Num email que recebi de João Sena contendo “Os dois últimos parágrafos do artigo de Miguel Sousa Tavares, com o título “Ninguém
sabe”, saído no EXPRESSO
de 25/04/20 (que tive a
sorte de ler na íntegra no tablet do meu marido), sobre esta pandemia, ao que
parece já em tempos prevista por Bill
Gates, leio que a cientista Maria
Manuel Mota “acha o
vírus bonzinho porque só mata velhos” o que, quanto a mim, é uma solução antecipada
para os adeptos da eutanásia que esperam fazer uma triagem neste excesso
populacional sobretudo nesses que estorvam a harmonia social por razões várias,
em particular os da longevidade, mau grado o disfarce da referência piedosa, quase
única, aos sofredores sem retorno, embora por vezes mais novos. Ao menos a
cientista não esconde sentimentos e assim manifesta profundo afecto pela drástica
pandemia que nos vai limpando o sebo, a nós, os confinados que pesam decididamente
nas economias estatais, com as suas reformas.
Outra referência que me encheu as
medidas de júbilo foi essa do politicamente correcto “idoso” substituindo “velho”,
fazendo que MST se tivesse
divertido na mudança dos títulos de “idosos” livros conhecidos. Como não quero
deixar de participar camaradamente nessas mudanças de subtil delicadeza, lembrei-me
desse outro livro de Guerra Junqueiro que o meu
pai conservava escrupulosamente entre os livros que lhe talharam o pensamento,
o qual poderia, mais diplomaticamente, apelidar-se de “A vetustez do Padre
Eterno”.
“Os
dois últimos parágrafos do artigo de Miguel Sousa Tavares, com o título “Ninguém sabe”
5.
Regresso ao princí.io: ninguém sabe. Ninguém sabe como isto acaba e nem sequer
se acaba bem. Sendo que há diversas formas de acabar mal e acabar bem. A
solução está na mão dos investigadores e dos cientistas, de quem todos
esperamos a tão ansiada vacina. Mas isso não quer dizer, ao contrário do
que já vi escrito, que a crise devesse ser gerida por cientistas e não por
políticos. É justamente o contrário: não há crise mais política do que
esta, em todos os aspectos que comporta. E, se dúvidas eu tivesse, elas
desfizeram-se ao ler aqui, na semana passada, a entrevista à cientista Maria
Manuel Mota, Prémio Pessoa, Prémio Pasteur, comendadora do Infante D. Henrique,
etc. Diz ela que este é “um vírus bonzinho” porque só mata velhos e portanto
a solução é trancar os velhos a sete chaves, proibi-los de ver os filhos e os
netos, de sair à rua, de ter vida enquanto não houver vacina. O
contrário, sustenta, daquilo que defendeu Angela Merkel, para quem não se pode
libertar os jovens e os adultos e prender os velhos. Entre um mundo
governado por um cientista ou por um estadista, eu prefiro sem hesitar o do
estadista. Porque não basta salvar a espécie humana, é preciso que, no final,
ela se mantenha humana nos seus valores.
6.
E, já agora, seria bom deixar de usar a horrível palavra idoso, que rima com
ranhoso, sidoso, leproso, tuberculoso e outros estados a evitar. Eu sei que
faz parte do novo léxico politicamente correcto que obriga a dizer recluso
em lugar de preso, toxicodependente em lugar de viciado em drogas ou drogado,
invisual em lugar de cego, arguido em lugar de réu, e que, no limite,
levava a ex-Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, a exigir ser tratada por
“senhora Presidenta”, ou levou o partido espanhol de extrema-esquerda Unidos
Podemos a mudar o nome para Unidas Podemos. Mas nem por isso deixa de ser
ridículo, apenas o é mais: alguém diz “o meu idoso” em vez de
“o meu velho”, quando se quer referir carinhosamente ao pai? Já imaginaram o
que faríamos à literatura se aplicássemos a ditadura do idoso a alguns casos
célebres: “O Velho Que Lia Romances de Amor”, de Luis Sepúlveda, de que aqui
falei a semana passada, passaria a “O idoso que lia romances de amor”; “O Velho
e o Mar”, de Hemingway", passaria a “O idoso e o mar”; “Os Velhos
Marinheiros”, de Jorge Amado, seriam “Os idosos marinheiros”, e até o nosso
‘velho do Restelo’ acabaria transformado no ‘idoso do Restelo’. Isto, para não
rematar dizendo que “idosos são os trapos”. Tenham lá mais respeito pelos
velhos!
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário