segunda-feira, 6 de abril de 2020

Elegia



De um homem impotente contra as atribulações que vivemos hoje. Como todos estamos: impotentes. Mesmo os que diariamente se arriscam, em favor dos mais, soldados na frente da batalha, mas contra um inimigo assustador porque invisível. 
Uma elegia bem moderna, esta de António Barreto. Porque tendo a estrutura repetitiva da poesia e as lamentações específicas da sua espécie, não deixa de ser uma análise objectivamente explícita de um fenómeno de espantoso efeito numa situação de desconhecido fim.
OPINIÃO CORONAVÍRUS
O valor do humano
Parece história, mas história não é. É hoje. Vivemos uma crise no presente e no futuro, sem saber ou suspeitar do desenlace. Queremos saber tudo, já, mas nem sequer sabemos se estaremos cá para contar.
ANTÓNIO BARRETO
PÚBLICO, 5 de Abril de 2020
À pergunta “de que tem mais saudades?”, respondeu “do amor”. Ou então, “da minha liberdade”! Ou ainda, “dos meus amigos”.
Estes são os tempos em que a mulher não pode abraçar o marido que vai morrer. A família não está autorizada a enterrar o avô. O homem que vai trabalhar não se pode despedir da mulher. Os filhos não podem visitar a mãe. O namorado está interdito de beijar a namorada. A mãe não pode acariciar o filho. Os amigos não jantam juntos. Os irmãos estão proibidos de se encontrar. Os fiéis não rezam aos seus deuses. Os cristãos não estão juntos pela Páscoa. Os muçulmanos não vão à mesquita. Os judeus não frequentam a sinagoga.
Estes são os dias em que os trabalhadores estão condenados à paragem forçada. As máquinas imóveis nas fábricas. Os aviões ficam alinhados na pista. Os carros eléctricos andam vazios. O mercado não tem clientes, nem vendedores. Os comércios não têm produtos para os quais, de qualquer maneira, não há compradores. Os cinemas não exibem filmes. O restaurante não serve refeições. O quiosque não vende jornais. Os hotéis não recebem turistas. A excursão foi adiada. As salas de museus encontram-se vazias. As redacções dos jornais estão fechadas.
Vivemos um presente em que os velhos não jogam a sueca no jardim. Os fãs não assistem ao desafio de futebol. O bando não vai à noite beber copos e ouvir música. As velhotas não fazem tricot à beira da porta, na má-língua. Os professores não ensinam diante dos seus alunos. Os estudantes não ouvem aulas. As filarmónicas não tocam. Os coros não cantam. As equipas não jogam. O médico não dorme em casa. A enfermeira não janta com a família. Os velhos, nos lares, fogem uns dos outros.
Este é o terror. Que tentamos esconder. Com a televisão e as séries. Com os computadores e os telemóveis. A arranjar estantes. A arrumar roupa. A ler e reler livros. A escrever. A organizar correspondência. A idealizar power points e trabalhos de computador. A arranjar as fotografias de família. A reparar máquinas. A coser roupa. A limpar a casa. A dormir. A descansar. É o terror que queremos disfarçar com tarefas e projectos adiados.
É este desastre que tentamos perceber. Ou explicar. Mas apenas conseguimos encontrar o valor humano da nossa vida. O valor do presente. Para todos nós, para quase todos nós, o terror é história. O que vivemos e nos preparamos para viver não tem termos de comparação. Nem é a peste ou a cólera. Nem a varíola ou o sarampo. Ou a tuberculose e a sida. Não que essas sejam ou tenham sido mais brandas, talvez não tenham sido. Mas foram em tempo mais largo e espaço menor. Foram mais lentas. As notícias e os vírus demoravam anos a espalhar-se. E também não é a gripe espanhola nem a asiática, que, para todos nós, são história e nunca pensámos que poderiam ser actualidade. Nem ocorreu que poderiam voltar a ser verdade. Mataram vidas, milhares ou milhões. Mas não ameaçavam a vida.
É terror, não é guerra, não há inimigo a abater, não há adversário a estudar e a derrubar. Não é crise económica, com indicadores, subsídios, indemnizações, esmolas, assistência e direitos sociais. Não é crise com manipuladores dos preços e especuladores das finanças. Não é conflito internacional com exércitos, provocações, inimigos e batalhas. Não é nada do que conhecemos. As chamadas grandes guerras mundiais, a primeira e a segunda, são história. As gripes e as pestes são história. As crises do petróleo, a descolonização, as invasões e as guerras civis na antiga Jugoslávia, no Próximo Oriente e na Ásia do Sudeste já são história, foram reais e terríveis, mas não são comparáveis ao que temos aí!
Aqui, agora, ninguém ataca ninguém. Ninguém abate ninguém, mas são homens e mulheres abatidos. As vítimas não são escolhidas. Os vírus não matam de preferência brancos, negros, indianos ou índios. Não perguntam a religião nem o partido político. Não querem saber que línguas falam as vítimas. O que não quer dizer que os países pobres não sejam mais vulneráveis, que os Estados sem estruturas não sejam mais frágeis e que as nações mais povoadas e menos desenvolvidas não sejam mais fracas. E a verdade é que, por enquanto, os países mais poderosos do mundo são os que actualmente exibem os piores indicadores. Mas não sabemos se os países mais frágeis e mais pobres da Ásia, de África ou da América Latina não venham a ter crises iguais ou piores.
Parece história, mas história não é. É hoje. Vivemos uma crise no presente e no futuro, sem saber ou suspeitar do desenlace. Queremos saber tudo, já, mas nem sequer sabemos se estaremos cá para contar. E, todavia, há tantos que sabem tudo! Tantos que têm a certeza das máscaras, das luvas e das viseiras. Tantos que têm a certeza do que deve ser feito nas ruas, nos comércios, nas escolas e nos hospitais. Tantos que têm programas impecáveis para reabilitar já a economia, evitar a crise social, distribuir dinheiro, nacionalizar, racionalizar, impedir o desemprego e a falência.
Uns sabem o que se passa. Outros o que deve ser feito. Toda a gente quer aproveitar a pandemia para realizar as suas fantasias. Os tolos querem acabar com o capitalismo. Os idiotas com o socialismo. Os desavergonhados desejam ganhar dinheiro. Os tresloucados pretendem conquistar o poder. E os intriguistas dedicam-se a encontrar culpados. Os ressabiados procuram denunciar os trafulhas. E os vigaristas só pensam em aproveitar. Verdade é que sabemos tão pouco!
No início deste desastre, todos sabiam tudo, os loucos perderam a cabeça e disseram o que já esquecem. Passados os primeiros tempos, os que tudo sabem começaram a acalmar-se. Os políticos que cometeram erros enormes, agora corrigem. Outros deram garantias demagógicas, agora acalmam-se. Mas muitos, cada vez mais, percebem que são os homens e as mulheres que estão em causa. Os sentimentos e as famílias. A vida e o amor. Afaste-se a mentira e a demagogia, festejemos a razão e aceitemos a lágrima. A ciência e a pieguice fazem parte do humano. São humanas. A lágrima fácil e o raciocínio frio. O oportunismo e a sensatez. A aflição e a serenidade. Todos são humanos. Como humana é esta sensação de que a ciência avanço tanto e a vida mantém-se tão frágil.
Mas o valor do humano não está na suficiência nem na presunção. O real valor do humano está na generosidade e na entrega. Na procura e na humildade. Até na fragilidade. Por isso é preferível a incerteza do biólogo, a dúvida do virologista e a cautela do médico à certeza do político, à sofisticação do sociólogo e à garantia do economista.
Sociólogo
COMENTÁRIOS:
Antonio Leitao EXPERIENTE: : Qual é sinceramente a mensagem do texto? É contraditório e confuso, sem ser poético e escorreito. Não diz nada e diz tudo...
EuQuixote EXPERIENTE: uma mão cheia de nada trazida de lugares comuns. Esperava melhor, mais analítico e até provocador; talvez também seja o tempo, do brilho embaciar nas mentes dos mais brilhantes.
Mario Coimbra EXPERIENTE: Tem a certeza de que leu esta crónica?
Manuel AR INICIANTE: Aqui está um tesourinho deprimente para aliviar as mentes da tragédia, a necessidade pela originalidade às vezes peca pelo despropósito.
Fowler Fowler INICIANTE: Chama-se a isto exponenciar as emoções contidas na lista semanal do “terror”, elaborada pelo autor à frente da TV. Compreende-se. Porém, em tudo o resto, mais que exibição de sensibilidades e lirismos, é necessário bom senso e aprumo de todos. A situação assim o exige.
Mario Coimbra EXPERIENTE: ??????
Jose MODERADOR: António Barreto voltou a ser razoável. Não pode correr tudo mal. Uma boa mensagem para todos os actores.
Mario Coimbra EXPERIENTE: Excelente. Obrigado.
AC INICIANTE: Texto extraordinário. A lembrar o valor do que nos une.


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