Acho.
OPINIÃO: Procuradoria Europeia: um cambalacho sem fim
A ministra quis desde o primeiro
momento que o procurador europeu fosse José Guerra – só que não quis assumi-lo.
Foi uma escolha pessoal da ministra? Nem pensar! A ministra limitou-se apenas a
impedir que todos fossem escolhidos… menos ele.
JOÃO MIGUEL
TAVARES PÚBLICO, 29 de Outubro de 2020
O
caso do representante de Portugal junto da Procuradoria Europeia é uma
telenovela infindável – quando
pensávamos que tudo já tinha sido visto e dito, eis que aparece uma nova
personagem para complexificar a trama e agravar as suspeitas de que a
ministra da Justiça tudo fez para colocar um nome da sua confiança na
recém-criada Procuradoria da União Europeia, órgão supostamente independente
que ficará responsável pelo combate à fraude, em particular na aplicação de
fundos europeus.
O
caso já vai em três vagas de polémica. Vaga
número um: quando se descobriu que Ana
Mendes de Almeida, que um
júri internacional independente classificara em primeiro lugar (foram três os
candidatos apresentados), para ser a nova procuradora europeia em representação
de Portugal, foi preterida pelo governo em detrimento do procurador José Guerra, segundo
classificado nesse
concurso, e antigo colega da ministra da Justiça no DIAP. Já escrevi sobre isso há três meses.
Vaga número dois: quando 16
académicos europeus, entre os quais Miguel Poiares Maduro e Rui
Tavares, assinaram uma carta-aberta a pedir que o
Parlamento Europeu movesse uma acção no Tribunal de Justiça da União Europeia
para anular o processo de nomeação dos procuradores devido às interferências
dos governos de Portugal, Bulgária e Bélgica (os únicos três países que não
respeitaram os resultados do concurso internacional). Francisca
Van Dunem respondeu a essa carta
de forma bastante descabelada, insistindo no argumento ridículo da “antiguidade”
do procurador José Guerra e
classificando a carta-aberta como uma “manobra de guerrilha política”.
E
agora, eis que chegou a vaga número três. O programa da RTP Sexta às 9 revelou um novo e surpreendente
dado: o juiz
desembargador José António Cunha,
presidente da comarca do Porto, também se candidatou ao cargo. Embora o seu nome tenha permanecido na sombra, a
verdade é que o Conselho Superior de Magistratura seleccionou-o, considerou o
seu currículo competente para a função, o Parlamento ouviu-o e deu um
parecer favorável. No entanto, a ministra da Justiça afastou-o sem disso
dar conta a ninguém. Fê-lo apenas há dias em São Bento, quando revelou a
exclusão com o argumento de que o seu currículo “não tinha uma ligação muito
próxima com a investigação criminal”. José António Cunha diz que não é verdade e que o Ministério da
Justiça nunca o informou de tal facto. Ficou a saber disso pelo Canal
Parlamento. Francisca Van Dunem admite que o podia ter informado “por razões
de cortesia institucional”, mas que não tinha o dever legal de comunicar os
resultados do processo de selecção. O juiz desembargador já apresentou
queixa à provedora de Justiça e pondera impugnar todo o procedimento. Mas o
ponto aqui extravasa em muito as questões de cortesia ou os próprios deveres
legais: afinal, quem é que era suposto escolher o futuro procurador europeu?
Era a ministra da Justiça, os Conselhos Superiores de Magistratura e do
Ministério Público ou era um júri internacional?
Obviamente,
a ministra quis desde o primeiro momento que o procurador europeu fosse José
Guerra – só que não quis assumi-lo. Donde, chutou para canto o nome sugerido pelo
Conselho Superior de Magistratura, borrifou-se para a escolha do júri
independente e agarrou-se ao Conselho Superior do Ministério Público e à
antiguidade de José Guerra. Foi uma escolha pessoal da ministra? Nem pensar! A ministra limitou-se apenas a
impedir que todos fossem escolhidos… menos ele.
Jornalista
TÓPICOS: OPINIÃO JUSTIÇA UNIÃO EUROPEIA FRANCISCA VAN DUNEM CONSELHO
SUPERIOR DE MAGISTRATURA MINISTÉRIO DA JUSTIÇA MINISTÉRIO PÚBLICO
COMENTÁRIOS:
cidadania 123 INICIANTE: Efetivamente, os sinais de que se estão a colocar nos
cargos que controlam o governo as pessoas "certas", num cenário de
entrada de muitos milhões, é preocupante. Desde a PGR, o banco de Portugal, o
tribunal de contas, ágora a Procuradoria europeia ...o que falta? Estamos a
falhar nos " balance and checks"... Eng. Jorge Simões INFLUENTE: Excelente análise. Está em preparação o assalto em
grande escala ao esperado e muito ansiado dinheiro da "basuca".
Parabéns.
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