Há muito que esse desastre de
esmorecimento da produção nacional sucedeu. Aquando da entrada – imprescindível
– na CEE, embora com imposições agrícolas que liquidaram a a nossa agricultura.
Lembro-me de que a fruta, por exemplo, tinha de ser medida a régua e a compasso,
para poderem penetrar nas bancas dos supermercados… e os campos foram
abandonados... por falta de régua... Ainda hoje o estão, embora os milhos tenham preenchido os espaços
dos demais produtos… que, de resto, já poucos se dão ao trabalho de cultivar,
de forma rentável, como se vê, por exemplo, na França, em programas
exemplificativos de trabalho e esforço, acompanhado de mecanismos necessários
para a rendibilidade…
Mais um texto de alerta, resultante de
clausura, ao que parece, e que devia ser lido com atenção… Carlos
Traguelho apresenta achegas úteis à tese de Salles da Fonseca.
HENRIQUE SALLES DA
FONSECA
A BEM DA
NAÇÃO, 09.04.20
Quando,
há anos, ouvi o então Ministro do Trabalho
(curiosamente, o mesmo que actualmente ocupa o dito cargo) dizer que tínhamos
que voltar à produção de bens transaccionáveis, não acreditei que aquela declaração produzisse a mais
pequena alteração nos procedimentos até ali em curso. Lastimo ter que dizer o mesmo das declarações que
ontem ou anteontem o Primeiro Ministro proferiu de que «temos que
voltar a produzir o que nos habituámos a mandar vir da China». Eu bem
queria que assim fosse mas não vejo como os políticos conseguirão dar conteúdo
às suas virtuosas declarações.
Claro está que Vieira da Silva já
então se quedou pelas pias declarações e agora vai acontecer o mesmo em relação
ao que disse o Dr. Costa.
E porquê? Porque vivemos numa
economia dita liberal em que é suposto o Governo não dar ordens do género «Agora Você vai deixar de mandar vir
isso lá de fora e vai passar a fabricar cá»; como também não é suposto o Banco
de Portugal dizer ao banco A, B ou C que não pode fazer esta ou aquela operação
sobre o estrangeiro inviabilizando importações. Pois se
nem sequer se pode definir plafonds de crédito à banca… Num Estado democrático com políticas de
inspiração liberal, as Autoridades apenas podem emitir políticas genéricas, supervisionar
e, no máximo, actuar a posteriori: quem de direito legisla que se
circula pela direita, o Governo produz os regulamentos inerentes, a Polícia
vigia e, nas prevaricações, pune-se o infractor. É assim em praticamente todas
as circunstâncias da actual governação no primeiro mundo.
Mas
quando uma política não existe, nada se legisla sobre ela. É o caso da transparência
dos mercados e da garantia da racionalidade dos preços, temas sobre os quais raros serão os políticos
portugueses que alguma vez ouviram falar. E se ouviram, não perceberam ou
fingiram não ter sequer ouvido.
E o que resulta
desta ausência de políticas e da surdez dos nossos políticos?
Pois bem, resulta que a maior parte dos produtos de consumo corrente
têm preços definidos por dois ou três Chefes de Compras das empresas
proprietárias de grandes superfícies (não sei se combinados ou não entre si)
esmifrando ao máximo a produção interna e deixando-a «pendurada» se ela não
acompanha os preços da Bolsa de Chicago ou das ordens de Xi Jin Ping no que
respeita à quinquilharia e demais produtos chineses. E ai dos bancos que não lhes abram os
créditos inerentes! Arrasam a agricultura, as indústrias alimentares e os
bancos mas esse é o lado para que dormem melhor. O negócio deles é fazerem boas compras
(leia-se, aos preços que entendem mais lhes convir) e não zelar pelos
interesses de quem os serve como fornecedores de bens ou de divisas. Quanto ao
interesse nacional, que se lixe!
Solução?
Uma,
principalmente: criação em Portugal de uma Bolsa de Mercadorias
para
a carne e para os cereais
(necessariamente com operações sobre futuros) e se o legislador não souber por
onde começar e não souber estudar por livros estrangeiros, peça
ajuda à Bolsa de São Paulo que ensina tudo em português.
Mas é claro que o lobby do
comércio não vai querer nada disto e vai ser necessária muita perseverança para
conseguir defender os interesses da produção nacional.
A alternativa
é mais uma Grande Falência Nacional –
ao que já vamos estando habituados, aliás.
Recado ao Dr. Costa: - Ministros e quejandos mandam menos na
economia portuguesa do que os Chefes de Compras das grandes superfícies.
E
assim vou passando a clausura… (continua)
Abril de 2020
Henrique Salles da
Fonseca
COMENTÁRIOS
Anónimo 09.04.2020: Numa tarde de 5ª Feira Santa, passada em confinamento,
qualquer comentário só poderá ser triste. Há um aspecto que não tiveste em
linha de conta, no que se refere aos produtos que importamos, mas que existem
ou são produzidos em Portugal, eventualmente em quantidade inferior à procura,
mas com possibilidade de expansão. Os
tais a que te referes, chamando de consumo corrente e cuja aquisição (externa ou interna) está, como
lembras, nas mãos de 2 ou 3 Chefes de Compras de empresas de grandes
superfícies. Nesses casos o que nós, consumidores, poderemos
fazer? Talvez um movimento cívico de
promoção de consumo de produtos made in Portugal. Duvido que, por regras de EU,
os Órgãos do Estado o possam promover, mas os cidadãos, sim. Lembro-me que, em momento de austeridade, havia essa
postura, senão generalizada, pelo menos em grande parte. Recordo-me que nas prateleiras
de fruta do Super Cor, perante as maçãs de Alcobaça ou as do Chile, preferia
sempre as primeiras, embora de menor calibre e, quiçá, de gosto menos apurado.
Talvez também seja altura de se equacionar a sério, eventualmente em parceria
com entidades estrangeiras, que detenham know-how, ou capital, ou mercado, o
ressurgimento de certa indústria que, nos anos 80, foi desmantelada, por razões
várias. Aquele tinha que observar, porém,
determinados critérios, mormente o de competitividade externa. O desejo do actual
1º Ministro, por exemplo, de fazer comboios em Portugal só é exequível com o
renascimento da indústria metalomecânica pesada. Que saudades da
Sorefame, da Equimetal, da Construtora Moderna e da Mague, só para falar
das principais e às quais estive profissionalmente ligado directa ou indirectamente. Talvez este desejo, formulado na tarde de uma Quinta
Feira Santa, venha a ser concretizado a prazo relativamente curto. Abraço amigo
e Feliz Páscoa. Carlos Traguelho
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