Mais um escrito dos sarcasmos rigorosos de
Alberto Gonçalves, que nos
vão amachucando como povo exaltadamente futeboleiro e festivaleiro, que tudo
reduz a amores ou ódios e pretensões de saber, de reduzida dimensão, é bem
verdade. Alberto Gonçalves nos conhece
e condena, nessas nossas pretensões de arrogância palavrosa, que uma difusão
dos valores esquerdistas mais faz alardear, em fúria contra um homem que os
repele, naturalmente, a esses valores esquerdistas, atento aos desígnios
nacionalistas colhidos dos seus antepassados. Alberto Gonçalves mostra a inanidade desses nossos pretensiosismos
contra um Trump eficaz, Cipião Numantino, ao citar a
História dos povos e a importância-chave das grandes potências na condução do
mundo, bem demonstra a necessidade daquelas, na defesa contra outras
prepotências abafadoras, que deveriam assustar a todos igualmente, hoje, já que
vivemos em “democracia”…
Se Trump ganhar, o mundo acaba outra vez? /premium
O mundo, li no “Público” e ouvi na
Sic, acabou há quatro anos, mal Trump tomou posse e decretou o extermínio da
humanidade. Fora isso, tudo permaneceu normal durante três anos e meio.
ALBERTO
GONÇALVES, Colunista do Observador
OBSERVADOR, 31 out 2020
Engraçado.
Muitos portugueses não gostam da América, embora gostem de visitar
Nova Iorque na medida em que, juram eles, aquilo é essencialmente europeu e não
tem nada a ver com o resto (diga-se
que, em diversos sentidos, Nova Iorque é a cidade menos “europeia” e mais
americana da América, mas pronto). Muitos portugueses troçam da
“juvenilidade” da América, que nasceu ontem e carece de “dimensão histórica” (diga-se que os sujeitos em questão desconhecem a
história da América, da Europa e da Beira Baixa, mas não sejamos picuinhas).
Muitos portugueses abominam a América, que é imperialista,
capitalista e fascista (e,
imagine-se, o destino sonhado por todos os habitantes das verdadeiras
democracias, género Cuba, mas que se lixe). Muitos portugueses
riem-se dos americanos, porque são evidentemente incultos e caipiras (diga-se que os caipiras são responsáveis por boa
parte dos avanços tecnológicos dos últimos 150 anos e, em média, ganham por
semana o que nós ganhamos por mês, mas basta de futilidades). Não
obstante, muitos portugueses, invariavelmente os mesmos, demonstram inusitado
interesse pelas eleições presidenciais dos EUA.
É
uma atitude difícil de compreender. Eu não sinto qualquer curiosidade ou
admiração pelo Bangladesh, logo não faço ideia da linhagem de sobas locais. Em
contrapartida, os portugueses que desprezam a América mostram-se
preocupadíssimos em analisar ao pormenor cada novo inquilino da Casa Branca. Deve ser
pelo enorme impacto da América no futuro do planeta, conquanto as pessoas
informadas percebam que a América já não tem impacto nenhum, pelo menos desde
que a URSS, antes, e a China, agora, reduziram a cinzas o protagonismo
americano. Por regra,
a inquietação dos portugueses com uma eleição em que não votam é justificada: sempre
que o presidente é republicano, vem aí a IIIª Guerra Mundial. Sempre que o
presidente é democrata, a apreensão modera-se um pouco. Se o presidente é
democrata e meio negro (o facto de ser meio branco não conta), chega a haver
relativo entusiasmo. Se o presidente é republicano e completamente Trump, é
óbvio que o mundo acabou.
O mundo, li no “Público” e ouvi na Sic, acabou há quatro anos, mal Trump tomou posse
e decretou o extermínio da humanidade. Fora isso, tudo permaneceu normal
durante três anos e meio. A economia deles manteve-se em franco crescimento. O
proteccionismo não foi demasiado além das ameaças. As prometidas carnificinas
globais consistiram em refrear os delírios bélicos do sr. Obama e em
estabelecer ou influenciar acordos de paz na Coreia do Norte e no Médio
Oriente. Os lamentos pelo clima
ficaram entregues a uma criança sueca, ao eng. Guterres e outros especialistas
de idade similar. Os protestos nas ruas couberam tipicamente aos
herdeiros da baderna hitleriana
(“antifa”, “black lives matter”, etc.). As divergências raciais sérias
seguiram iguais ao que eram. A “radicalização” política e social nem é inédita
nem responsabilidade solitária de Trump. A demência inquisitorial nas
universidades precede Trump. O muro “de” Trump, iniciado por Clinton, quase não
avançou. Em suma, graças a Trump ou apesar dele, sob Trump a América viveu uma
monotonia notável, tão notável e tão monótona que o debate público se deu ao
luxo de versar temas vitais como o “género”. E
depois, no início de 2020, veio a China mostrar que uma superpotência se
distingue por produzir vírus em mercados medievais e infectos.
Se
Trump perder as eleições, o que é provável que aconteça, perde-as por causa da
Covid. É possível que também as perca por causa das suas declarações acerca da
Covid. Nesse e noutros assuntos, Trump, um pantomineiro, perde frequentemente
pela língua, que ora tem piada na ofensa de adversários, ora não tem. No caso,
acaba por ser injusto. Sobre a Covid, descontadas as sucessivas
atoardas, Trump esteve essencialmente bem: ao invés dos charlatães que apelam
ao medo, Trump fez o que fazem os líderes e lutou para que o medo não vencesse.
À sua destrambelhada maneira, respeitou as pessoas, por oposição ao enxovalho
hoje vigente nalguma Europa. Se calhar, não resultou. Se calhar, até na América
a maioria das pessoas já prefere ser enxovalhada.
Não
tenho muita pena da eventual derrota do homem. Tenho um bocadinho. O
primeiro motivo é racional: se, em geral, os sujeitos que detestam a América
estão contra Trump, é lícito suspeitar que Trump é bom para a América, país de
que gosto. O segundo motivo é irracional: não apreciando o estilo fanfarrão e
malcriado de Trump, aprecio a repulsa que o estilo fanfarrão e malcriado de
Trump provoca em criaturas imensamente mais repulsivas do que Trump – e não
falo apenas do lendário Costa Ribas. Sobretudo
aprecio o que Trump, com equívocos pelo meio, representa para os que o
elegeram: um desafio à arrogância das costas Leste e Oeste, que olham para o
“interior profundo” com uma mistura de divertimento e nojo. É estranho que um promotor
imobiliário, e bilionário, de Nova Iorque simbolize a revolta dos “esquecidos”
contra as classes dominantes, repletas de prepotência, culpa, hipocrisia,
susceptibilidade e mimo. Mas alguém teria de o fazer.
Se
Trump continuar a fazê-lo por novo mandato, óptimo. Se não, o mundo não acaba (acabou
há quatro anos, lembram-se?). Com sorte, o sr. Biden, um taralhouco
simpático rodeado por alguns doidos antipáticos, não destruirá a União. Ao contrário de muitos portugueses, gosto da América
(não sei se já o disse), conheço-a razoavelmente para um turista e aprendi uma
coisa: é impressionante a indiferença da vida americana ao
indivíduo que serve de chefe de Estado.
Andei repetidamente por lá nas presidências de W. Bush, Obama e Trump e, salvo
pelo residual “merchandising” (exaltador de Obama, insultuoso dos outros dois)
em lojas “fofinhas” de Nova Iorque ou Boston, de Los Angeles ou São Francisco, a
“presença” do presidente no quotidiano é nula. Não existe a percepção de quem
manda.
Principalmente porque na América quem
manda, manda pouco. A ideia de uma figura tutelar e omnisciente é própria de
sociedades pré-civilizadas, em que qualquer burgesso chega ao poder e desata a
tratar os cidadãos abaixo de bonequitos, dependentes, reverentes, medrosos e
infantis. Se eu fosse certos portugueses, deixava Washington em paz e
dedicava-me a escrutinar um lugar assim.
ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA AMÉRICA MUNDO DONALD TRUMP JOE BIDEN EUROPA
COMENTÁRIOS:
Faisal Al Meida: Muito bom
artigo, como sempre, caro AG! Há-de um dia escrever um artigo menos bom... só
para vermos como seria. Mera curiosidade intelectual. Para provar que é
possível, pronto. João
Belém: Terça-feira Donald Trump ganhará as
eleições. Os media estão apenas a fingir que vai ser ao contrário.
As sondagens não são fiáveis, servem
apenas de propaganda e os media também sabem isso. Faz tudo parte da encenação.
Eventualmente servir-se-ão dos resultados
das sondagens para invocar fraude eleitoral e justificar mais uns protestos nas
ruas a assaltar lojas, incendiar carros e edifícios como têm feito nos últimos
tempos, tudo feito de forma pacífica evidentemente... Você está enganado
Alberto, mas de resto o seu artigo é justo. Cipião Numantino: A título preambular direi que nunca me senti seduzido
pelo “American way of life”. E tanto assim é que declinei “in illo tempore” uma
oportunidade de estudo que me haveria colocado num contacto mais que directo
com a realidade americana. Bastas vezes tenho pensado que fiz mal, mas o
instinto imediato que me acudiu à época, nunca por norma me deixou ficar mal em
tantos e tantos casos. Águas passadas e pronto. E mesmo em relação a turismo
tenho preferido outras paragens que não as respeitantes aos States (sou mais um
adorador de calhaus) e nem família chegada que por lá reside, me fez activar a
curiosidade. Talvez um dia me atreva a percorrer a mítica route 66 e a mais,
sinceramente, não aspiro. Posto
isto, ripo da primordial premissa que serei um pouco insuspeito quanto ao
apreço ou não que dedico a este grandioso país. E da concepção que tenho quanto
ao desempenho que esta imensa nação tem jogado no tabuleiro político nos
últimos 100 anos. Uma coisa
desde logo registo é que se trata de um povo generoso eivado de alguns defeitos
mas com soberbas virtudes. E nem numa situação nem na outra posso ficar
indiferente ao papel que tem desempenhado como polícia do mundo livre.
Como é por aqui sabido e consabido
apoio-me várias vezes na História para ajudar a situar quem me lê e,
simultaneamente, suportar certas teses sociais, culturais ou políticas que
pretendo esmiuçar. E é aqui chegado que reconheço aos EUA o seu papel
importante no concerto das nações. Diz-nos
a História que sempre que nos deparamos com a ausência tutelar de uma superpotência
os tempos são invariavelmente de guerras, caos e desastre. Por exemplo, durante
muitos séculos, Roma foi a luz e o farol que guiaram os destinos do mundo
ocidental e a sua sombra tutelar servia de regulamento e ao concerto entre os
povos “socii et amici” e não é por acaso também que os povos que a precederam
adoptaram a lógica da pax romana e acolheram os ensinamentos da cultura
greco/romana, a sua religião, o seu direito e a sua praxis política.
Desaparecida Roma, foi o que se viu. E a grande e terrível noite medieval fez o
seu curso horrendo de guerras, fome, pragas e miséria.
E é
aqui que eu queria chegar, para estabelecer um paralelo onde a ausência de uma
superpotência nos pode conduzir. E à assunção da inevitabilidade que constitui
uma espécie de luta de galos quando no xadrez político só existem,
médias-potências que logo se envolvem em disputas territoriais ou de influência
do poder pelo poder. Basta aliás reparar, entre outras, nas guerras dos 7, 30 e
100 anos que colocaram a baixa idade média a ferro e a fogo, num frenesim de
guerra caótico que tornou a terra num local horrendo para se viver. E, mesmo
antes disso, as invasões bárbaras tardias ou as invasões dos mongóis e dos
hunos, fazem-nos lembrar a falta que fez a força e o poder da Roma da república
ou dos imperadores até ao desastroso reinado de Comodus. Mediante a tese
acima expressa, Deus nos livre, portanto, que os EUA deixem de desempenhar o
seu papel como superpotência. Depressa apareceriam Estados Islâmicos
dispersos ou médias potências como foram a Prússia, França, império
Austro-Húngaro, Inglaterra ou Alemanha nos cerca de últimos 200 anos, que
tratariam de tentar amarfanharem-se umas às outras instalando o completo caos e
desordem. A própria
Alemanha das duas últimas grandes guerras não se teria atrevido a desencadear
tais excessos se os EUA não estivessem ainda num estádio inicial de poder. Por
isto mesmo, sorrio condescendentemente, quando observo por aqui os esquerdosos
tontos e apressados a desejar a “morte” da América. Coitados, são mais brutos
que portas e devem ser olhados de soslaio e com suspeição antes que façam mal a
eles próprios e, pois claro, aos demais. Os EUA após Carter,
passaram a ser levados pouco a sério. E o
bailarino tonto do Obama, veio dar quase a machadada final, deixando lavrar
guerras regionais por tudo quanto é sítio que se estavam a tornar um modo de
vida sem qualquer sentido ou propósito. E
chega assim o “grande satâ”, epíteto que os os loucos, alucinados e
esquerdosos, colocaram ao Sr. Trump. Ou seja, o único presidente americano
que não promoveu uma única guerra seja onde for, nem que seja a jogar berlinde,
é considerado por toda esta malta estulta como um boçal assassino e até mesmo
louco! Nem créditos
ou loas lhes dão por promover a paz entre alguns países no médio-oriente ou
acalmar o Kim coreano! É obra, sim
senhor! E nem se chocam por haver sido entregue o prémio Nobel da Paz ao
tonto do Obama que distribuiu guerras por aí como infestação de uma grande
praga de piolhos! Sei bem que
esta malta rebaldeira e alucinada esquerdosa não é para ser levada muito a
sério, mas que faz impressão, lá isso faz! Tirem-mos
da frente!... Miguel
Antunes: Land
of the free, home of the brave.
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