quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Trocadilhos, para trocos

 

Ao que parece, aqui joga-se muito ao ser e parecer:

Ser o que parece; não ser o que parece; ser o que não parece; não ser o que não parece.

Ou, noutros sintagmas de expressão oposta e sentido idêntico: Parecer o que é; não parecer o que é; parecer o que não é; não parecer o que não é

Dá para todos os gostos. E assim se joga o presente e o futuro desta nação, com exemplos variados de contextos variados, na ilusão das aparências ou na certeza das realidades.

O certo é que não saímos daqui, pobres que somos, sempre em investigações comprometedoras e nunca em realizações de rectidão exigente e rigorosa, a ser o que parece, a parecer o que é, sem subterfúgios. Mas José Diogo Quintela parece certo do que é, de facto, por cá – sempre com subterfúgios - e brinca com isso, talvez em desespero de causa.

O MITO DO MITO DA MÁ UTILIZAÇÃO DE FUNDOS EUROPEUS /PREMIUM

Parece que aquela ideia, de que em Portugal os fundos são desperdiçados, é uma lenda baseada apenas em alguns casos remotos. Hoje, é quase impossível aldrabar porque a fiscalização é implacável.

JOSÉ DIOGO QUINTELA, Colunista do Observador

OBSERVADOR, 13 out 2020

Quando li que o Nobel da Economia tinha sido entregue aos inventores de um novo tipo de leilão, gritei: “Viva! Mais um prémio Nobel para Portugal!” Só depois percebi que o prémio foi atribuído a dois investigadores americanos e não ao nosso Governo. Pena. Achei que o Primeiro-Ministro tinha ganho com esta nova forma de leilão, em que consegue vender não só a quem licita o maior lance, mas também a quem licita o segundo maior lance e, ainda, a quem licita o terceiro maior lance.

Como é que se consegue vender tantas vezes o mesmo produto? É essa a genialidade de Costa: consegue-se, porque o produto não é real, o produto é a ilusão de se participar na governação. Por isso pode vender-se ao BE e PCP, que pagam com menos exigências para aprovarem o Orçamento do Estado, mas também ao PSD, que paga com apatia no despedimento do Presidente do Tribunal de Contas. Alinham todos na fantasia.

Num leilão organizado por António Costa, o pregoeiro grita: “Temos aqui a fantasia de se ter algum poder. Quem dá mais? Aquele senhor ali na ponta? O velhinho lá atrás? Esta senhora aqui? Mais alguém? Arrematado pelo PSD, que oferece passividade! E também pelo BE, que admite o truque de tirar o Novo Banco do OE. E pelo PCP, que vai deixar que o aumento do salário mínimo seja residual!” E bate com o seu martelinho na cabeça dos licitadores, que no dia seguinte não se lembram da figura que fizeram. É pena o Comité Nobel ter esnobado esta estupenda inovação. Mas percebo, deve ter ficado baralhado: por um lado, é um feito merecedor do Nobel da Economia, por outro, também podia ganhar o da Medicina, porque é uma nova forma de meter a oposição a dormir sem recorrer a medicamentos.

O caso do Tribunal de Contas é curioso. Desde que se soube que Vítor Caldeira não ia ser reconduzido, depois de ter avisado para as possibilidades de corrupção que os fundos europeus trazem, começaram a surgir vários artigos sobre um tal de “mito da má utilização do dinheiro que vem da UE”. Parece que aquela ideia que sempre tivemos, de que em Portugal os fundos são desperdiçados ou mal atribuídos, é uma lenda baseada apenas em alguns casos remotos quando aderimos à antiga CEE. Hoje em dia, é quase impossível aldrabar porque a fiscalização é implacável.

No fundo, estes comentadores estão a dizer que agora a distribuição dos fundos corre lindamente por causa do bom trabalho da fiscalização, daí não fazer mal afrouxar a fiscalização. Ou seja, como as falcatruas diminuíram por causa da vigilância do TdC, já não é precisa a vigilância do TdC. É como estar a fazer escalada e, às tantas, como não se caiu com gravidade, decidir retirar a corda de segurança.

Mas eu percebo, que nestes tempos excepcionais, em que é preciso fazer chegar rapidamente o dinheiro aos projectos, faça sentido ter no TdC alguém menos picuinhas, menos preocupado com as regras. José Tavares não é má opção, ajudou o Governo Sócrates a ultrapassar as reservas do TdC para poder fazer PPP onerosas. Mas se queremos um presidente do TdC mesmo facilitador, um especialista a tornear as leis à volta destes fundos para melhor os sacar, então a pessoa ideal é Hortense Martins. Se há quem saiba aproveitar subsídios europeus até ao último cêntimo, é a ágil deputada do PS que recebeu ajudas à construção para um empreendimento que já estava construído – menos as prateleiras do bar, eu sei.

E é, para além de todos estes atributos, alguém que confere prestígio à função, uma vez que, fazendo fé nos comentadores que dizem que isto das falcatruas nos fundos europeus já é passado, Hortense Martins é um fóssil vivo. Como o Buck Rogers (vão ao Google, millennials), ficou preservada no gelo e, com o aumento das temperaturas, descongelou agora. Imediatamente, recomeçou com práticas que eram típicas da década de 80 do século passado quando, ao contrário de agora, os fundos europeus eram desbaratados.

Ou o mito da má utilização dos fundos é um mito, ou Hortense Martins é o monstro do Lago Ness.

Receba um alerta sempre que José Diogo Quintela publique um novo artigo.

TRIBUNAL DE CONTAS  PAÍS  CORRUPÇÃO  JUSTIÇA  GOVERNO  POLÍTICA  FUNDOS COMUNITÁRIOS  UNIÃO EUROPEIA  EUROPA  MUNDO

COMENTÁRIOS:

Adriano Alves da Rocha: Se realmente não fosse um mito a boa utilização dos fundos europeus, então deveríamos estar ao nível de uma França e não na cauda da Europa em que até os países de leste estão a ultrapassar Portugal....          António Duarte: Só não percebo a razão por que o Costa não põe a Hortense como ministra de tudo...     Amílcar Alhão: O que é preciso é que venham os milhões para eu e os meus camaradas podermos manter e se possível melhorar a vida de verdadeiros nababos de que já beneficiamos à custa do povo português e do resto da Europa     antonyo antonyo: Já que Hortense Martins não se demitiu , convém não deixar esquecer essa falcatrua inacreditável. José Monteiro > antonyo antonyo: Hortenses & Fertuzinhos (Sónia), SA Partido. B) A deputada Sónia Fertuzinhos recebeu, nesta legislatura, do Parlamento, mais de mil euros por mês por subsídio de deslocação para Guimarães... apesar de viver em Lisboa. Foi detectada a situação em final de 2017; A) Sócrates times ou antes: uma irmã nos EUS com saudade da mana deputada; uma semana nos EUA em apoio familiar (fora do regulamento, dito pela Sra Secretária-geral da AR; um Boss do Partido no Parlamento, que releva a sua total confiança; uma venda da ´honra' da Sra For(ur)tosinhos, por um punhado de dólares, cerca de 800 euros. Aleluia.   Filipe Costacarlos andrade: Tem toda a razão. A V: É tão lenda quanto a atribuição de fundos para entidades públicas aplicarem em terreno privado como se estivéssemos em 1975... valham-nos os fiscais que dormem tão beneplacitamente e a burocracia que nos permite exercer a imaginação para ultrapassar a falta de autorizações e afins... Mas vá, tenhamos uma discussão profícua sobre os conceitos de "mito" e de "lenda" para que possam ser usados com maior propriedade pela administração (ia dizer pública, mas depois lembrei-me que também temos de discutir o significado de "res publica").    josé maria: O José Quintela ainda não reparou que o maior cancro da economia portuguesa são os ajustes directos ? Está a fingir-se distraído ou quê ? Não lhe interessa colocar o dedo na ferida? Nós precisamos de humoristas, sim, mas daqueles que não se entretenham com manobras de diversão relativamente ao essencial.   Sparks and Sparrows: "Parece que aquela ideia, de que em Portugal os fundos são desperdiçados, é uma lenda baseada apenas em alguns casos remotos. Hoje, é quase impossível aldrabar porque a fiscalização é implacável" Este parágrafo corresponderia em absoluta à realidade se expurgado do "parece que". Não parece é um facto! António VieiraSparks and Sparrows: Sim Hortense... tudo legal filha. Os tansos pagam.    Henrique Pt: Querem um conselho? Preparem as malas, um pé de meia e reforcem contactos com família ou amigos no estrangeiro que é para quando o burgo torcer o rabo possam sair rapidamente dele. Não tenho dúvidas de que tal vai acontecer só não sei é dizer quando. Para mim acho que vai ser em 2023.    Gens Ramos: Deus nos ajude!    Henrique Costa: Eu também ouvi o Contraditório na Antena 1 e também fiquei escandalizado. Da Luísa Meireles não esperava outra coisa, do António Teixeira nem tanto, agora do Raul Vaz???????? Vergonhoso!!!   António Vieira > Henrique Costa: Ainda não ouvi o Contraditório desta semana, mas você esperava algo diferente do António José Teixeira? Veja a condução do debate que ele fez entre o Rui Rio e o André Silva, onde todas as perguntas foram sobre a especialidade do André Silva. E serviu-lhe bem... está hoje à  frente da RTP. E a Meireles à frente da Lusa.   antonyo antonyo > Henrique Costa: Do António José Teixeira nem tanto!? António Vieira: De facto e' um discurso interessante destes últimos dias, em que a corrupção foi atirada para os idos anos 80 quando os malvados direitistas estavam no poder. Todos os escandalosos casos dos últimos 20 anos subitamente desapareceram e o nosso único problema são as "forças de bloqueio" que insistem em fazer cumprir a lei que eles próprios (os que se queixam) escreveram e aprovaram. Assumindo que não pagaram a algum gabinete de advogados de alguém casado com ministros para escrever essas mesmas leis.   Martelo de Belem ....: Como Bolsonaro diz: eliminei a Lava Jato porque no governo dele a corrupção deixou de existir. Em Portugal o TdC não existe mais porque a corrupção é normal. Os extremos parecem tocar-se.

 

Nenhum comentário: