphis > Pedro Ferreira: Claro, na Grécia o PASOK (PS grego) chamou a troika e executou o programa
da troika, e foi varrido do mapa eleitoral. Em Portugal o PS chamou a troika, o
trabalho sujo ficou para os outros fazerem, e voltou a tomar conta do poder com
a casa arrumada.
António Eliphis: Excelente, um
dos motivos pelos quais subscrevo o Observador! Recomendo a Helena Garrido
que no seguimento dessa nova métrica à la Centeno, ache o valor da carga fiscal
do anterior governo!
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