sábado, 10 de outubro de 2020

Hamlet de novo


É coisa antiga, todos o sabemos. O Reino da Dinamarca tinha algo de corrupto, segundo Hamlet, um ser depressivo, envolvido em discórdias e em amores desastrados como hoje também por cá há, mas nós é mais ataques verbais, por conta da muita podridão que aqui reina, João Miguel Tavares explica, amado por uns, odiado por outros, à conta das suas acusações atrevidas que lhe poderão valer vinganças, como as que se deram lá, pelo reino da Dinamarca…

OPINIÃO

O regime está podre — e Marcelo é cúmplice

Marcelo é tão responsável pela nomeação de José Tavares para o Tribunal de Contas como António Costa. O contínuo apodrecimento do regime democrático português é um trabalho que está a ser feito a quatro mãos.

JOÃO MIGUEL TAVARES

PÚBLICO, 7 de Outubro de 2020

De António Costa já se sabe que podemos esperar cada vez menos. Após um primeiro mandato em que ele, por causa do impacto da Operação Marquês e das próprias características da “geringonça”, fez algum esforço por se afastar da cultura socrática que afundou moralmente a democracia portuguesa e arrastou o país para a bancarrota, aquilo a que temos assistido nos últimos tempos é pouco menos do que um filme de terror.

Tenho obsessivamente chamado a atenção para isso nesta página. Por vezes são casos que ganham alguma dimensão pública, como o da procuradora Ana Mendes de Almeida, afastada por opção do Governo de um concurso europeu importantíssimo que ganhou por mérito próprio. Outras vezes são casos que passam praticamente despercebidos, mas cuja relevância é gigantesca, como a nomeação de Vítor Escária para seu chefe de gabinete. Há ainda casos clássicos de velhos boys preparados para todos os fretes no poder, como está a acontecer com a destruição da independência do Conselho Geral Independente da RTP.

A conjugação destas histórias dispersas não deixa margem para dúvidas: o PS entrou em modo bulímico, açambarcando tudo o que pode, controlando tudo o que mexe e não deixando ponta solta se puder atá-la. O cheiro dos milhões da “bazuca” cruzado com o cheiro da crise fez disparar a pituitária socialista, que age como um vampiro que há muitos anos não vê pescoço. O objectivo é sempre o mesmo: controlo, controlo, controlo. O padrão é evidente: poder, poder, poder.

Mas se de António Costa podemos esperar cada vez menos, a pergunta que se impõe é: onde está Marcelo? O que anda ele a fazer? Que utilidade dá à sua popularidade estratosférica? O Presidente da República foi cúmplice no afastamento de Joana Marques Vidal, foi cúmplice na nomeação de Mário Centeno para o Banco de Portugal e volta a ser cúmplice no pontapé nos fundilhos do presidente do Tribunal de Contas.

Às vezes, Marcelo parece que está a brincar connosco. Na terça-feira ao final da tarde deixava um recado no Expresso: dizia que Vítor Caldeira tinha sido “um óptimo presidente do Tribunal de Contas”, que o elogiou “várias vezes”, e que aguardava que António Costa lhe propusesse um novo nome dentro “da mesma linha” e “exactamente com o mesmo grau de exigência”. Na terça-feira ao início da noite estava a nomear José Tavares.

Assim que recebi a notícia, a primeira coisa que fiz foi googlar “conselheiro José Tavares”. E a única coisa que me apareceu, acerca da sua intervenção pública no reino de Portugal nos últimos anos, foram notícias em que o seu nome aparece cruzado com o de Paulo Campos, com o de Mário Lino, com o de Guilherme Dray e com essa monumental desgraça que foram as PPP rodoviárias no tempo de José Sócrates — todos juntinhos (inclusive ao fim-de-semana) num cambalacho para garantir que as subconcessões rodoviárias recebiam o visto favorável do Tribunal de Contas. Entretanto, Luís Rosa já contou a edificante história no Observador.

Ainda que em Belém possam faltar bons conselheiros a Marcelo Rebelo de Sousa, imagino que pelo menos não lhe falte Internet. Tendo em conta a sensibilidade na escolha do novo nome para o Tribunal de Contas, podia ao menos ter pesquisado um bocadinho — e, como não o tenho por conta de político amador, acho obviamente que pesquisou. Donde, Marcelo é tão responsável por esta nomeação como António Costa. O contínuo apodrecimento do regime democrático português é um trabalho que está a ser feito a quatro mãos.

Jornalista

TÓPICOS

GOVERNO  ANTÓNIO COSTA  MARCELO REBELO DE SOUSA  TRIBUNAL DE CONTAS  JUSTIÇA  CORRUPÇÃO  OPINIÃO

COMENTÁRIOS:

João Lopes INICIANTE

Diz a sabedoria popular que quando alguém quer agradar a toda a gente acaba por não agradar a ninguém. Vamos ver com ficará com o julgamento do roubo das armas... 09.10.2020    Henrique Duarte INFLUENTE: «Mas se de António Costa podemos esperar cada vez menos, a pergunta que se impõe é: onde está Marcelo? O que anda ele a fazer? Que utilidade dá à sua popularidade estratosférica? O Presidente da República foi cúmplice no afastamento de Joana Marques Vidal, foi cúmplice na nomeação de Mário Centeno para o Banco de Portugal e volta a ser cúmplice no pontapé nos fundilhos do presidente do Tribunal de Contas.» A presidência com o Marcelo não é um contrapoder, é puramente decorativa. O Salazar tinha o Américo Tomás. O António Costa tem o Marcelo.    Gens Dias da Silva Ramos INICIANTE: Já disse. O senhor Presidente é igual a si mesmo: Marcelo Rebelo de Sousa. O senhor primeiro-ministro, trabalha para si. Os portugueses são apelidamos de: terem bons costumes e poder de adaptação, por isso, façam o favor de viverem com os seus erros. Somos uma sociedade democrática; temos eleições democráticas; assim, não se queixem. Actuem. Façam. 08.10.2020    SC RIBEIRO INICIANTE: Gostaria de adivinhar o que diria JMT se Costa reconduzisse o Presidente do T. Contas. Mas quase apostaria que seria zurzir no 1o Min. clamando que AFINAL Ana Vidal foi corrida porta fora por... interesse politico. Vamos lá entender estes... colunistas "isentos"...    Fernando Luz.550569 INICIANTE: Só falta regressar José Sócrates, e com tudo isto quem vai marcando pontos, são os que se opõem frontalmente a Costa e a Marcelo. Quem são eles? O Chega está a esfregar as mãos de contente. ricardo111 EXPERIENTE: Ao menos com tipos como o Sócrates removiam-se os intermediários.    Evolucionista INICIANTE: O Costa tem conseguido fazer o impossível: fazer de conta que não teve nada a ver com a governação Sócrates. E o triste é que os partidos da geringonça deixaram. De todas as exigências, nunca lhe exigiram uma declaração de repúdio e explicação pelo ocorrido. É claro que muitas das figuras de então são agora as mesmas e aparecem de vez em quando para o assombrar. E a nós. Muito preocupante.   Aónio Eliphis EXPERIENTE: Costa foi parte integrante do governo Sócrates. Mas obviamente, não viu nada.  ALRB EXPERIENTE: Portugal no seu todo (Marcelo, o próprio PS e esquerda do PS incluídos) está refém de Costa que, tirando partido da actual distribuição de intenções de votos e o antagonismo entre partidos à esquerda do PS e partidos à direita do PS, torna este partido o único capaz de formar governo mesmo que não tenha a maioria relativa como se viu em 2015. Daí Costa fazer o que quer desde nomear cadastrados até ignorar o próprio PS na escolha do candidato presidencial. A chegada de dinheiro da UE vai permitir a Costa assenhorear-se do que falta assenhorear-se e ele tem que preparar a administração do Estado e da Justiça para dispor desse dinheiro. Eu acho que à luz disto a relação Costa/Marcelo é entendível.    OldVic1 MODERADOR: Há alturas em que Marcelo parece mais preocupado em parecer que é tudo para todos do que em usar o seu enorme capital político para cumprir o seu papel de chefe do Estado. Seria bom que ele entendesse que o dito capital político só é útil se ele for capaz de o gastar quando é necessário.   ana cristina MODERADOR: tarde demais. em situações-chave não o fez.     Aónio Eliphis EXPERIENTE: Cavaco com todos os seus defeitos, nunca teve problemas em exercer o seu mandato como chefe de estado. Marcelo quer ficar na história como agradando a gregos e troianos, e acabará esquecido como um presidente popular, mas menor. A democracia não é feita de consensos.     Jorge Sm MODERADOR: Cavaco? Tem graça, essa. Ficou com a alcunha de múmia por se abster do exercício das suas competências. Já o Marcelo exerceu as dele: nomeou o presidente do TC, como lhe competia, e disse não ter hesitado nem um segundo quanto à não renovação do mandato do anterior presidente e quanto à nomeação do novo presidente. Se o Aónio não gostou, nem de uma coisa, nem da outra, tem bom remédio: não vote nele. Chama-se Democracia.       Fernando Ferreira INICIANTE: Que o regime está podre, não oferece dúvidas. Há muito que está, devido a uma "partidocracia" reinante que sempre se preocupou acima de tudo com tachos para os seus boys e com negociatas muito pouco transparentes e extremamente prejudiciais para o país.Com a corrupção na Justiça o regime bateu no fundo, com o total silêncio de toda a classe política e governante. Factos são factos, vimos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar. Agora, relativamente ao artigo de JMT há também um facto demasiado evidente, JMT está com uma grande falta de memória e com uma grande falta de olfacto, pois a podridão do regime, podridão que ele refere, tem imensos anos. Recomenda-se ao escriba tomar Memofante para a memória e a fazer um teste covid pois a falta de olfacto é um dos sintomas reconhecidos. Óculos também. publico1234567 INICIANTE: Sempre foi e será podre: "Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai (...) Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não discriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo..." - Guerra Junqueiro, in "Pátria (1896)"      GILDA INICIANTE > publico1234567 INICIANTE Chamar para aqui Guerra Junqueiro não tem nada a ver...a não ser que se esteja a ver ao espelho, eu como povo ou mesmo burguesia não me reconheço.      ALRB EXPERIENTE: Gilda, o Guerra Junqueiro também não estava a falar de si. É preciso olhar para a floresta e não para a árvore (ou para o umbigo, no seu caso).    JPR_Kapa EXPERIENTE: O exagero faz parte da doença que se quer maior, para exibicionismo retórico. Há pessoas que falam do passado, que nunca viveram, como se fosse o paraíso perdido. o que revela uma ignorância histórica que nem os miúdos do ensino básico, que estudem, possuem. Por mais que as evidências mostrem que até estamos hoje entre as melhores democracias do mundo, isto é, evoluímos, e nenhuma é só virtudes, insistem nestas lamúrias, prova de que há aqui gato escondido com rabo de fora, ou seja, uma visão clubista exacerbada ou incapacidade para compreender e agir na complexidade. É redutor e totalmente inútil, É uma crítica viciada, servindo apenas o alarme social e uma vontade de destruir a democracia, ou seja, o único regime que permite o escrutínio e a discussão.      ana cristina MODERADOR: Uma esquerda minimamente madura não tem medo de ouvir a expressão «regime podre». A crítica faz parte da democracia. O receio da crítica é que é próprio da ditadura. Não se escondam atrás de frissons reaccionários.      dsog.899665 INICIANTE: O regime é a república... Estes ensaios de demagogia de extrema-direita irão ter consequências para todos os democratas...     ALRB EXPERIENTE: A esquerda tem medo da expressão "regime podre" porque foi ela que sustentou um governo repleto de figuras fundamentais, estruturantes e apoiantes do Socratismo.       JPR_Kapa EXPERIENTE:O regime é "podre" só quando governa a esquerda, pelo que estamos conversados sobre a verdadeira natureza da crítica (começou no primeiro dia em que tomaram posse, tipo pavloviano) - crítica viciada é o típico exercício do trumpismo e dos seus seguidores. Se o que encontram de pior são os "casos" relatados, então Cavaco deve ser o "diabo" em pessoa... enfim, o absurdo também tem adeptos e reagem mal quando criticam as suas "críticas", as quais somos obrigados a venerar, sempre muito "pertinentes" e carimbadas por um qualquer deus, caso contrário somos excomungados. A esquerda democrática em Portugal foi sempre o seguro de vida da democracia e da liberdade,     Trolha Areosa INICIANTE: Pois o problema é mesmo esse, o jornalistas são um poder que não é sufragado e sabemos que são uns vendilhões, estão ao serviço de quem lhes paga mais……! Publicam o que lhes interessa e omitem o que não lhes agrada e a meu ver devem ter um papel nulo nas nossas escolhas politicas sejam de esquerda ou de direita mas a realidade é bem outra, veja o caso dos grupos de informação americanos e o seu papel feroz nas campanhas dos candidatos…..e o povo quer é sorteios de carros novelas e bisbilhotices. IZANAGI01 INICIANTE: Em política o pragmatismo em situações pontuais exige coragem para esquecer a fidelização partidária Quantas vezes MRS se opôs a decisões de AC em todo o seu mandato? Apoiar MRS é apoiar o governo. Esta é que é a realidade. Quem se identifica com a oposição a este governo, tem que ter a coragem de não apoiar MRS porque acessoriamente está a apoiar AC. Também não deve abster-se, mas contribuir com o seu voto para que a eleição do PR não aconteça à primeira volta.    paulo rodrigues INICIANTE: Tá tudo podre! E faz séculos ou milénios que é assim. E todos somos complacentes e coniventes e participantes nessa podridão. Não existem inocentes, para além de algumas tribos isoladas que ainda não contactaram com a "civilização"...Todos participamos de diversas formas e com diferentes estados de alma no caos ordenado da 1ª civilização planetária! É uma beleza monstruosa e ciclópica, mas é o que temos. Até ao dia em que a humanidade como um todo atinja um tal desenvolvimento universal de consciência, que se possa instaurar a anarquia, sem mais injustiça, violência e corrupção que aquele que o sistema actual já produz. Até lá, querem mudar alguma coisa. Inscrevam-se numa associação legal criminosa... perdão, partido político, e trabalhem para que a mudança efectivamente se dê, ou bardamerda    Gens Dias da Silva Ramos INICIANTE:  Acho que tem razão JMT. Isto, em termos de progresso no país, a coisa está preta/vermelha, como diria o Chico. Não esqueçamos que daqui a 2,5 meses temos eleições; sim, Marcelo vai vencer, contido, a percentagem conta; por isso, vamos ver a maturidade portuguesa de que tanto se fala.    (…)    JORGE COSTA EXPERIENTE: O leitor Mário Borges ainda vive o 25 de Abril de 74 como se fosse hoje. Ouça homem, o mundo evoluiu! Temos Extrema-Esquerda em Portugal sabia?! Sim, o BE. E pior ... com apenas 8% eles mandam neste rectângulo à beira-mar plantado!! Todos temos direito a comentar mas no seu caso, e com os argumentos apresentados, respire, respire muito e muitas vezes e abstenha-se de dizer tamanhos disparates. Não lhe fica bem.... Haja vergonha!    barbosa de almeida MODERADOR: Eu, que muitas vezes discordo de JMT, tenho que admitir que o Pais está podre. Só não vê, quem está lucrando com a situação     ALRB EXPERIENTE: O Costa é um exímio gestor de fragilidades. Coloca, em funções chave, indivíduos com rabos-de-palha a começar pelo Presidente da Assembleia da República e a acabar no seu chefe de gabinete. Esses nomeados são facilmente dirigidos por ele (Costa) já que estão sempre sob a ameaça de ele deixar de os proteger. A capacidade de Costa explorar todo o tipo de fragilidades é multifacetada, extensiva e eficaz. 07.10.2020

……………………………..

Nenhum comentário: